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"Polarização se tornou parte do dia a dia no Brasil"

Jean-Philip Struck13 de agosto de 2015

Para o especialista Bernhard Leubolt, polarização política é fruto de uma campanha eleitoral acirrada e de resultado apertado. "Esse clima de ódio vem principalmente da direita", afirma.

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Foto: Reuters/S. Moraes

A vitória apertada da presidente Dilma Rousseff na última eleição e a deterioração econômica do Brasil estão exacerbando a radicalização dos brasileiros – e essa polarização parte, sobretudo, da direita, afirma o professor Bernhard Leubolt, da Universidade de Economia de Viena, na Áustria.

Leubolt é autor de um estudo comparativo entre o desenvolvimento da África do Sul e do Brasil. Para ele, uma eventual queda de Dilma vai também lançar a esquerda brasileira no campo radical.

Confira os principais trechos da entrevista concedida à DW Brasil, a segunda da série com especialistas em Brasil e América Latina de todo o mundo. O primeiro entrevistado foi o americano Peter Hakim.

O senhor acredita que um impeachment de Dilma Rousseff teria chance de avançar?

Isso é muito difícil de avaliar neste momento. Ao contrário de outros políticos, um processo contra Dilma não será determinado pela suspeita de que ela se envolveu pessoalmente em algum esquema de corrupção. Nesse campo pessoal não há nenhum terreno para avançar. Pode-se até argumentar que o PT praticou financiamento ilegal na campanha, mas o principal partido da coalizão de governo – o PMDB – e o PSDB também fazem uso dessas práticas.

Bernhard Leubolt
Bernhard Leubolt, da Universidade de Economia de VienaFoto: Bernhard Leubolt

Sobra o processo em relação à auditoria das contas do governo no último ano, que poderia ser uma razão para um processo de impeachment. E, mesmo assim, as chances de sucesso de um processo vão estar intimamente ligadas a uma eventual pressão das ruas, já que no momento não é possível acusar Dilma de enriquecimento. A pressão da sociedade civil vai ser crucial.

A situação política iria melhorar ou piorar com uma eventual saída de Dilma?

Depende do ponto de vista. Alguns grupos utilizam a fraqueza da presidente para fazer avançar os seus interesses. Para esses grupos, seria melhor a presidente permanecer.

Em qualquer caso, a esquerda política vai ficar severamente enfraquecida, enquanto a direita política vai partir para a ofensiva. Possivelmente, a direita iria se tranquilizar com uma renúncia da presidente. No entanto, permaneceria um sabor amargo para a esquerda, que interpretaria a renúncia forçada da presidente como um golpe branco.

A polarização política, então, possivelmente seria empurrada também para o outro lado, com a extrema esquerda passando a acusar a direita de "golpismo" e de não respeitar o resultado das eleições democráticas.

Por que a política brasileira se tornou tão problemática e polarizada? Existe um clima de ódio?

O ano de 2014 foi marcado por uma eleição presidencial muito polarizada em que Dilma derrotou Aécio Neves, do PSDB, por uma margem muito estreita. A polarização política passou então a fazer parte do dia a dia das pessoas, e não mais só da política. Esse sentimento vem sendo alimentado pelo grande escândalo de corrupção, que implica políticos de todos os principais partidos políticos.

Só que a mídia só reforça o envolvimento no escândalo de personalidades importantes do PT. E isso coincide com o aparecimento de grupos particularmente polarizantes. Alguns grupos, por exemplo, pedem abertamente um golpe militar contra o "PT comunista", afirmando que o partido quer criar a uma nova "Cuba".

Esse clima de ódio vem principalmente da direita. Já em 2013, pessoas com camisas vermelhas foram espancadas em manifestações. Críticas à política social do governo, que só eram ouvidas dentro de casa nos últimos anos, agora são explicitadas em cartazes nas ruas.

As manifestações de 2015 tiveram participação desses grupos radicais, que pedem abertamente um golpe militar. E tais manifestações radicais estão sendo amplamente toleradas. Isso me parece algo novo.

O sistema brasileiro parece centrar toda a responsabilidade no presidente. Nos últimos meses, Dilma está sendo apontada como a figura central da crise. Essa visão é justa? A responsabilidade pela turbulência é só do seu governo?

Na minha opinião, há muitos fatores para a crise. Eu não acho que a culpa seja exclusivamente da presidente. Parece uma estratégia política de atores individuais que tentam jogar uma culpa exclusivamente na presidente e no PT. E isso está funcionando.

O atual modelo de presidencialismo de coalizão está esgotado ou o problema foi como este governo lidou com esse sistema?

O modelo brasileiro não só combina um governo de coalizão, mas também conta com eleições que focam em personalidades. Num país do tamanho do Brasil, a formação de alianças políticas fica consideravelmente mais difícil. Mesmo antes do atual governo, já houve relatos de compra de votos, etc. no parlamento brasileiro.

É urgente instituir reformas para fortalecer os partidos políticos. A atual crise política tem a ver não só com a cooperação entre os poderes Executivo e Legislativo, mas também com a adesão muito ambivalente do PMDB – o principal partido da coalizão – ao governo.

O atual presidente da Câmara, Eduardo Cunha, já estava entre os principais críticos do governo antes mesmo da sua eleição [para a presidência da Câmara]. Quando o Judiciário começou a investigá-lo, na esteira do escândalo de corrupção, ele passou a acusar o governo de forjar uma conspiração contra ele e anunciou publicamente o fim da sua cooperação.

Em 2015, o retorno à democracia celebra o seu 30º aniversário. Simultaneamente, o cenário brasileiro é marcado por uma profunda crise econômica e política. Como o senhor avalia a situação atual no Brasil?

A situação atual do Brasil pode ser descrita como uma crise múltipla: política, econômica, mas também em termos de cultura e meio ambiente. Na minha opinião, existe uma relação estreita entre o desenvolvimento político e social do país com a crise múltipla.

Com a desaceleração da economia, as divisões sociais do país voltaram a ficar mais visíveis. Particularmente na classe média surgiu uma nova resistência. Novas dinâmicas de conflito são encontradas na luta bem-sucedida contra a pobreza.

Enquanto muitos novos postos de trabalho foram criados no setor de baixa renda, as ofertas de empregos melhor remunerados ficaram estagnadas. Em 2013, esses sentimentos foram manifestados pela primeira vez em manifestações de grande escala.

Os protestos em 2013 foram inicialmente feitos por movimentos políticos de esquerda, mas, depois, os principais meios de comunicação social apresentaram essas manifestações de uma forma positiva, como críticas ao governo, o que fez com que grupos conservadores e de direita pulassem nesse trem.