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Todos viajam, ninguém se move

(sv / lk)27 de fevereiro de 2003

Chefes de Estado e diplomatas correm de um lado para outro, na tentativa de solucionar a crise do Iraque. Mas ninguém arreda pé de sua posição.

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Mesma postura no conflito do Iraque: Putin e SchröderFoto: AP

O cenário da política internacional no 26 de fevereiro de 2003 teria certamente parecido inverossímil aos olhos de uma testemunha da Guerra Fria. Quem diria que pouco mais de uma década após a derrocada da Cortina de Ferro, o quadro das relações de poder e alianças entre as grandes potências estaria tão às avessas. No momento, a diplomacia anda se contorcendo, diga-se de passagem, sem muito sucesso.

Tudo na mesma —

Nesta quarta-feira (26/2), o premiê alemão Gerhard Schröder foi a Moscou, para confabular com o chefe de governo russo, Vladimir Putin, sobre uma forma de fazer com que George W. Bush desista de atacar o Iraque. A visita serviu para que ambos reafirmassem seu empenho por uma solução pacífica da crise com o emprego de "todos os recursos diplomáticos", nas palavras de Putin. Schröder, por sua vez, conclamou o Iraque a "cumprir todas as exigências", inclusive a destruição dos mísseis Al-Samoud-2, conforme formulado pelo chefe dos inspetores da ONU, Hans Blix.

Outro encontro que transcorreu sem nenhuma aproximação, nesta quarta-feira, foi o realizado em Paris entre Jacques Chirac e José María Aznar. O premiê espanhol mostrou-se decidido a levar a cabo sua defesa incondicional das idéias de Bush, apesar de toda a resistência dentro do próprio país.

Alternativas —

O que está em jogo no Conselho de Segurança da ONU, que vai deliberar a portas fechadas na quinta-feira, é claro: ou uma guerra que se desenrola a partir de março próximo, ou tenta-se um desarmamento lento e pacífico da terra de Saddam Hussein, proposto para ser atingido até início de julho.

Tanto quanto as sugestões apresentadas, os blocos de defesa das mesmas são nitidamente definidos. De um lado, EUA e Reino Unido, com o aval de vários países europeus, entre eles a Espanha de José María Aznar e a Itália de Silvio Berlusconi. Do outro, a "velha Europa" (Rumsfeld): França, Alemanha e Rússia. Diante de tal cenário, a diplomacia internacional vê-se acuada como nunca.

Racha europeu —

A tensão chegou a tal ponto, que o ministro alemão das Relações Exteriores, Joschka Fischer, ao sair de seu encontro com o premiê britânico Tony Blair e seu colega de pasta Jack Straw, na terça-feira, confessou sem um mínimo de rodeios que a reunião de nada adiantou.

"As posições em relação ao uso de violência no contexto de uma guerra contra o Iraque são obviamente diferentes. Nós defendemos a opinião de que devemos fazer de tudo para fazer vigorar a resolução 1441 da ONU, através da ação dos inspetores, mas sem uso de violência. Essa diferença continua", concluiu Fischer.

Mais tarde, Blair voltou, em seu discurso frente ao Parlamento, a insistir nas divergências entre sua posição e as do representante alemão. As propostas de um prolongamento das missões dos inspetores da ONU no Iraque, feitas por Berlim e Paris, são "absurdas", segundo o premiê britânico.

Quase que por ironia do destino que guia os malabarismos dos círculos de poder internacionais, Schröder tenta costurar com Putin um plano comum, enquanto as relações transatlânticas entre Berlim e Washington tornam-se cada vez mais sombrias.

Meio termo canadense —

Nesta quarta-feira, o Canadá apresentou uma proposta intermediária entre a resolução norte-americana-britânica-espanhola e a iniciativa teuto-franco-russa. O documento canadense prevê que os inspetores da ONU apresentem até a próxima sexta-feira (28) uma lista de questões abertas, tendo tempo até fins de março para expor suas conclusões a respeito.

Angela Merkel in den USA
Angela MerkelFoto: AP

Oportunismo à direita — Como que para "salvar a pátria" de última hora, Angela Merkel, presidente da União Democrata Cristã (CDU), partido de oposição à social-democracia de Schröder, afirmou em artigo publicado pelo Washington Post, que "nem todos os alemães pensam como o chefe de governo do país". Na seqüência, 27 parlamentares democrata-cristãos, liderados pelo linha dura Jörg Schönbohm, enviaram uma carta de apoio a George W. Bush, lamentando a postura defendida por Schröder.

Hegemonia francesa —

Costura aqui, alinhavo acolá, outra preocupação ainda assola os cérebros alemães em meio a tantas dissonâncias, internas e externas. A postura francesa de fazer frente aos EUA é vista por parte da mídia como a carta de alforria recebida por Paris para fazer, enfim, o que sempre quis: assumir uma posição de liderança em oposição à hegemonia norte-americana.

Nessa leva de pensamento, o diário Süddeutsche Zeitung desta quarta-feira chega a estampar que "Schröder tornou-se dependente de Chirac, minando a posição alemã dentro da União Européia e frente ao Leste Europeu". Se a França vê com receio qualquer passo autônomo dado por Berlim, os alemães observam com desconfiança toda e qualquer abertura de asas da grande nation. Dá-lhe velha Europa!