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Um país flerta com a autodestruição

30 de maio de 2018

Notícias falsas, polarização, troca de agressões: greve dos caminhoneiros evidencia como o diálogo se tornou difícil e a gritaria se impõe. Isso é um mau sinal para as eleições, afirma o colunista Thomas Milz.

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Brasilien - Straßenblockade gegen hohe Treibstoffpreise
Caminhoneiros bloqueiam a BR-116 nos arredores de São PauloFoto: picture-alliance/AP/A. Penner

Nenhuma situação é tão ruim que não possa ficar ainda pior, diz um antigo provérbio. No momento, a situação no Brasil é muito ruim, mas, mesmo assim, todos os lados parecem se esforçar para jogar ainda mais lenha – ou seria diesel? – na fogueira.

Aos poucos, a ficha começa a cair para mim: este país quer soluções radicais, quer se fazer em pedaços. Dada à complexidade do problema, esta parece ser a solução mais simples e, assim, a mais satisfatória. É como diz o ditado: ontem estávamos à beira do abismo, hoje já estamos um passo adiante.

DW Kolumne Realpolitik | Thomas Milz
O jornalista Thomas MilzFoto: Arquivo Pessoal

Para começar há as notícias falsas, que estão por todos os cantos e que tornam a situação durante a greve dos caminhões ainda mais obscura. Elas servem para promover um clima de confusão geral. E pânico. Podia-se ler que o governo vai bloquear o aplicativo de notícias WhatsApp para estrangular a greve. Ou que vai desligar a eletricidade para acabar com a greve.

Até mesmo conhecidos bem informados me asseguraram que o presidente Michel Temer em pessoa está por trás da greve. Sua intenção seria criar o caos e, assim, justificar um golpe militar para cancelar as eleições de outubro.

Bom, notícias falsas existem em todos os lugares e, pelo jeito, elas decidem eleições e referendos em todo o mundo. Mas certamente não fazem bem para o clima já acirrado no Brasil.

Afinal, sociedades só são bem-sucedidas quando são capazes de reunir na mesma mesa as diferentes posições e chegar a um compromisso em que todos cedem um pouco. Democracia também significa, afinal, deixar que aqueles que pensam diferente tenham seu espaço para existir.

Isso a democracia brasileira ainda não aprendeu. Em vez disso, todos gritam mais alto para silenciar o outro. Chamam isso de "palavras de ordem", embora, é claro, elas apenas fomentem a desordem. Em alguns discursos há um desejo explícito de eliminar o oponente político. O Brasil ainda arrasta consigo seu legado autoritário, e nele quem pensa diferente não têm qualquer espaço. Assim, os campos se opõem com uma virulência nunca vista. Diálogo ninguém mais quer. Em vez disso, todos parecem à procura de tumulto e confronto.

Enquanto isso, o governo do presidente Michel Temer se encaminha para o colapso. Mesmo os partidos que pertenciam à base de Temer rejeitaram nesta terça-feira (29/05) uma ofensiva conjunta promovida pelo governo para acabar com a greve dos caminhoneiros. O governo é fraco e está no fim, dizem políticos antes leais a Temer.

Uma terceira acusação contra Temer, que poderia ser apresentada a qualquer momento pela Procuradoria-Geral, provavelmente não conseguiria ser bloqueada no Congresso pelo presidente. Mas talvez ele caia também pela pressão das ruas. Políticos da oposição já clamam por uma greve geral. Nunca a queda de Temer pareceu tão próxima. Mas ela teria algum sentido agora, apenas quatro meses antes das eleições?

A formação de um governo em curto prazo dificilmente seria possível. A consequência, portanto, seria ainda mais caos nos próximos meses. A economia, já abalada, entraria numa nova recessão, e a confiança dos investidores estrangeiros no Brasil, recém e lentamente reconstruída, seria mais uma vez destruída.

Realizar eleições num clima como esse não traria nada de bom. As forças mediadoras e conciliatórias não seriam ouvidas em meio à gritaria geral. Afinal, ninguém está com paciência para soluções complicadas. As forças radicais, com suas soluções simples, ganhariam. E soluções simples em tempos difíceis não prestam para nada, diz um velho ditado.

Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.

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