Seleção redefine o conceito de "ser alemão"
24 de junho de 2006No jogo de abertura contra a Costa Rica, dois gols foram marcados por Miroslav Klose, polonês naturalizado alemão. A partida contra a Polônia, vencida por 1 a 0, foi pontuada por chances desperdiçadas tanto por Klose quanto por seu companheiro de equipe, o atacante Lukas Podolski, que também jogava contra seu país de origem. O único gol do jogo, decidido nos acréscimos, foi de autoria de Oliver Neuville, nascido na Suíça, que recebeu o passe de David Odonkor, cujo pai nasceu em Gana.
Na última partida dos alemães na primeira fase da Copa, os "estrangeiros" Klose e Podolski foram os autores dos gols contra o Equador. Klose, artilheiro da Copa, marcou os dois primeiros e seu companheiro de equipe e compatriota fechou o placar em 3 a 0.
Outra estrela do time, Gerald Asamoah, também nasceu em Ghana, mas naturalizou-se alemão a tempo de jogar pelo país na última Copa do Mundo, em 2002. Kevin Kuranyi, cortado de última hora da lista de convocados, nasceu no Brasil. Patrick Owomoyela, meio-de-campo, tem origem nigeriana.
Cinco dos seis jogadores do ataque têm raízes estrangeiras
Interessantemente, cinco dos seis jogadores da linha de frente alemã têm raízes em países que também conseguiram se classificar para a Copa – Polônia, Suíça e Ghana. Em diferentes circunstâncias, esses atletas poderiam estar jogando no outro lado do campo.
"Muitas pessoas acham que eu deveria jogar por Gana, mas foi uma decisão minha jogar onde eu me sinto melhor", diz Asamoah, que descreve a si mesmo como "o jogador mais negro" a ter jogado na história do time alemão. "É uma honra jogar pela Alemanha", afirmou em entrevista ao The Independent londrino.
Antes de Asamoah, somente dois jogadores negros haviam vestido a camisa alemã: Erwin Kostedde e Jimmy Hartwig, filhos de afro-americanos, que jogaram pela Alemanha ocidental em 1970 e eram vítimas de insultos racistas.
Racismo no futebol
Mesmo Asamoah, que joga pelo Schalke, já sofreu com xingamentos racistas e torcedores que lhe atiraram bananas, na cidade de Cottbus, no Leste da Alemanha. Esta corrente do futebol veio à tona quando a direita do Partido Nacional Democrático (NPD) produziu uma foto do jogador com os dizeres: "Não, Gerald, você não é alemão".
"Aquilo realmente me machucou", desabafa Asamoah. "A briga contra os radicais de direita pode ser algo para o futuro, quando eu já tiver terminado a minha carreira como futebolista."
Mas há quem esteja disposto a não adiar a peleja. "Apesar de o racismo ser muito mais evidente nos países vizinhos, o elemento da violência racial, que já matou mais de cem pessoas, cresceu desde a unificação", diz Andreas Marx, especialista que escreve atualmente um trabalho sobre futebol e integração para a Fundação Heinrich Böll. "No Leste, onde há relativamente menos estrangeiros, negros e mulatos são mais 'visíveis' e pessoas de aparência diferente são simplesmente tachadas pelos extremistas de direita."
Uma seleção que reflete a diversidade étnica de seu país
Em uma nação de 82 milhões de pessoas, 19% da população tem passado de migração, de acordo com o Departamento Federal de Estatísticas.
"Já era hora de a seleção alemã de futebol refletir a diversidade étnica de sua nação", diz Hans-Georg Soeffner, que coordena um projeto de assimilação no ambiente do futebol na Universidade de Constança. "Além disso, o sucesso no futebol é uma boa oportunidade para a mobilidade social de famílias de imigrantes, que tendem a vir de um ambiente socioeconômico mais simples."
Turcos são mal representados na seleção
Estranhamente, os turcos, maior comunidade imigrante na Alemanha, quase não foram representados na seleção, com exceção do antigo jogador Mehmet Scholl, cuja mãe era turca.
O problema é que muitos jogadores turcos de qualidade aptos a adquirir a naturalidade alemã preferem jogar por seu país de origem.
"Eles jogam pela Turquia, em parte por causa dos esforços inteligentes e inesgotáveis que a Associação Turca de Futebol tem feito no sentido de recrutar grandes talentos na Alemanha e na Europa", diz Merx. "Mas a discrimição por parte dos companheiros de equipes nas divisões mais baixas também é uma razão pela qual os turcos abandonam as ligas alemãs."
Mesmo os poloneses são alvo de discriminação na Alemanha – são freqüentemente vítimas de chacotas que falam de ladrões de carros que tomam os empregos de alemães de respeito. Todavia, aqueles que conseguem chegar ao topo não são somente um modelo positivo a ser seguido, mas tornam-se também grandes ídolos e passam a ser adorados por milhões de torcedores em todo o país.