Frankfurt 2010
19 de outubro de 2009Argentina será o país convidado da próxima Feira do Livro de Frankfurt, que acontece em 2010 – o terceiro latino-americano, após o Brasil e o México, vários anos atrás. O país, segundo Jürgen Boos, diretor da Feira, é um parceiro interessante. "A Argentina representa a América Latina. Em Buenos Aires acontece uma das maiores feiras do livro do continente, onde os editores latino-americanos estão sempre se encontrando", lembra Boos.
Até a próxima feira, aproximadamente 40 eventos tematizarão na Alemanha a literatura e as artes do país. A meta, segundo Magdalena Faillace, presidente do comitê argentino de preparação para a Feira de Frankfurt, é superar estereótipos.
"A Argentina é mais que Eva Perón, Che Guevara ou Maradona, mais que tango e churrasco. Somos um país de enorme diversidade cultural. Temos tradições diversas, tanto das culturas nativas quanto da europeia. Acolhemos muitos refugiados ao longo dos anos e somos até hoje um país aberto", diz ela.
Ditadura em debate
Embora ainda não tenha sido definida a lista de autores convidados, a ideia é reunir várias gerações de diversas regiões do país. Um dos pontos centrais de debate será a ditadura militar entre 1976 e 1983. Para Faillace, a herança da ditadura é, inclusive, um ponto de interseção entre Argentina e Alemanha.
"Um dos pontos de contato com a cultura e o povo alemães é a obsessão que temos hoje pela memória de nosso passado recente, algo que não tínhamos há 40 ou 50 anos. Creio que este seja um tema muito ancorado na Argentina, tanto na política como na Justiça, e muito especialmente na literatura, no teatro e no cinema. Estamos preparando ciclos de cinema sobre a memória: tanto a da Guerra das Malvinas como a da ditadura militar e dos centros clandestinos. Os alemães sentem que não acabaram de resolver sua tragédia do nazismo. Isso, na minha opinião, dignifica um povo, essa possibilidade de poder debater a verdade sobre o próprio passado. Isso nos vincula à Alemanha", observa Faillace.
"Gatilho fácil"
O cerceamento da liberdade de expressão durante os anos de ditadura fez também com que um dos grandes temas da literatura argentina dos últimos anos tenha sido o exílio, conta Faillace. "Muitos escritores voltaram à Argentina, outros ficaram no exterior e outros vivem parte do ano no país e outra fora. Eu diria que o tema da ditadura militar e os problemas da nossa democracia, tão interrompida durante 50 anos, têm sido centrais em nossa literatura", diz ela.
Outra consequência imediata dos anos ditatoriais, para Faillace, é o problema do "gatilho fácil" na polícia, do uso abusivo de armas de fogo, de uma polícia que se manteve idêntica à da época da ditadura militar, com enclaves que custarão a desaparecer. "Essa concepção individualista que gerou o neoliberalismo dos anos 1990 levou a mais pobreza, menos empregos e fez com que as mulheres se sujeitassem a piores condições de trabalho", analisa a especialista.
Bom momento
Já de olho na Feira de Frankfurt em 2010, o mercado editorial argentino deve passar por um período de ebulição e de divulgação da literatura do país até lá. "O melhor que podemos fazer é introduzir nossos autores, nosso imaginário, nossos valores, formas de vida, como nos amamos, como brigamos, como somos, quais são nossas grandes e pequenas questões. É isso o que vamos contar. Temos 24 títulos a serem traduzidos para o alemão", anuncia Faillace.
Autor: Cristina Papaleo / Petra Lambeck (sv)
Revisão: Augusto Valente