"Só novo poder em Conacri poderá reatar relação com Bissau"
17 de outubro de 2020Os eleitores da Guiné-Conacri escolhem neste domingo (18.10) o próximo Presidente do país, numa eleição marcada pela contestação à candidatura a um terceiro mandato do chefe de Estado cessante, Alpha Condé, e pela morte de pelo menos 90 manifestantes e opositores.
Os eleitores poderão escolher entre 12 candidatos, incluindo duas mulheres, mas a chefia do Estado deverá ser disputada entre Alpha Condé e o líder da oposição, Cellou Dalein Diallo.
Entretanto, para o sociólogo guineense Diamantino Domingos Lopes, "a relação entre a Guiné-Conacri e a Guiné-Bissau está adormecida há muito tempo. Com uma nova autoridade, haverá espaço para reatar essa cooperação".
O analista assinalou ainda a difícil relação entre os atuais chefes de Estado dos dois países vizinhos: Umaro Sissoco Embaló e Alpha Condé.
"Está a tentar um golpe de Estado"
O Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, tem sido uma das vozes críticas da candidatura de Alpha Condé a um terceiro mandato na Guiné-Conacri, tendo mesmo chegado a acusá-lo de "estar a tentar um golpe de Estado".
"Umaro Sissoco Embaló, enquanto primeiro-ministro, sentiu-se prejudicado por Alpha Condé, que assumiu a mediação da crise política guineense a mando da Comunidade Económica de Países da África Ocidental (CEDEAO)", apontou.
Na altura, prosseguiu, o agora chefe de Estado da Guiné-Bissau considerou que Alpha Condé não "teve uma mediação clara e transparente" e acusou-o de se "inclinar" para o Partido Africano para a Independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde (PAIGC) e para o seu presidente, Domingos Simões Pereira.
"Acusou Alpha Condé de ser contra os fulas (etnia maioritária nos dois países)", apontou Diamantino Domingos Lopes, considerando, no entanto, que apesar de o opositor de Alpha Condé nas eleições ser fula, a questão étnica não é determinante.
Para o sociólogo, a relação entre os dois chefes de Estado "deteriorou-se" ao ponto de a Guiné-Conacri não ter sido convidada para o aniversário da independência da Guiné-Bissau, que se assinalou em 24 de setembro.
"Historicamente a Guiné-Bissau ganhou a independência através da Guiné-Conacri. Tudo começou e terminou na Guiné-Conacri, era lá que tínhamos a nossa base militar e a estratégia de guerra era desenhada e executada a partir da Guiné-Conacri", disse.
Divisão política guineense
Por outro lado, apontou, a divisão política guineense traduz-se numa inclinação maior do PAIGC para a Guiné-Conacri e do Presidente Umaro Sissoco Embaló para o Senegal.
"Levamos o nosso problema interno ao nível da CEDEAO e dos nossos principais vizinhos. Estamos nesta perspetiva divisionista que não ajuda em nada o povo e o país", disse.
Por isso, diz que, se Alpha Condé for reeleito, a relação entre os dois países deverá manter-se neste mesmo nível. Mas acredita que "não terá grande impacto na vida das populações".
"Não se vai sentir a relação política e diplomática. Se Cellou Dalein Diallo ganhar, a relação vai ser outra por causa dos laços afetivos e da perspetiva de relançamento de um novo poder. Vai-se sentir mais a presença da Guiné-Conacri na Guiné-Bissau", considerou.
Diamantino Domingos Lopes apontou o "enorme potencial" da Guiné-Conacri e a "longa relação histórica" com a Guiné-Bissau para sublinhar que a relação entre os dois estados "não pode continuar adormecida".
"Tendo os dois chefes de Estado de costas voltadas", os países perdem, reforçou, sustentando que há relações comerciais e económicas que são prejudicadas pela inexistência de relações políticas e diplomáticas.
Para o sociólogo, nos últimos 10 anos este "é o momento mais complicado" na relação dos dois vizinhos.
"Desde 2016, a situação ficou mais complicada e há uma clara 'guerra' política e diplomática. A Guiné-Conacri fechou as fronteiras sem informar as nossas autoridades e isso mostra quão complexa é a relação neste momento", disse.
Ainda assim, Diamantino Domingos Lopes acredita que este conflito está a passar ao lado das populações dos dois países, que mantêm a mobilidade entre ambos.