Oposição em parafuso
2 de julho de 2003Por muito tempo se criticou Gerhard Schröder e seu gabinete por parecerem não saber como tirar a Alemanha do atoleiro econômico e financeiro. Um prato cheio para a oposição, cujas propostas de redução de impostos e cortes sociais sempre esbarraram nos ideais social-democratas e verdes. Sem encontrar outra saída, Schröder vem se afastando das posições tradicionais de seu partido e adotando medidas pregadas pela União Democrata Cristã (CDU) e União Social Cristã (CSU).
Com isto os partidos conservadores vivem dias difíceis. Como fazer oposição quando o governo propõe o que também se defende? O máximo tem sido alegar que Schröder está fazendo só pela metade o dever de casa. As propostas seriam insuficientes. E na hora de votar? Mesmo não sendo contra, rejeitá-las? Esta tática seria tranqüila para uma oposição que fosse minoritária, mas não para uma que domina a câmara alta e é, portanto, co-responsável pelas leis, reformas e a conjuntura.
Alívio fiscal
– O exemplo mais recente chama-se reforma tributária. Após alguns dias de debate público, o governo oficializou no fim de semana sua pretensão de antecipar a terceira etapa do alívio fiscal em um ano para 1º de janeiro de 2004. Democrata-cristãos e social-cristãos clamam há anos por redução de impostos, para estimular a economia. A primeira reação da oposição foi criticar o governo. Mas, por não ter como justificar um eventual bloqueio à iniciativa no Bundesrat, acabou se rendendo."Vamos viabilizar a antecipação da reforma tributária. É um preceito da inteligência política. Com um bloqueio, iria prejudicar meu próprio Estado", reagiu Edmund Stoiber, presidente da União Social Cristã (CSU) e governador da Baviera, na terça-feira. A presidente da União Democrata Cristã (CDU) fez coro. Para Angela Merkel, a decisão corresponde "à voz da sensatez". "Vamos dar nossa contribuição para concretizar a iniciativa. A melhor solução é, entretanto, uma grande reforma tributária, na qual estamos trabalhando", acrescenta Dietrich Austermann, porta-voz da bancada federal unificada CDU/CSU para assuntos orçamentários.
Pressão externa e interna
– O sim à iniciativa do governo certamente não foi fácil. E, na verdade, sua forma enfática pegou o país de surpresa. Por acaso ou não, no mesmo dia, importantes jornais de linha conservadora haviam cutucado as uniões a dar o passo. O Frankfurter Allgemeine Zeitung, por exemplo, questionara se Angela Merkel poderia continuar na presidência da CDU se ela não conseguisse uma posição única de seu partido com a da CSU. O Financial Times Deutschland estampara: "Reforma tributária leva CDU ao caos". Mais claro fora o sensacionalista Bild. "Abaixo os impostos! Senhora Merkel, assine aqui", convocou o diário mais vendido do país, que costuma usar manchetes intimativas deste tipo para pressionar Schröder e seus ministros.Outra prova da difícil decisão dos presidentes dos dois partidos conservadores é a reação de alguns expoentes democrata-cristãos. O governador de Hessen, Roland Koch, e o vice-líder da bancada federal, Friedrich Merz, estão indignados com o sim de Angela Merkel.
Negociar ainda é preciso
– Mas, assim como na reforma da saúde, a oposição não está agora, com sua atitude, lavando as mãos. E Schröder sabe disto. Tanto que logo após Merkel e Stoiber cederem, o chanceler federal informou de imediato esperar encontrá-los o mais rápido possível para discutir o assunto. O social-democrata sabe que terá de fazer alguma concessão à CDU e à CSU pela abertura do caminho.Os conservadores não deixaram ainda claro o que desejam, mas o contrário. Não querem mais delongas na definição da reforma. Quanto antes se souber seu conteúdo, mais cedo a economia poderá reagir ao novo cenário, embora o alívio fiscal só entre em vigor em janeiro. E também não aceitam que a queda na arrecadação tributária seja toda compensada com o aumento do déficit público.
Nesta quarta-feira, o gabinete Schröder autorizou o Ministério das Finanças a aumentar sua previsão de novo endividamento no ano que vem de 23,8 bilhões de euros para 30,8 bilhões. O ministro Hans Eichel espera, entretanto, usar privatizações (por exemplo, a venda de ações da Deutsche Telekom e do Deutsche Post) e a redução de subvenções para evitar a contração de dívidas de tal ordem.