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Ucrânia acusa Rússia de impor cidadania a crianças raptadas

6 de janeiro de 2024

Novo decreto facilita processo de naturalização para estrangeiros e apátridas. Kiev, que diz que Moscou deportou ilegalmente mais de 19 mil crianças desde o início da invasão, fala em "assimilação forçada".

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Criança ucraniana é abraçada por avó. Os dois são olhados por uma funcionária do Kremlin e um diplomata do Catar, que estão de costas para a câmera.
Criança ucraniana é abraçada por avó durante negociações diplomáticas que permitiram retorno dela à Ucrânia. Kiev acusa Moscou de ter deportado ilegalmente 19 mil menores.Foto: QATAR'S MINISTRY OF FOREIGN AFFAIRS/REUTERS

Um novo decreto do presidente Vladimir Putin que facilita a concessão de cidadania russa a estrangeiros e apátridas está sendo apontado pela Ucrânia como pretexto para a alienação de crianças ucranianas levadas ilegalmente para a Rússia.

Kiev, que acusa Moscou de sequestrar mais de 19 mil crianças desde o início da invasão em larga escala do território ucraniano, em fevereiro de 2022, afirma que a medida possibilitará a imposição forçada de cidadania russa, por decisão pessoal de Putin, a crianças órfãs ou que foram separadas dos pais.

O decreto, assinado na última quinta-feira (04/01), vem em meio à intensificação de esforços russos para renovar as tropas que combatem na Ucrânia – inclusive recrutando imigrantes.

O texto prevê, entre outras medidas, que os processos de concessão de cidadania envolvendo crianças poderão ser submetidos pelos guardiões legais ou pelo chefe de uma organização russa responsável pelo menor.

Em pronunciamento neste sábado, o ministério ucraniano de Assuntos Estrangeiros disse que o decreto é uma evidência "dos crimes da Federação Russa contra a Ucrânia" e da política russa de "assimilação forçada de crianças ucranianas". "A introdução da nova legislação [...] visa privar crianças russas raptadas da oportunidade de regressar à sua pátria", diz a nota.

Segundo a pasta, a medida, além de uma tentativa da Rússia de resolver sua própria demanda por soldados "às custas de imigrantes", viola os direitos da criança e as leis internacionais.

Em março de 2023, o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu um mandado de prisão contra Putin por crimes de guerra na Ucrânia. A corte sediada em Haia o aponta como responsável pela deportação ilegal de crianças da Ucrânia para a Rússia. A comissária russa para os direitos das crianças, Maria Lvova-Belova também enfrenta as mesmas acusações.

Das 19 mil crianças que a Ucrânia diz que foram sequestradas, apenas 387 puderam regressar às suas famílias. O Kremlin alega proteger as crianças do conflito ao levá-las para a Rússia.

Moscou quer atrair mais estrangeiros para as Forças Armadas

O decreto assinado na última quinta-feira também acelera o processo de concessão de cidadania russa para estrangeiros que se alistarem nas Forças Armadas. O prazo de tramitação caiu de três para um mês.

Soldado russo carrega munição dentro de uma floresta
Soldado russo na guerra na Ucrânia: Moscou quer atrair estrangeiros com promessa de cidadania simplificada.Foto: Stanislav Krasilnikov/SNA/IMAGO

A medida veio em meio a relatos frequentes na mídia sobre operações policiais visando migrantes no país. Pessoas detidas nessas ações estariam muitas vezes sendo orientadas e até mesmo pressionadas a assinar contratos para servir nas Forças Armadas. Aqueles que adquiriram recentemente a cidadania estão sendo enviados aos escritórios de alistamento para determinar se são elegíveis para o serviço militar obrigatório.

A operação mais recente, noticiada pelo jornal independente Novaya Gazeta, ocorreu na véspera de Ano Novo em São Petersburgo e resultou na detenção de mais de 3 mil migrantes. Segundo uma fonte policial anônima citada pela reportagem, a ação tinha por objetivo recrutar homens para o Exército.

Ímã para centenas de milhares de pessoas vindas de países mais pobres da Ásia Central, a Rússia já facilitou a aquisição de cidadania em outras ocasiões desde a eclosão da guerra.

Os que assinaram, em setembro de 2022, contratos de ao menos um ano de duração com o Exército, e que combateram por ao menos seis meses na guerra na Ucrânia, foram dispensados da exigência de demonstrar conhecimentos suficientes da língua russa e de comprovar estadia legal no país por ao menos cinco anos. Esses processos também tramitaram em velocidade superior, de até três meses.

Em maio de 2023, outro decreto eliminou o critério de seis meses de combate, passando a beneficiar qualquer um que tivesse assinado contrato de ao menos um ano de serviço com as Forças Armadas durante a "operação militar especial" na Ucrânia.

Desde o início da invasão, o Kremlin já mobilizou um total de 1,32 milhão de combatentes – entre eles estariam até mesmo presidiários, atraídos sob a promessa de anistia.

Pelo novo decreto, aqueles que assinarem contrato com as Forças Armadas não poderão rescindi-lo. O Exército também fica liberado para convocar reservistas adicionais e manter os já alistados em serviço por tempo indeterminado.

O Ministério de Defesa do Reino Unido calcula que a guerra na Ucrânia tenha custado à Rússia até agora entre 150 mil e 190 mil soldados, entre mortos e feridos, e que este número pode chegar a 500 mil até o final de 2024. Nas estimativas dos americanos, o número de baixas seria ainda maior: 315 mil.

ra (AP, Reuters, ots)