Suécia chega ao limite na acolhida de refugiados
21 de novembro de 2015Munir Mohamed, um refugiado de Bagdá, abre a lona da barraca e aponta para a filha de nove anos, Noora, que está sentada num carrinho de bebê, tremendo.
"Por favor, diga para a Agência de Migração que nós precisamos de um lugar mais quente", diz ele. "Está frio e meus filhos têm problemas respiratórios."
Trazer de Bagdá para a Suécia Noora e Yusuf – seu outro filho, de oito anos –, ambos deficientes físicos, não foi fácil para Munir e sua mulher, Lekha. Depois que as cadeiras de rodas foram confiscadas na fronteira com a Áustria, ele carregou as crianças nas costas.
Ainda assim, ele não esperava que ao chegar ao seu destino – a sede da agência sueca de migração, na cidade de Malmö – a única proteção que teria contra o frio de novembro seria uma simples barraca de plástico.
A Suécia chegou ao seu limite. Com o afluxo de 10 mil refugiados por semana, a Agência de Migração anunciou na quinta-feira (19/11) que não poderia mais oferecer abrigo para todos os solicitantes de asilo.
"Chegamos a um ponto em que a agência não pode mais garantir um teto para essas pessoas. Não há lugares suficientes", disse o chefe-executivo Michael Ribbenvik.
De certa forma, Munir tem sorte. No dia 15 de novembro, a agência conseguiu converter o espaço que sediou o festival Eurovisão de 2013, em Malmö, num abrigo temporário. Ele e sua família devem ser transferidos para o local.
Um número extraordinário de 190 mil refugiados deve chegar à Suécia este ano – o dobro do que a agência havia previsto no início do ano. O número é superior à população de Uppsala, a quarta maior cidade do país.
Se as previsões estiverem corretas, a Suécia vai acolher 20 mil requerentes de asilo por grupo de milhão de habitantes em 2015, uma proporção duas vezes maior à observada na Alemanha.
Crise
A tensão na Suécia começa a se espalhar na política: o Partido dos Democratas Suecos, que adota uma postura anti-imigração, conta com grande apoio popular, segundo pesquisas. Nas finanças, o governo central e as prefeituras lutam para conseguir recursos e cobrir os custos.
No início do mês, Anna Kinberg Batram, líder do Partido Moderado, de centro-direita, pediu para que a Suécia passe a aplicar o princípio do Acordo de Dublin, que prevê que qualquer solicitante de asilo que tenha circulado por outro país seja impedido de cruzar a fronteira. "Se nós não agirmos, vamos enfrentar um colapso do sistema", advertiu.
Essa retórica representa uma grande mudança para o partido. O antecessor de Batram, Fredrik Reinfeldt, havia pedido em 2014 que os suecos "abrissem seus corações para as pessoas que estavam fugindo de grandes riscos". Em 2013, seu governo tomou a decisão de conceder residência permanente para os sírios que cruzassem a fronteira.
No início deste ano, a Agência de Migração pediu uma dotação extra de 70 bilhões de coroas suecas (cerca de 30 bilhões de reais) nos próximos dois anos para atender a demanda crescente de refugiados. O valor equivale ao orçamento anual de todas as escolas, universidades e recursos usados em pesquisas científicas do país.
A ministra das Finanças, Magdalena Andersson, ainda tem que explicar de onde vai tirar esse dinheiro. Quando anunciou que pretendia cortar verbas de ajuda ao desenvolvimento para apenas 260 milhões de coroas e assim liberar mais fundos para atender refugiados, Andersson foi criticada por várias organizações, entre elas a WWF e a Igreja da Suécia.
Dificuldades
O maior problema de Malmö é o número de menores desacompanhados que chegam à cidade. Na Suécia, a responsabilidade sobre as crianças cabe às prefeituras.
Outros requerentes de asilo são enviados para todos os locais possíveis. A Agência de Migração está tão desesperada para encontrar abrigos que chegou ao ponto de mandar refugiados para lugares como Riksgränsen, um resort de esqui que fica 200 quilômetros acima do Círculo Polar Ártico.
"Malmö é agora é um ponto de trânsito para refugiados. Depois do registro, eles são enviados de ônibus para todo o tipo de lugar", afirma Marie Olsson, que chefia um centro de assistência para a autoridade regional de saúde na cidade. "Não temos lugar para eles em Malmö. Todos estão cheios."
Olsson abriu no mês passado uma clínica de emergência para refugiados, que conta com médicos e enfermeiras.
"Temo que as pessoas que fazem trabalho voluntário estejam cansadas", diz ela. "São sempre as mesmas pessoas, que trabalham oito horas por dia em seus empregos regulares e depois vêm trabalhar de graça no centro de refugiados."
Prefeituras pelo país tentam recrutar milhares de professores aposentados para ensinar a língua sueca aos recém-chegados. Por dia, a Suécia recebe 600 requerentes de asilo, número menor do que a média de 1,5 mil que vinha chegando diariamente.
O porta-voz da Agência de Migração, Tobias Aakerman, teme que a diminuição seja apenas temporária.
"Nas balsas, começaram a solicitar documentos, o que restringiu a vinda de refugiados a partir da Alemanha. Mas pode ocorrer que as pessoas comecem a entrar por meio da Dinamarca. Ainda é cedo para dizer", afirma.