Moçambique: Presidente da CNE "ficou do lado do opressor"
14 de novembro de 2023A Igreja Anglicana em Moçambique deverá analisar esta terça-feira (14.11) o pedido de afastamento do seu bispo Carlos Matsinhe, o presidente da Comissão Nacional de Eleições (CNE).
Em causa está uma carta dos bispos da Igreja Anglicana exigindo a "resignação imediata" de Matsinhe, após muitas críticas à forma como a CNE geriu o processo das eleições autárquicas de 11 de outubro e alegacões de fraude generalizada.
O ativista Adriano Nuvunga, uma das personalidades que exigiu publicamente a demissão de Carlos Matsinhe da presidência da CNE, diz à DW que, embora tardia, a pretensão da Igreja a Anglicana de afastar o bispo é oportuna.
Em entrevista à DW África, o diretor executivo do Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD) considera que, a acontecer a demissão do cargo da Igreja, Matsinhe deixa também de reunir condições para continuar à frente da CNE.
"É como quando uma árvore fica sem o tronco, não tem como a árvore ficar lá em cima", refere Adriano Nuvunga.
DW África: Como avalia a convocação de uma reunião pelos bispos da Igreja Anglicana para discutir a possível demissão de Dom Carlos Matsinhe?
Adriano Nuvunga (AN): Olho para isso com bons olhos e saúdo a Igreja Anglicana. Apesar da posição ser tardia, é melhor tarde do que nunca. É importante que a Igreja Anglicana, uma instituição muito séria que contribuiu durante anos para a promoção da liberdade e respeito dos Direitos Humanos em Moçambique e em África, não se deixe manchar pelas ações de Dom Carlos Matsinhe.
Enquanto presidente da Comissão Nacional de Eleições, sendo um homem de Deus que jurou fazer uma justiça "justa" ao mundo e ao cidadão, agiu em contramão a esse ditame importante. Ele violou os princípios básicos de justiça. Ele absteve-se dos resultados de uma instituição que dirigia, sabendo que esses resultados eram fraudulentos e conduziram a que moçambicanas e moçambicanos perdessem a vida, assassinados pela ganância de alguns. Falhou ao não ter vindo a público demarcar-se [dos resultados], apresentando a demissão. Ele continuou e ficou do lado do opressor.
DW África: A destituição do cargo da Igreja, caso se confirme, poderá fazer pressão para que ele abdique também do cargo de presidente da Comissão Nacional de Eleições?
AN: É como quando uma árvore fica sem o tronco, não tem como a árvore ficar lá em cima, ela cai automaticamente. Ao perder a raiz que o sustentava naquela instituição - veja a roupa que ele usava ao proferir os atos grandes da comissão, usava a roupa de clérigo - Dom Carlos Matsinhe perde automaticamente as condições para se manter à frente da Comissão Nacional de Eleições. É uma questão de lógica.
DW África: Se se confirmar a destituição de Carlos Matsinhe como bispo da Igreja Anglicana, e se porventura o bispo Matsinhe também abdicar do cargo de presidente da CNE, que impacto terá no processo eleitoral em curso, uma vez que a comissão já se pronunciou?
AN: Fica manchada a legitimidade desse processo eleitoral, que, para a sociedade já é ilegítimo, ilegal e viola os Direitos Humanos. O Conselho Constitucional não tem outro caminho senão deitar abaixo toda essa sujeira eleitoral e voltar à "estaca zero". Cada um mantém-se a governar onde governava enquanto se prepara a realização de novas eleições, havendo condições.