Mediação cultural
19 de setembro de 2011Servet Ciftehan sabe exatamente o que significa ter medo, quando se está em frente a um funcionário de um órgão público alemão, sem entender uma palavra sequer. Na profissão de "mediador idiomático de integração" de estrangeiros, o curdo Ciftehan acompanha pessoas de sua origem em visitas a órgãos do governo, hospitais ou escolas.
Ele compreende muito bem a insegurança que eles têm. "Quando vim para a Alemanha, há 14 anos, só sabia respoder ja (sim) quando me perguntavam alguma coisa. Porque não entendia nada e tinha vergonha de dizer isso", recorda o jornalista de 31 anos. Isso resultava não apenas em dificuldades financeiras, mas também em uma sensação de inferioridade e impotência.
Ciftehan quer evitar que outros migrantes passem por esse tipo de experiência. Ele trabalha, há oito meses, como medidador idiomático e de integração na SprIntpool (Sprach- und Integrationspool), ou pool da língua e integração, um serviço financiado pela Igreja, que congrega tradutores na cidade de Wuppertal. A organização trabalha com aproximadamente 30 línguas e dialetos, prestando serviços para hospitais, órgãos públicos, escolas, jardins de infância e órgãos de consultoria e ajuda, que contratam os intérpretes para facilitar o contato com imigrantes das mais diversas origens.
Profissão não reconhecida
"A demanda de intérpretes interculturais é alta", diz Heike Timmen, diretora do projeto SprIntpool. E a participação dos funcionários vai bem além das fronteiras da cidade de Wuppertal. Quase todos obtiveram sua formação profissional nos serviços da Igreja, que desde 2002 formam sobretudo refugiados e requerentes de asilo político para o exercício da profissão de mediadores idiomáticos e de integração.
Esse é, até agora, um projeto único na Alemanha, montado segundo padrões europeus de qualidade, pois em outros países do continente a profissão já existe há pelo menos dez anos.
"Na Alemanha, ainda lutamos pelo reconhecimento oficial desta profissão", diz Heike Timmen. Hoje, já há mediadores atuando em outras cidades, mas nem o financiamento nem a formação profissional seguem critérios unificados, critica ela. Ao contrário do que ocorre, por exemplo, na Holanda e na Suíça, onde o Estado assume parte dos custos e centros supraregionais coordenam a distribuição dos mediadores.
Eliminando mal-entendidos
Isso seria, segundo Timmen, também desejável na Alemanha, onde muitos hospitais e órgãos públicos acabam apelando para parentes dos migrantes ou aos próprios funcionários da limpeza, quando estes vêm dos mesmos países dos imigrantes, para minimizar as dificuldades de compreensão.
Também a cingalesa da etnia tâmil Kirija Kämpf, que vive há 27 anos na Alemanha e é casada com um alemão, já auxiliou por diversas vezes pesoas de seu país de origem, o Sri Lanka, na função de tradutora e intérprete. Ela conta que, após concluir sua formação como mediadora idiomática e de integração, passou a traduzir de maneira diferente.
"Antigamente eu atenuava um pouco as coisas na hora de uma tradução, para dar uma impressão melhor das pessoas do meu país", diz ela. Hoje, na função de mediadora, Kirija Kämpf mantém-se neutra, não somente no que diz respeito ao idioma. Ela procura auxiliar os dois interlocutores, através de explicações sobre diferenças culturais, a entender mutuamente as formas distintas de comportamento e pensamento.
Respeito, abertura e compreensão
Isso acontece, por exemplo, quando tâmeis rescindem seus contratos de moradia ou se demitem de seus empregos sem qualquer documento escrito, provocando a ira dos órgãos públicos alemães.
"Na maioria das vezes, eles fazem isso por falta de informação, pois essas formalidades não são usuais no Sri Lanka", fala Kirija Kämpf. Em casas de apoio a mulheres em dificuldades, muitas vezes as assistentes sociais não conseguem compreender por que as tâmeis mantêm o silêncio a respeito de seus problemas conjugais.
"Aí preciso explicar que, no Sri Lanka, esse assunto é absolutamente reservado. Às tâmeis, por outro lado, explico que as assistentes sociais precisam documentar essa informação", diz ela. Além disso, há também as diferenças na linguagem não verbal, ou seja, um balanço "negativo" de cabeça que para um alemão significa "não", quer dizer, no Sri Lanka, "sim".
"O trabalho do intérprete nunca é somente com a língua, mas sempre também com a cultura", acentua Servet Ciftehan. Por isso, os mediadores idiomáticos e de integração precisam saber exatamente como funcionam os sistemas social, de saúde e educação na Alemanha. E como "se comportam" os médicos, funcionários públicos e professores. Trata-se de fazer com que as duas partes se respeitem e compreendam a visão do outro, observa Ciftehan. "Contribuímos para que uma conversa aconteça sempre aberta, com desenvoltura e amistosa", conclui.
Autora: Sabine Damaschke (sv)
Revisão: Carlos Albuquerque