Presidente e primeiro-ministro do Sri Lanka vão renunciar
9 de julho de 2022O presidente do Sri Lanka, Gotabaya Rajapaksa, decidiu renunciar ao cargo, afirmou neste sábado (09/07) o chefe do Parlamento do país. Com a decisão, ele cede à intensa pressão popular após um dia violento de protestos, em que manifestantes invadiram a residência oficial do presidente e incendiaram a casa do primeiro-ministro em Colombo.
O anúncio – resultado da dramática escalada após meses de atos antigovernamentais, em grande parte pacíficos, contra a terrível crise econômica que assola a ilha no Oceano Índico – foi recebido com uma explosão de fogos de artifício na cidade.
Rajapaksa ainda não se pronunciou pessoalmente sobre a decisão.
Mahinda Yapa Abeywardena, presidente do Parlamento do Sri Lanka, afirmou em um comunicado em vídeo que o presidente o informara de que deixaria o cargo na próxima quarta-feira.
"A decisão de renunciar em 13 de julho foi tomada para garantir uma transferência pacífica de poder", disse Abeywardena. "Eu peço ao povo, portanto, que respeite a lei e mantenha a paz."
O primeiro-ministro do país, Ranil Wickremesinghe, também disse que renunciará para abrir caminho para um governo de todos os partidos, afirmou seu gabinete em um comunicado na noite deste sábado.
Ainda não se sabe ao certo se os anúncios acalmarão os ânimos populares no país asiático de quase 22 milhões de habitantes.
Detalhes de como ocorreria essa transição de poder também não estão claros. O presidente do Parlamento chegou a mencionar a sugestão de uma reunião entre partidos políticos que incluiria a escolha de um presidente interino pelo Parlamento dentro de uma semana.
Residências invadidas
Ao longo do dia, forças de segurança não conseguiram conter uma multidão de manifestantes que saíram às ruas para exigir a renúncia de Rajapaksa e culpá-lo pela pior crise econômica no país em sete décadas.
A polícia chegou a disparar tiros para o ar e recorreu a gás lacrimogêneo, mas não conseguiu impedir que um grupo rompesse o perímetro de segurança em torno da residência oficial. Nem Rajapaksa nem Wickremesinghe estavam em suas casas quando os prédios foram atacados.
Dentro da residência do presidente, uma transmissão ao vivo no Facebook mostrou salas e corredores lotados com centenas de manifestantes, alguns cobertos com a bandeira nacional.
Em vídeos que circularam amplamente nas redes sociais, também foi possível ver alguns dos manifestantes pulando na piscina da casa, enquanto outros se sentavam em uma cama de dossel e nos sofás. Alguns ainda foram vistos esvaziando uma cômoda.
A mansão da era colonial é um dos principais símbolos do poder estatal do Sri Lanka.
Fontes do Ministério da Defesa afirmaram que o presidente deixou o prédio na sexta-feira e "foi escoltado para um lugar seguro", como medida de segurança antes da manifestação prevista para o fim de semana. Seu paradeiro ainda é incerto.
Mais tarde neste sábado, vídeos divulgados em canais de notícias locais mostraram um enorme incêndio e fumaça saindo da residência privada do primeiro-ministro Wickremesinghe. Seu gabinete disse que o fogo foi iniciado por manifestantes.
Não houve relatos de feridos no incêndio. Wickremesinghe também foi transferido para um local seguro, informou uma fonte do governo à agência de notícias Reuters.
Durante os protestos, ao menos 39 pessoas, incluindo dois policiais, ficaram feridos e foram hospitalizados, segundo fontes médicas.
Protestos maciços
Milhares de pessoas se reuniram neste sábado em Colombo e em outras cidades do país no terceiro mês de protestos contínuos contra o governo e sua gestão da crise econômica.
"Queremos uma mudança, queremos que este presidente vá embora", disse Lakmal Perera, um trabalhador do setor privado que estava entre as centenas de manifestantes reunidos perto do parque Galle Face Green, epicentro dos protestos em Colombo.
"Gotabaya está louco", "Gotabaya está com medo" ou "Gotabaya vá para casa" eram alguns dos slogans entoados na capital pelos manifestantes.
As autoridades impuseram na noite de sexta-feira um toque de recolher em vários pontos da Província Ocidental, onde fica a capital, após uma marcha de protesto organizada por estudantes universitários, embora as restrições tenham sido suspensas na manhã deste sábado após duras críticas.
A Ordem dos Advogados do Sri Lanka disse em um comunicado que o toque de recolher era "claramente destinado a silenciar a liberdade de expressão e a dissidência".
O diretor da Comissão de Direitos Humanos do Sri Lanka, Rohini Marasinghe, afirmou em outro comunicado estar "alarmado" com as ordens dadas ao Exército do país para preparar as tropas para manterem a ordem nas ruas.
Crise econômica
A situação de violência no país ocorre em meio a uma das piores crises econômicas que o Sri Lanka vive desde a sua independência, em 1948. O Sri Lanka sofre meses de escassez de alimentos e combustível, longos apagões e inflação galopante depois de ficar sem divisas estrangeiras para importar bens vitais.
A tensão e o descontentamento aumentaram na ilha no final de março, quando as autoridades impuseram cortes de energia de mais de 13 horas, o que levou a população a sair às ruas para exigir a demissão do governo.
Desde então, centenas de manifestantes se instalaram nas proximidades da sede de governo em Colombo, e protestos pacíficos se tornaram constantes em todo o país.
O Sri Lanka deixou de pagar sua dívida externa de 51 bilhões de dólares e está em negociações de resgate com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Nove pessoas foram mortas e centenas ficaram feridas quando confrontos eclodiram em todo o país depois que partidários de Rajapaksa atacaram manifestantes pacíficos do lado de fora do escritório do presidente em maio.
ek (AP, Reuters, AFP, Lusa, Efe)