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Opinião: Como ser livre

Catalin Florescu
12 de março de 2017

Ética e moral são valores inegociáveis. Quando se escolhe uma batalha política, é preciso se conectar com os outros para formar uma massa educada - ser tolerante sem ser contaminado pelo ódio, opina Catalin Florescu.

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USA Mexiko Grenze
Cerca na fronteira entre México e EUAFoto: Reuters/J. L. Gonzalez

As massas sempre influenciaram a política – as multidões que levaram Hitler ao poder; as que permitiram, e até louvaram, a crueldade de Stálin; as que protestaram contra o regime soviético em Praga e Budapeste. Quando atingem um tamanho crítico, podem causar uma reviravolta em qualquer situação de crise.

E quando são inspiradas por ideais construtivos e humanísticos, podem mover montanhas. Nos anos 1960, protestos frequentes contra guerra no Vietnã e contra o racismo nos Estados Unidos colocaram o governo sob pressão: a partir disso, a guerra terminou, e os direitos civis prevaleceram.

As revoltas estudantis no Ocidente em 1968 (assim como os protestos de trabalhadores na França) marcaram uma guinada em relação à aceitação silenciosa da década anterior. Muitos dos ideais do final dos anos 1960 gradualmente permearam a sociedade por décadas e delineiam nossas vidas hoje – na aceitação, por exemplo, de outros estilos de vida, equidade de gênero e consciência ecológica. As pessoas no Ocidente deram um passo para se libertar dos limites da ignorância e imaturidade.

Na Alemanha Oriental e na Romênia – para ficar em apenas dois exemplos da esfera de influência soviética – as massas de cidadãos nas ruas derrubaram regimes comunistas. Apesar de muitos suspeitarem – ou estarem certos – de que a Revolução Romena de 1989 foi manipulada e carecia de espírito revolucionário, muitos arriscaram suas vidas por valores democráticos e acesso à informação.

Hoje, as pessoas têm um lampejo de esperança quando veem protestos como os que antecederam a posse de Trump. Mesmo tendo sido eleito democraticamente, ele parece uma ameaça à democracia. Os protestos serão o suficiente para pará-lo? Não parece ser o caso no momento, enquanto outra massa atingiu tamanho decisivo: a porção do eleitorado que colocou esse populista amador no poder.

É importante estar alerta a massas raivosas pervertidas por cinismo e ressentimento. Populistas sequestram expressões como "nós somos o povo" para falar em nome do povo, mas as massas e o povo não são necessariamente a mesma entidade. Essas massas raivosas flertam com o seu "führer".

Na Rússia, a oposição é intimidada ou assassinada, e não existe quase imprensa livre – mesmo assim, russos são admiradores fervorosos de Putin. Inspirados pelas políticas de Orban e Kaczynski, cada vez mais jovens na Hungria e na Polônia estão se voltando para uma forma absurda de nacionalismo – ou radicalismo – de extrema direita. Eles, na verdade, não sabem o que temem, pois só veem estrangeiros quando saem do país. Sua cultura é, de certa forma, homogênea. Mesmo a economia não pode ser culpada pela deterioração do clima social, já que a Polônia está indo bem até agora.

Autor Catalin Dorian Florescu
O escritor Catalin Dorian Florescu Foto: M. Walker

O motivo de o populismo também ser sedutor para jovens no Leste é diferente do Ocidente. A geração de entre 20 e 35 anos cresceu com o comunismo em colapso. O medo, conformismo e oportunismo da era comunista foram seguidos de oportunismo e desespero necessários para assegurar um padrão de vida no capitalismo vulgar dos anos 1990.

O povo quer se libertar da ditadura opressiva do passado, mas quando é libertado, é esmagado. No Leste, levar jovens a apreciar a liberdade é ainda um processo em andamento hoje. Liberdade com responsabilidade não pode ser ditada de cima: se baseia em instituições transparentes e educação. Uma visita à igreja não substitui o processo individual de amadurecimento. Isso acontece nas famílias e na escola e é promovido por um Estado responsável. Nesse contexto, muitos no Leste europeu precisam se perguntar onde as coisas deram errado.

Mas as coisas pelo menos são melhores no Ocidente? De forma alguma, se você ver o quanto os fatos importam. Em EUA, França e Inglaterra, todo mundo que sente ter sido negligenciado pela economia e o Estado se sente no direito de apoiar impostores e brincalhões que denigrem valores humanitários.

Na Alemanha, mesmo aqueles que não passam por dificuldades financeiras apoiam populistas – o que não tem justificativa, uma vez que ética e moral são valores inegociáveis para um indivíduo maduro, mesmo aquele em risco de pobreza e sem perspectivas.

Quando se escolhe uma batalha política, também é preciso achar uma audiência para alcançar seus objetivos. É necessário desenvolver uma abordagem e se conectar com os outros para formar uma massa educada. E é preciso ser tolerante – especialmente frente a religião – sem ser contaminado por sementes de ódio. Uma pessoa é um humano, e ponto – ou pretende ser, pelo menos.

Mas tentar entender as massas alinhadas com o populismo não ajuda. É preciso constantemente se opor com o poder de seu próprio humanismo e educação, características que, porém, não podem ser impostas de cima. Os ideais têm que ser nutridos lentamente, mas de forma constante, para levar o povo à liberdade.

O escritor Catalin Dorian Florescu nasceu em 1967 na Romênia e vive na Suíça desde 1982. Ele recebeu o Prêmio Suíço do Livro em 2011 pelo romance Jakob Beschließt zu lieben (Jacob decide viver, em tradução livre), de 2011.