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Quem tem olhos para ver a natureza

Simone de Mello28 de julho de 2006

Em um novo livro ensaístico escrito em co-autoria, o romancista Andreas Maier faz uma discreta ode à redescoberta da natureza e descreve os caminhos de uma éducation naturelle a dois.

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'Floresta, prados, pássaros são conceitos poéticos e ao mesmo tempo clichês'

"Dissemos que a pereira era bastante grande e bonita, e o nosso conhecido nos olhou interrogante. Para ele, aquilo só fora uma árvore até então, e agora era uma pereira. Se ele tivesse perguntado como tínhamos reconhecido isso, teríamos lhe explicado que era muito simples. Uma pereira, observada como silhueta, parece uma pêra. Mas para tal, o nosso conhecido talvez tivesse que conhecer a aparência de uma cerejeira ou uma macieira, como contraponto."

Para quem lamenta não saber distinguir uma pereira de uma macieira ou tiver interesse de aprender a reconhecer outros pássaros, além de pardais e pombas, é de se recomendar a leitura de Bullau: Versuch über Natur (Bullau: Esboço sobre a Natureza), do romancista alemão Andreas Maier em co-autoria com a germanista Christine Büchner.

Natureza sem purismos

Não se trata exatamente de um manual de aves, árvores e ervas, mas sim de um conjunto de pequenos ensaios divagantes acerca da ignorância e do aprendizado sobre a natureza. Para tal, os autores não levam o leitor a expedições exóticas ou aventuras distantes da civilização. O próprio nome do livro, Bullau (uma pequena localidade ao sudeste de Darmstadt, não muito longe do Rio Neckar), já indica isso.

A busca da natureza neste livro se dá entre pistas de esqui, restaurantes, bancos de parques, sacadas de apartamentos, em parques urbanos ou áreas verdes próximas à cidade, ou seja, nos vãos que ainda restaram de uma natureza domesticada.

"O que tentamos encontrar neste lugar e que não tentamos achar numa casa ou numa rodovia ou no aeroporto de Frankfurt? Não, não é o silêncio, a beleza ou simplesmente: a natureza. É quase impossível dizer o que é natureza e o contrário disso, mas mesmo se usarmos este conceito de forma imprecisa, muitas vezes a natureza não é bonita nem silenciosa. (...) Sentimos a nostalgia por algo que se encontra em parte nela, mas em parte também nas pessoas, por exemplo, quando elas criam campos ao longo de pistas de esqui."

Tentativa e erro ao ar livre

Andreas Maier, deutscher Schriftsteller
Andreas MaierFoto: dpa

O interessante desses pequenos ensaios coligados por alguns fios condutores e motivos temáticos é uma concepção não purista de natureza. Por um lado, os autores – que afirmam fazer registros conjuntos de "fatos" da natureza descobertos a dois – fazem um certo culto em torno de certos pássaros e flores. Por outro, não se trata de falar da natureza, mas sim de aprender a perceber os fenômenos naturais, mesmo em meio a tantas interferências humanas.

"As pessoas têm uma meta, e por isso passam ao largo do mundo", diz o veredicto. Ou seja, a educação natural consiste em começar a notar a existência de certas coisas que o desconhecimento torna invisíveis. Mas isso exige paciência. O longo caminho dos autores até o reconhecimento de pássaros "fora do eixo pardal-pomba" passou pelo estudo de imagens em livros e do canto de aves em discos. Mas na natureza as coisas não são tão simples como nos livros...

A contemplação da natureza é uma questão de paciência, de tenacidade diante dos freqüentes fracassos. Para quem tenta identificar pássaros que estão gorjeando aos bandos no topo de uma árvore, a paciência de esperar pelo momento oportuno ao reconhecimento é fundamental.

Pombas também são natureza

"Já tivemos esta experiência muitas vezes. A gente espreita algo nas regiões superiores das árvores e espera que a tenacidade compense. Então estica a cabeça, afundando-a no pescoço até ficar com torcicolo ou tontura. E mesmo assim, não se enxergou nada. Só após uma série de fracassos, se chega à conclusão banal de que o olho humano, seja qual for a luz, mesmo com uma iluminação favorável, simplesmente não foi feito para enxergar algo do tamanho de um melro se movendo lá em cima, a quinze metros na vertical, numa brenha de folhas ou agulhas de pinheiros."

Neste livro conjunto com Christine Büchner, Andreas Maier – que se estabeleceu como uma voz de destaque do romance contemporâneo alemão com Wäldschestag (2000) – deixa apenas entrever de leve seu estilo obsessivo, limítrofe ao humor e ao grotesco. A obra, nada pretensiosa na execução, se insere numa longa tradição alemã de reflexão sobre a natureza, sem qualquer nostalgia por um espaço natural intacto. Uma prova disso é o epílogo do livro, uma ode às pombas ao redor da Catedral de Colônia.

Andreas Meier, Christine Büchner: Bullau: – Versuch über Natur. Frankfurt am Main: Heinrich & Hahn, 2006.