Violência policial segue sem freios no Brasil, denuncia ONG
18 de janeiro de 2018Violações crônicas dos direitos humanos assolam o Brasil, o que se espelha, por exemplo, na ação de policiais, na situação das prisões e na violência contra mulheres, denuncia nesta quinta-feira (18/01) a ONG Human Rights Watch.
Em seu Relatório Mundial, a ONG analisa a situação dos direitos humanos em 90 países, ao longo de mais de 600 páginas. Na parte sobre o Brasil, destaca: "A violência policial continua sem freios". Em 2016, denuncia a HRW, a polícia matou ao menos 4.224 pessoas, 26% mais que no ano anterior.
"A polícia no Brasil precisa desesperadamente da cooperação da comunidade para combater os elevados índices de criminalidade que afligem o país", diz Maria Laura Canineu, diretora da HRW no Brasil. "Mas enquanto alguns policiais agredirem e executarem pessoas impunemente, as comunidades não confiarão na polícia."
O Congresso, prossegue o relatório, agravou a situação ao aprovar em outubro uma lei que afastou da jurisdição civil membros das Forças Armadas acusados de homicídio contra civis em operações de segurança pública, atribuindo essa competência a tribunais militares.
Segundo a ONG, execuções extrajudiciais cometidas por policiais colocam em risco a vida de outros policiais, que ficam sujeitos à retaliação pelos violentos abusos dos colegas, e acabam por aumentar a violência durante confrontos com suspeitos.
Abusos cometidos pela polícia, incluindo execuções extrajudiciais, contribuem para um ciclo de violência, que prejudica a segurança pública e coloca em risco a vida de policiais, diz o texto. Em 2016, 437 policiais foram mortos no Brasil, a maioria fora de serviço, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
O relatório lembra que, após dois anos de queda no número de mortes causadas por policiais em serviço no estado de São Paulo, as 494 mortes entre janeiro e setembro de 2017 representaram um aumento de 19% em relação ao mesmo período de 2016. Os policiais em serviço no Rio de Janeiro mataram 1.035 pessoas entre janeiro e novembro, um aumento de 27% frente a 2016.
Violência contra mulher
A violência contra a mulher também é destaque na parte brasileira do relatório. A implementação da Lei Maria da Penha de 2006, para coibir a violência doméstica, ainda está incompleta. As delegacias especializadas da mulher contam com recursos humanos insuficientes, geralmente fecham durante a noite e aos fins de semana, e permanecem concentradas nas grandes cidades. Milhares de casos por ano não são devidamente investigados, denuncia.
Casos de violência doméstica que permanecem impunes tipicamente se agravam e podem levar à morte. Em 2016, lembra o estudo, 4.657 mulheres foram mortas no Brasil. Naquele ano, o Ministério Público apresentou denúncia em ao menos 2.904 casos – alguns estados não disponibilizaram ou forneceram dados parciais – de suposto feminicídio, definido por uma lei de 2015 como o homicídio contra a mulher "por razões da condição de sexo feminino".
Prisões e líderes indígenas
O número de adultos nas prisões saltou 17 por cento desde dezembro de 2014, alcançando 726,7 mil pessoas em junho de 2016. Ao mesmo tempo, a capacidade do sistema carcerário diminuiu. Em junho de 2016 havia dois presos por vaga disponível.
Em relação ao cumprimento dos direitos das crianças, a organização aponta a superlotação dos centros socioeducativos no Brasil, que abrigavam 24 mil internos em outubro de 2016, quando a capacidade era de 19,4 mil. A entidade informou que esses dados não incluem informações de seis estados, que não constavam na base de dados do governo federal.
Entre os casos lembrados, estão os nove adolescentes mortos, em junho, por outros jovens em centros socioeducativos da Paraíba e de Pernambuco.
A violência contra ativistas rurais e líderes indígenas envolvidos em conflitos de terra aumentou. Em 2016, 61 pessoas envolvidas em conflitos de terra foram mortas de forma violenta – o maior número anual desde 2003 – e, de janeiro a outubro de 2017, 64 foram mortas, de acordo com a Comissão Pastoral da Terra da Igreja Católica.
Como positivo, o relatório destaca que milhares de venezuelanos chegaram ao Brasil fugindo da repressão em seu país, em busca de comida e medicamentos. E que, em resposta, o Brasil facilitou os processos de autorização de residência, enquanto cobrava o restabelecimento da democracia na Venezuela.
Resistência ao populismo no mundo
No ensaio que abre o relatório, o diretor executivo da ONG, Kenneth Roth, destaca que os líderes políticos dispostos a defender os princípios de direitos humanos mostraram que é possível frear as agendas populistas e autoritárias.
Quando contaram com o apoio de um público mobilizado e atores multilaterais efetivos, afirma, esses líderes demonstraram que a ascensão de governos com uma plataforma contra direitos não é inevitável. Como exemplo, ele cita a vitória do hoje presidente da França, Emmanuel Macron, contra a populista de direita Marine Le Pen nas eleições.
RPR/ots
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