Amnistia pede investigação a ameaças contra pesquisadora
31 de janeiro de 2019A Amnistia Internacional denuncia que a investigadora moçambicana Fátima Mimbire começou a receber ameaças à sua integridade física no dia em que o Centro de Integridade Pública (CIP), onde trabalha, lançou uma campanha contra o pagamento das chamadas "dívidas ocultas".
A investigadora é acusada, em mensagens no Facebook e no WhatsApp, de "desestabilizar o país" e advertida a "ter cuidado" enquanto "está viva", refere um comunicado da Amnistia Internacional publicado esta semana.
A organização de defesa dos direitos humanos apela ao Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, para agir imediatamente e abrir uma investigação ao caso. Pede ainda "proteção adequada" não só para Fátima Mimbire, como também para os restantes funcionários do CIP.
Paulo Fontes, diretor de comunicação da Amnistia Internacional Portugal, frisa em entrevista à DW que é preciso "proteger o trabalho" dos ativistas e das pessoas que defendem os direitos humanos em Moçambique
DW África: De que ameaças está a ser alvo a investigadora moçambicana Fátima Mimbire?
Paulo Fontes (PF): São essencialmente ameaças nas redes sociais, que esta ativista e defensora dos direitos humanos está a receber pessoalmente. Foram ameaças à integridade física e até mesmo ameaças de morte, dizendo, por exemplo, que ela devia sentir vergonha da sua atitude, que está a ser sexualmente usada pelos norte-americanos e portugueses para ganhar dinheiro e que anda nas redes sociais a descredibilizar o país e a desestabilizar. Dizem mesmo para ela cuidar dela e da sua família, enquanto está viva.
DW África: A Amnistia Internacional enviou um pedido ao Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, para investigar estas ameaças. Já houve alguma resposta, de alguma forma?
PF: Não, ainda não obtivemos resposta. Continuamos a fazer pressão para que haja uma investigação imediata a estas ameaças e para que Fátima Mimbire e os outros funcionários do CIP [Centro de Integridade Pública] possam receber a proteção adequada e continuar o seu trabalho livremente, sem medo de ameaças e represálias.
DW África: Primeiro, na semana passada, a polícia moçambicana mandou despir t-shirts da campanha que o CIP está a promover contra o pagamento das "dívidas ocultas". Agora, há esta denúncia, feita pela Amnistia Internacional, de ameaças. Esta é uma questão que incomoda?
PF: Sim, parece ser uma questão que incomoda. Aliás, também há alguns dias, a 25 de janeiro, a FRELIMO [Frente de Libertação de Moçambique, partido no poder] lançou um comunicado a apelar a que as pessoas vigiassem comportamentos possíveis de incitar a ordem pública. E isto aumenta, de facto, o risco para os defensores dos direitos humanos, que tenham falado, ou que queiram falar, contra a corrupção, e especificamente contra esta questão das "dívidas ocultas". Vai ainda contra todo o trabalho que deve ser feito para proteger as pessoas que defendem os direitos humanos em Moçambique.
DW África: Estas são ameaças à liberdade de expressão em Moçambique?
PF: Sim, são ameaças à liberdade de expressão em Moçambique, que têm acontecido cada vez mais. Este é mais um exemplo das dificuldades que os ativistas e os defensores dos direitos humanos sofrem no país. Ainda também, há umas semanas, um jornalista foi detido em Cabo Delgado enquanto entrevistava pessoas que estavam a fugir das suas casas, por causa da intensificação de ataques por parte de grupos extremistas na zona. Umas semanas antes, um outro jornalista também foi detido de forma autoritária - foi, depois, libertado, mas nem sequer lhe foi feita qualquer acusação. Portanto, isto são exemplos claros de como o Governo moçambicano está a intimidar o trabalho dos defensores dos direitos humanos e a procura da verdade, quando devia estar a fazer o contrário - a proteger o trabalho destas pessoas.