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Universidade pesquisa vítimas da fronteira interna alemã

13 de agosto de 2012

Ao contrário das vítimas do Muro de Berlim, as da barreira quilométrica que separava a Alemanha Oriental da Ocidental não costumam ser objeto de estudo. Projeto da FU Berlin pretende revelar quem foram essas pessoas.

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Museum an der ehemaligen innerdeutschen Grenze
Foto: picture-alliance/dpa

No dia 13 de agosto de 1961, o regime comunista da República Democrática da Alemanha (RDA) deu início à construção do Muro de Berlim, o próprio símbolo da divisão do país. Por sua vez, a longa fronteira que separava a Alemanha Oriental da Ocidental chamava bem menos a atenção pública mundial – uma imagem que pesquisadores da Universidade Livre de Berlim (FU Berlin) pretendem mudar.

Ligada à universidade berlinense, a Forschungsverbund SED-Staat – associação de pesquisa sobre o regime do Partido Unitário Socialista (SED, única facção política da Alemanha Oriental) – investiga sistematicamente quantas pessoas foram mortas na fronteira entre as Alemanhas, até o fim da divisão do país, em 1989. Naturalmente já existem dados sobre essas vítimas, porém oriundos de diferentes instituições e, em parte, controvertidos.

Assim como o Muro de Berlim, toda a região de fronteira entre a Alemanha Oriental e a Ocidental era fortemente vigiada. E isto, já desde 1949, quando o país foi politicamente dividido, em decorrência da Segunda Guerra Mundial. Do lado ocidental, fundou-se a República Federal da Alemanha (RFA), do lado oriental, a República Democrática Alemã (RDA) – a qual, apesar do nome, era uma ditadura comunista.

Desde o início, a Alemanha Ocidental foi mais bem-sucedida do ponto de vista político e econômico, exercendo, portanto, forte atração sobre os habitantes da RDA. Milhares de cidadãos deixavam o lado oriental a cada dia. Para estancar essa sangria humana, o SED instituiu em 1952 uma área restrita de cinco quilômetros de largura. Medindo quase 1.400 quilômetros, a fronteira interna estendia-se do Mar Báltico até Vogtland, na Saxônia. Quem se arriscava a cruzar essa faixa podia ser preso ou, no pior dos casos, executado.

Devolver a dignidade

A Central de Investigação sobre Criminalidade Governamental e da Unificação (ZERV, na sigla em alemão), criada depois da Reunificação, em 1990, contabilizou 248 mortes na fronteira interna alemã. O número real pode ser bem mais alto.

Biografias recordarão efeitos brutais do regime, espera ministro Neumann
Biografias recordarão efeitos brutais do regime, espera ministro NeumannFoto: Projekt Gedächtnis der Nation

Para os pesquisadores da Universidade Livre, entretanto, os seres humanos importam mais do que meras estatísticas. Ao pesquisar os destinos individuais e dar nome e feições às vítimas, a intenção é lhes devolver a dignidade.

"Suas biografias nos farão lembrar com que brutalidade a ditadura da RDA e o desumano regime de fronteira agiram sobre os alemães", disse Bernd Neumann, ministro da Cultura e Mídia, na apresentação do projeto no Memorial do Muro de Berlim da Bernauer Strasse, na capital alemã. A divulgação dos resultados totais está prevista para 2015, com um necrológio contendo breves biografias das vítimas.

Ordem para atirar

O projeto dispõe, de início, de 500 mil euros, dos quais quase três quartos provêm do Ministério da Cultura e Mídia e o restante, dos governos da Saxônia-Anhalt, Hesse e Baixa Saxônia – estados que a fronteira interna alemã atravessou durante quase 41 anos.

O secretário de Cultura da Saxônia-Anhalt, Stephan Dorgerloh, alegra-se com o fato de que, 22 anos após a Reunificação, se valorizem os destinos daquelas vítimas do regime da RDA, sempre um pouco ofuscados pelos mortos do Muro.

Guardas armados vigiavam fronteira entre duas Alemanhas
Guardas armados vigiavam fronteira entre duas AlemanhasFoto: ullstein - Lehnartz

Sem dúvida, Berlim foi o símbolo da divisão alemã mundo afora, mas agora é hora de colocar em foco a fronteira interna alemã, que "já estava selada muito antes da construção do Muro de Berlim", ressalta Dorgerloh. Na verdade, os moradores da atual capital podiam circular com relativa liberdade até o início da construção do Muro, em 1961.

Enquanto isso, há muito a fronteira interna estava guardada com arame farpado e postos de controle militar. Com passar do tempo, cada vez menos candidatos á fuga conseguiam vencer os numerosos obstáculos. Os soldados tinham ordem para atirar, e havia mais de 1 milhão de minas terrestres instaladas.

Dimensão trágica

Mesmo com o controle pesado, o número de tentativas de fuga continuou alto. Com base em documentos do Ministério de Segurança Estatal (Stasi), Klaus Schroeder, diretor do projeto da universidade berlinense, aponta que quase 5 mil pessoas se arriscaram entre 1974 e 1979, por exemplo.

Destas, somente 229 conseguiram chegar ao lado ocidental. Quase uma centena foi atingida por minas ou por mecanismos de tiro automático. Segundo Schroeder, não constam dos arquivos da Stasi quaisquer informações sobre o destino dos demais fugitivos.

Para ele, o projeto que dirige é mais do que um desafio científico. Há também uma motivação pessoal por ele ter crescido no bairro de Lübeck-Travemünde, no estuário do Rio Trave com o Mar Báltico, do lado ocidental e bem á vista da fronteira.

Klaus Schroeder dirige projeto de pesquisa da Universidade Livre
Klaus Schroeder dirige projeto de pesquisa da Universidade LivreFoto: picture-alliance/dpa

Os limites foram fechados relativamente cedo, com uma cerca, homens armados e cães treinados, relata o diretor. Assim, as autoridades orientais pretendiam impedir que seus cidadãos fugissem pela praia ou pelo mar. A descoberta de um corpo na praia foi a primeira experiência negativa de que Schroeder se lembra: "Nós, crianças, não conseguíamos entender aquilo de jeito nenhum".

Sobretudo para a geração mais jovem, sem ligação pessoal com a divisão da Alemanha, o tema muitas vezes não passa de um capítulo tratado nas aulas de História, e a trágica dimensão humana permanece algo abstrato. Espera-se que o projeto de pesquisa dê acesso às vítimas da antiga fronteira interna de maneira mais concreta e, de certa forma, sensorial. Os planos incluem uma página na internet que contará sobre as fugas fracassadas a partir de histórias individuais, anuncia Schroeder.

Autor: Marcel Fürstenau (lpf)
Revisão: Augusto Valente