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EducaçãoBrasil

Como equilibrar os pratos de ensino, pesquisa e extensão?

Vinícius de Andrade
Vinícius De Andrade
26 de setembro de 2024

Professores de universidades públicas no Brasil precisam dar aulas, fazer pesquisa e levar a universidade para comunidades pela extensão. Como atender a todos esses papéis?

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Mulher de jaleco branco observa mosquito com microscópio. Imagem do inseto pode ser vista em tela de computador.
Problemas na transmissão de conhecimento têm origem "no próprio modelo de pós-graduação brasileiro"Foto: Agustin Marcarian/REUTERS

Uma carreira de sucesso como pesquisador, mais de 2 mil citações no google acadêmico. Já enquanto docente, na sala de aula, um profissional com muitas dificuldades em transmitir o conteúdo da disciplina. 

A situação acima descreve perfeitamente, na minha visão, um dos professores do meu programa de pós-graduação e também alguns que tive na graduação. Já quero deixar bem sinalizado que esta não é uma coluna que tem a intenção de culpabilizar esses profissionais. 

Primeiro porque, em muitos deles, eu notava claramente o quanto tentavam transmitir o conteúdo da melhor forma. Segundo, porque creio que estamos diante de uma problemática institucional e que nasce no próprio modelo de pós-graduação brasileiro, ou seja, na escola de formação dos futuros docentes universitários

Autonomia do estudante e consequências no aprendizado

Sou graduado em economia pela USP e me lembro que, na apresentação do curso, o coordenador disse algo como "Vocês agora estão na faculdade, não mais no cursinho ou ensino médio. Não esperem aulas 'show' e aprendam a ter autonomia na aprendizagem".

Entendo o ponto dele e concordo. Já falei aqui na coluna muitas vezes sobre o fato de que o estudante tem, sim, responsabilidade na própria aprendizagem, e que esta precisa ser um processo horizontal e não vertical. 

No entanto, nada me tira da cabeça que, mesmo no melhor dos mundos, é necessário ter um professor que realmente consiga nos transmitir o conteúdo e ser um mediador entre nós e o conhecimento. Já tive docentes sensacionais: você assiste à aula sem piscar e sai dela querendo compartilhar com todos ao redor o quanto aprendeu.

Por outro lado, já tive aqueles com quem eu não conseguia entender o conteúdo de forma alguma e também docentes com os quais prestar atenção em suas aulas era um desafio gigantesco. Nessas disciplinas, confesso, tenho lacunas na aprendizagem, e o problema é quando isso ocorre com disciplinas relevantes para aquela formação específica. 

Assumo minha parcela de responsabilidade e poderia sim ter estudado sozinho e de forma autônoma, mas, para mim, o papel de um professor mediando ainda é muito importante. 

O papel do modelo atual 

Reforço aqui, outra vez, que não estou culpabilizando o docente universitário. Alguém pode, claro, trazer relatos de professores que eram maus profissionais e que nem tentavam ser bons, mas isso tem em qualquer profissão e não é argumento para sustentar a tese de que o docente universitário não se importa com a aprendizagem de seus alunos. 

A maioria dos professores, sim, tenta fazer um bom trabalho, mas o sistema não ajuda. Para pintar o quadro, precisamos de três ingredientes: o modelo de pós-graduação, o modelo de contratação dos docentes universitários e a formação continuada desses profissionais. 

Pós-graduação não forma professores

O problema começa logo na pós-graduação. Para ser docente universitário no Brasil, no geral, o caminho é: graduação, mestrado e depois o doutorado. 

A questão é que os programas de pós-graduação, em geral, não formam futuros professores, mas sim futuros pesquisadores. Salvo em casos específicos, não há disciplinas de didática e nem políticas que visam desenvolver essas habilidades no corpo discente. 

Aqueles que decidem prosseguir na carreira acadêmica, ao assumirem vagas em universidades públicas, terão pelo menos três responsabilidades: ensino, pesquisa e extensão. Além disso, há outras atribuições.

Serão excelentes em todas as funções? Provavelmente não. E isso não é culpa do profissional, mas sim do modelo. A razão é que ele, primeiro, sobrecarrega esse profissional e, segundo, porque desconsidera as preferências e diferenças de perfis. 

O terceiro ingrediente é a preparação para esses profissionais assumirem o cargo de docência, sobretudo em um cenário em que suas formações na pós-graduação, muito provavelmente, não os preparam para isso. Muitas universidades já oferecem cursos de didática e afins, mas acaba sendo algo bem pontual e não pautado em uma formação contínua. 

No final, temos excelentes pesquisadores que não gostariam de ser professores, mas que precisam. Assim como profissionais que desejam fortemente a excelência nos três pilares, mas que simplesmente não conseguem, dada a grande quantidade de atribuições. Ou seja: o próprio modelo, no limite, irá enviesar o potencial de pelo menos um dos pilares. 

O que pode mudar? 

No contexto de respeitar as diferenças de perfis e preferências, seria perfeito se houvesse a possibilidade de escolher qual ou quais funções alguém gostaria de assumir ao ingressar na docência. Isso, na verdade, já ocorre em universidades de outros países. Nelas, já há o cargo apenas de pesquisador. 

No Brasil, por causa da grande quantidade de universidades públicas, talvez seja uma política ousada demais, tanto no sentido de ruptura quanto no sentido orçamentário. O motivo: uma mudança dessas exigiria mais profissionais nas universidades. Infelizmente, muitas delas já fazem milagre com o recurso que recebem. 

Então, a solução se pauta no pré- e no pós-ingresso na docência. 

No pré, estamos falando dos programas de pós-graduação. Ainda que nem todos os discentes almejem a atuação futura como docentes, seria muito interessante que fossem implementadas, de modo obrigatório, disciplinas de didática que visassem o desenvolvimento de habilidades indispensáveis para qualquer docente.

Além disso, há margem para aumentar os projetos e bolsas, tanto no nível federal quanto estadual e até mesmo universitário, que visem proporcionar experiências práticas de docência para os discentes. 

Paralelo a isso, é preciso aumentar as políticas que já existem em caráter obrigatório de formação e desenvolvimento após o ingresso na docência. Para fazerem um bom trabalho, é necessário que todos esses profissionais recebam o suporte necessário e atualizado.

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Vozes da Educação é uma coluna semanal escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade. Revezam-se na autoria dos textos o fundador do programa, Vinícius De Andrade, e alunos auxiliados pelo Salvaguarda em todos os estados da federação. Siga o perfil do Salvaguarda no Instagram em @salvaguarda1.

Este texto foi escrito por Vinícius de Andrade e reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

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A coluna quinzenal é escrita por jovens do Salvaguarda, programa social de voluntários que auxiliam alunos da rede pública do Brasil a entrar na universidade.