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"Violência contra gays é alarmante no Brasil"

Meyre Brito
17 de maio de 2017

Em entrevista à DW, presidente da Comissão de Diversidade Sexual da OAB afirma que país precisa de legislação penal específica que criminalize violência contra a população LGBT.

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Foto: picture-alliance/dpa

Em entrevista à DW no Dia Internacional Contra a Homofobia, Adriana Galvão, presidente da Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), fala sobre os avanços em relação aos direitos da população LGBT e ressalta a necessidade de uma tipificação na lei penal do crime de homofobia.

Segundo ela, nos primeiros quatro meses deste ano, o Brasil teve um aumento de 20% nas agressões contra pessoas LGBT. Em 2016, houve 343 mortes nesse grupo –144 das vítimas eram travestis e transexuais.

"Precisamos de uma legislação penal que criminalize essa violência exacerbada que temos contra a população LGBT. Não estamos caminhando numa legislação que proteja contra esse quadro alarmante de violência contra a população gay", afirma.

Deutsche Welle: O casamento gay, regulamentado há quatro anos, é uma das maiores conquistas da população LGBT no Brasil. Neste dia Internacional Contra a Homofobia, quais os direitos que os homossexuais ainda não alcançaram e mais preocupam?

Adriana Galvão: De todos eles, o aspecto penal. A questão da proteção contra as discriminações injustificadas e também uma tipificação na lei penal do crime de homofobia. Hoje, no Brasil, quando uma mulher é agredida, a pena do agressor aumenta pelo fato de ela ser mulher. No caso da população LGBT, o agressor vai responder segundo a lei do código penal, que vale para todos. O que queremos é colocar uma pena maior, se o crime for caracterizado por motivo de aversão a um homossexual ou a um travesti.

Há algum projeto de lei que torne crime a violência contra pessoas LGBT?

Nós tínhamos o projeto PLC 122, que criminalizava a homofobia. Ele acabou sendo arquivado e levado para discussão junto com as reformas do código penal, em vez de o projeto caminhar sozinho, um projeto que, frente a esses dados alarmantes, poderia ser aprovado de imediato. Por questões de bancadas bastante conservadoras, deixaram arquivar o processo e passaram para as reformas do código penal.

O que se tem hoje de concreto para proteger as pessoas LGBT?

Algumas legislações de âmbito estadual que preveem penas administrativas para práticas de discriminação. Um hotel que sobretaxar um homossexual com seu parceiro, um restaurante que impedir a entrada de um casal gay. Existem penalizações no âmbito administrativo, desde uma multa até, em casos de reincidência, caçar a licença de funcionamento de um estabelecimento. Mas essa é uma legislação pedagógica. Ante a ausência de uma Lei Federal, que pune com pena de prisão, nós tentamos de alguma forma contribuir para que as pessoas LGBT tenham um respeito maior. No mês passado, tivemos a decisão de condenar um restaurante por discriminar homossexuais na cidade de Santos, no estado São Paulo.

Que outros entraves que uma pessoa LGBT enfrenta em seu dia a dia no Brasil?

A questão da doação de sangue, por exemplo, é difícil. Já ingressaram com uma ação no Supremo nesse sentido. A normatização da Anvisa é de que não deveriam ter discriminações no caso de homossexuais que quisessem doar sangue. Mas a pessoa que vai ao banco de doação, ao preencher a ficha, se ela se autodeclara homossexual e se informa que praticou relações sexuais no prazo de 12 meses, ela terá muitas dificuldades para doar sangue, ainda hoje, infelizmente.

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Os assédios no ambiente de trabalho. As piadinhas, as situações vexatórias, muitas vezes excluir a pessoa da convivência com os amigos, de até isolá-lo eventualmente. Uma estatística aponta que 90% das travestis e transexuais abandonam a escola. Eles não conseguem viver no ambiente escolar, pela falta de respeito que existe. Se você tem uma população de travestis e transexuais que não estão na escola, automaticamente eles vão estar fora do mercado de trabalho. Estão nas ruas, se prostituindo e replicando violência.

E não é só no trabalho, na família também. Temos muitos casos de pessoas que expulsam seus filhos de casa. Há um problema grave de aceitação no ambiente escolar. Em 2016, a Rede Trans Brasil apurou que 64 transexuais e travestis tentaram se matar. Desses, 12 consumaram o suicídio. Eles se suicidaram porque não conseguiram ter respeito social. Em geral, essas pessoas não conseguem conviver na escola, sofrem perseguição, não têm acesso ao mercado de trabalho. Elas acabam nas ruas, se prostituindo. E aí vem a questão da violência: muitos deles são flagelados. É um quadro de muita violência.

Como está o Brasil em relação a outros países na questão dos direitos homoafetivos?

Nós caminhamos bastante. É lógico que tem países que penalizam com pena de morte, com prisão perpetua a questão da homossexualidade. No âmbito dos reconhecimentos dos direitos civis, caminhamos muito bem com essa possibilidade da entidade familiar homoafetiva, estamos caminhando também na questão de políticas públicas, para tentar reconhecer a identidade de gênero com relação ao nome social. Outro avanço: o direito ao uso de banheiros de acordo com identidade de gênero. Isso sempre foi muito polêmico. Qual o banheiro que a pessoa deveria usar: de acordo com o sexo biológico ou com a identidade de gênero? Já existe todo um precedente de que a identidade de gênero é a que deve ser respeitada. Por outro lado, o quadro de violência assusta demais. O Brasil, segundo as estatísticas, é um dos países que mais se pratica crimes contra população LGBT. Segundo dados da GGB, um importante grupo gay que fica no estado da Bahia, a cada 25 horas, uma pessoa LGBT é assassinada no Brasil. Nesse sentido, estamos retrocedendo. Os nossos índices de violência são superiores aos outros países da América Latina.

Precisamos de uma legislação penal que criminalize essa violência exacerbada que temos contra a população LGBT. Não estamos caminhando numa legislação que proteja contra esse quadro alarmante de violência contra a população gay.

Além de leis que amparem essas pessoas, o que a sociedade pode fazer para ajudar?

Essa descoberta da sexualidade ainda é vista como uma anormalidade, como uma pessoa que tem desvio. Muitas famílias têm essa percepção porque não enfrentam isso como deveriam. Elas têm medo de como a sociedade vai julgar, tem medo da violência que essas pessoas vão sofrer e acabam não acolhendo seus filhos.É importante ter uma lei que fortaleça essas impunidades , mas o ambiente escolar também precisa fazer a sua parte, conscientizando alunos e pais. Temos de ter escolas mais abertas para discutir a questão da diversidade de gênero. Aqui no Brasil temos um grupo que se chama "Mães para Diversidade”. São mães, filhos, pessoas ligadas à questão LGBT, que se unem justamente para trabalhar os dramas familiares. Eles acompanham casos de filhos que são expulsos, mães e pais que têm problemas para aceitar os filhos. Esses grupos são importantes para fazer um apoio mutuo na sociedade.