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EducaçãoBrasil

"Saí da escola com desconhecimento em diversas matérias"

Studentin Beatriz de Freitas Oliveira
Beatriz de Freitas Oliveira
17 de março de 2022

O ensino público sempre foi defasado, com falta de professores, infraestrutura, materiais, entre outros aspectos, escreve Beatriz Oliveira, que agora tenta recuperar o tempo perdido e luta por uma vaga em medicina.

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Estudante Beatriz de Freitas Oliveira
"Sonho em passar em uma universidade pública, me formar, ser pediatra e fazer a diferença na área da medicina", diz Beatriz OliveiraFoto: privat

A escolha de carreira para alguns jovens pode ser bem definida porque sonham com aquilo desde crianças, mas, para outros, demora um tempo para reconhecer os próprios sonhos. Foi o meu caso! A vida inteira estudei em escola pública e pensava em várias profissões, mas medicina nunca foi minha prioridade.

Quando fui para o ensino médio, resolvi ingressar em um curso profissionalizante, o magistério (formação de docentes). Nele, estuda-se durante quatro anos e se sai formada tanto no ensino médio quanto como professora da educação infantil. Resolvi fazer o curso, porque sabia que, no final, com ele, eu teria mais oportunidades no mercado de trabalho. Além disso, eu gosto muito de crianças, por isso achei que me daria bem na profissão.

Durante o ensino médio, tive um contato mais intenso com as crianças por causa dos estágios, desde bebês até os 10 anos de idade. Ano passado (2021), foi o meu último ano, no qual me formei. Mas também foi o ano de reconhecimento. Além de toda responsabilidade como estudante e também no âmbito familiar, houve muitos acontecimentos que fizeram mudar minha decisão de curso. Pensava em vários: letras, fonoaudiologia, psicologia... Porém, sempre com um sentimento incompleto sem saber o porquê.

Estudos e responsabilidades familiares 

Em 2021, minha mãe adoeceu e contraiu o vírus da covid-19, tive muito medo e fiz o que pude para cuidar dela, aferia a temperatura e saturação várias vezes ao dia, sempre com muita preocupação e cuidado. Nesse momento, senti um peso duplo, porque, além de cuidar dela, eu também tinha outras ocupações. Por ser irmã mais velha, sempre tive uma responsabilidade muito grande em cuidar dos meus dois irmãos mais novos.

Meu pai ajudava bastante, principalmente quando minha mãe adoeceu, mas a maior parte do tempo eles todos estavam sob meus cuidados. Logo que minha mãe se recuperou, eu, fragilizada e cansada com toda a situação e o peso da responsabilidade, adoeci também. Não foi covid, mas ainda sim tinha dores e mal-estar... Fui ao médico e descobri que era devido à sobrecarga de tudo que aconteceu. Por ser o meu último ano, a escola cobrava muitos trabalhos e estágios à distância.

Além disso, eu precisava cuidar dos meus irmãos e da minha mãe em casa. Eu tinha que dar conta de tudo e fiquei sobrecarregada. Na época, o número de casos de covid estava alto demais, e os alunos estavam sem expectativa de volta à escola. Com os estudos totalmente on-line, sem ter o contato com professores e amigos, meu psicológico ficou afetado e influenciou, junto com a sobrecarga, o meu adoecimento.

A partir dali tudo mudou. A forma como fui tratada pelo médico me tranquilizou, afinal, estava bem fragilizada. Minha mãe também começou a fazer tratamentos, e vi que estava melhorando. Desde então, eu queria reproduzir aquilo, queria poder ajudar e apoiar as pessoas da mesma forma como os médicos fizeram comigo e com a minha mãe. Eu me sentia muito impotente, por mais que eu estivesse ajudando a cuidar dela, eu queria poder fazer mais. Fazer mais pela minha família e mais pelas pessoas. Esse foi o ponto de partida que me fez mudar de decisão e ir para medicina.

Estudar medicina não é "coisa de rico"

No início da ideia eu ficava pesquisando e sempre duvidando sobre a carreira na área de medicina, já que nunca tinha me permitido a isso por causa de tantos obstáculos. Na minha família não há médicos e meu pensamento sempre foi de que o curso era "coisa de rico", além da minha família não ter condições de pagar uma faculdade privada. A medicina era distante. Por isso, nunca havia cogitado. Depois de tudo que aconteceu, decidi que era o que eu queria e o que eu precisava fazer. Contei aos meus pais e eles ficaram orgulhosos com a atitude, porque sempre me acharam muito cuidadosa e paciente.

Sobre meus estudos, sinto que saí da escola com desconhecimento em diversas matérias, o ensino público na minha realidade sempre foi defasado. Faltavam professores, infraestrutura, materiais, entre outros aspectos, para ter um ensino de qualidade. Nas disciplinas de química e física, por exemplo, sequer aprendi o básico. Por isso, sigo em um processo de aprendizado, dia após dia, para recuperar o tempo perdido e alcançar meu objetivo.

Nessa trajetória, tenho estudado por meio de cursinho on-line em período integral. O Salvaguarda tem me ajudado bastante, estou no projeto há dois anos treinando redação. No meu primeiro Enem, consegui alcançar 860 pontos na redação, devido ao auxílio que tive da minha monitora e também com a prática frequente. Para a medicina, é preciso alcançar uma média alta na maioria das áreas e isso leva bastante tempo e esforço.

Atualmente, estou com 18 anos e estudando on-line. Sou de uma cidade muito pequena, do interior do Paraná, e sigo lutando para alcançar meus objetivos. Sonho em passar em uma universidade pública, me formar, ser pediatra e fazer a diferença na área da medicina. Independentemente do tempo que demore, vou até o fim, pois sei que é isso que eu quero ser.

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Vozes da Educação é uma coluna quinzenal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do Salvaguarda no Instagram em @salvaguarda1

Este texto foi escrito pela estudante Beatriz de Freitas Oliveira, de 18 anos de idade, que vive em Bandeirantes, no Paraná. O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.

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A coluna quinzenal é escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade.