Opinião
2 de maio de 2007Mesmo antes do início da segunda Conferência Islâmica Alemã, que começa nesta quarta-feira (02/05), em Berlim, o ministro alemão do Interior, Wolfgang Schäuble, deixa claro: o encontro não será nenhum evento "para pôr panos quentes, com troca de amabilidades". O que está certo. Pois não se trata, agora, de apenas dar continuidade ao processo de diálogo entre o Estado e os representantes do islã, iniciado em setembro último [por ocasião da primeira conferência].
O que se discute agora são os problemas concretos cotidianos, como por exemplo a reivindicação dos muçulmanos conservadores por uma oferta, nas escolas, de aulas de educação física separadas para os islâmicos. E, acima de tudo, perguntas essenciais, como: Quem detém a sabedoria de interpretação do islã alemão e quem pode falar em nome dos muçulmanos alemães?
Debate levado à opinião pública
O objetivo do ministro do Interior de integrar o islã na vida civil e seu apelo para que os muçulmanos, que vivem na Alemanha, "se sintam cidadãos de um Estado de direito democrático e neutro em termos de religião", coloca várias questões. Principalmente em relação à pergunta: Quem pode falar em nome do islã? Exatamente por isso foi necessário trazer à opinião pública o debate interno entre a comunidade muçulmana sobre a conservadora, e em parte comandada à distância, Federação Islâmica.
A necessidade da ampliação desse debate tornou-se ainda mais clara depois que quatro federações islâmicas se uniram em torno de uma confederação, o Conselho de Coordenação dos Muçulmanos.
O conselho pleiteia um reconhecimento oficial como entidade de direito público. Isso fortaleceria enormemente sua a influência nas comunidades e associações islâmicas. Na prática, significaria uma artificial transformação do conselho numa entidade eclesiástica, o que certamente não corresponde nem ao islã nem à diversidade da comunidade muçulmana.
Tiro pela culatra
Embora o ministro do Interior tenha negado a essas federações o direito de falar em nome de todos os muçulmanos que vivem na Alemanha, pois elas representam apenas 10% dos muçulmanos no país, o desenrolar da discussão mostra que a luta pela autonomia de interpretação do islã no país não terminou, mas acaba de começar.
Muçulmanos liberais e seculares temem uma pressão cada vez maior por parte dos defensores dos "bons costumes" islâmicos, que dominam essas federações. Além disso, [dar voz a um grupo determinado] significaria um tiro pela culatra para o processo de integração.
Para a maioria dos críticos desse conselho, trata-se de alguns aspectos essenciais: a primazia da constituição liberal-democrática, o respeito claro dessas federações aos direitos humanos e a igualdade entre os gêneros – em suma, o respeito aos direitos básicos não negociáveis.
Ausência de interlocutor comum
Embora, para o islã, nenhuma instituição possa se situar entre Deus e o indivíduo, o Estado constitucional não pode abdicar de negociações com representantes de grupos sociais relevantes. Para o governo alemão, isso pode significar uma desvantagem, diante da ausência de um interlocutor capaz de falar em nome de todos os muçulmanos no país.
Mesmo que a discussão entre muçulmanos conservadores, liberais e seculares (onipresentes na mídia) não sirva para uma aparição pública coesa do grupo no país, o governo deveria incentivá-la e não procurar o fortalecimento de estruturas similares às eclesiásticas.
Pois as divergências entre os muçulmanos deixam entrever uma imagem exata das realidades islâmicas no país: mesmo porque, pelo menos a médio prazo, não vai haver nenhuma representação única de todos os muçulmanos alemães.
Loay Mudhoon, membro da redação árabe da DW-WORLD.DE, é cientista político e especialista em questões relacionadas ao Oriente Médio.