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Opinião: Chavismo ainda se mantém vivo na Venezuela

Uta Thofern (av)6 de março de 2015

Dois anos após a morte de Hugo Chávez, seu mito ainda não se dissipou, por mais que o desejassem seus adversários. Um culto difícil de suportar, opina Uta Thofern, chefe do departamento América Latina da DW.

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Uta Thofern, chefe do departamento América Latina da DWFoto: Bettina Volke Fotografie

"A religião é o ópio do povo", acreditava Karl Marx. Desde então, da mesma forma que seu modelo anterior socialista, o comunismo leva fama de ser crítico à religião, iluminista: enfim, progressista.

No entanto, o diagnóstico de Marx levou diretamente a um uso inflacionário de símbolos e rituais pseudorreligiosos nos sistemas socialistas. A lógica era: quanto pior a situação, maior o fervor. Durante o século 20, culto pessoal e promessas de salvação se estabeleceram sempre que o socialismo não tinha mais a capacidade de suprir decentemente a seus adeptos.

De forma modelar, isso vinha acompanhado por sintomas de prática religiosa medieval, como tenebrosas demonizações, teorias de conspiração e, é claro, inquisição. O que o diabo era para os cristãos não esclarecidos é para os socialistas, até hoje, o fascismo/capitalismo/imperialismo, alternativamente também a globalização ou a austeridade.

Na Venezuela, os Estados Unidos é que encarnam o "imperialismo do Norte". Na terminologia do governo, os oposicionistas são, na melhor das hipóteses, neoliberais, sem dúvida de direita, até fascistas, e ativos como capangas do inimigo do Norte, geralmente para planejar um golpe de Estado – razão pela qual devem ser preventivamente presos.

Graças a Deus, o pouco carismático presidente Nicolás Maduro pode se apoiar em seu antecessor: "Nosso comandante Chávez, que nos deixou uma grande herança [...], um anti-imperialismo baseado no Cristo Redentor", disse Maduro durante a cerimônia pelo segundo aniversário da morte de Hugo Chávez.

Nos últimos dias, o culto pessoal ao ex-presidente assumiu características tão grotescas diante da desoladora situação venezuelana, que para um observador de fora só é possível suportá-lo com ironia amarga. No entanto, simplesmente zombar dele seria fácil demais. E, ainda por cima, arrogante, pois há razões concretas para a adoração quase religiosa a Chávez, de que seu sucessor se aproveita até hoje.

Antes de Chávez, a Venezuela era um país profundamente dividido do ponto de vista social, em que quase a metade da população vivia em pobreza relativa. Esses cidadãos não só se viam excluídos da riqueza petroleira nacional, como ainda por cima desprezados pela abastada classe superior. Hugo Chávez mudou esses dois aspectos com sua política de redistribuição de renda. Durante seu mandato, de início a quota de pobreza baixou continuamente, enquanto crescia o orgulho dos pobres pela "sua" revolução.

Chávez ainda vivia quando ficou demonstrado que a política econômica bolivariana não era sustentável. Porém foi seu sucessor, Maduro, a ter que arcar com a carga total de uma economia inteiramente dependente do preço do petróleo. Hoje, a taxa de pobreza venezuelana já quase retomou o nível de antes da posse de Chávez. Ao mesmo tempo, o abastecimento de bens e serviços nunca foi tão ruim, sendo quase impossível obter mesmo os artigos mais simples de uso quotidiano.

Quem mais sofre são, obviamente, os pobres, que não como subornar os cada vez mais numerosos fiscais que patrulham voluntariamente os supermercados, nem como conseguir medicamentos através de contatos no exterior. Porém os pobres mantiveram seu orgulho e ele ainda parece, em parte, contrabalançar as rebordosas econômicas.

É fato que os índices de popularidade de Nicolás Maduro caíram pela metade em dois anos, mas isso não significa, nem de longe, que a oposição vá ganhar as próximas eleições, no fim do ano. Até agora o chavismo tem sempre vencido nas urnas, mesmo que por margem estreita, e isso não vai mudar automaticamente enquanto a maioria, mais fraca em termos econômicos, não sentir que está bem pior do que antes da "revolução".

Por isso é tão importante para Maduro atribuir a carência de gêneros de primeira necessidade a uma "guerra econômica" dos EUA, e a cada duas semanas acusar a oposição de uma nova tentativa de derrubar seu governo. Enquanto os pobres não se sentirem representados, mas sim ameaçados por essa oposição, e enquanto aceitarem Maduro como sucessor legítimo do honorável "Comandante", o presidente continuará basicamente seguro.

Além disso, a crítica das nações vizinhas segue diplomaticamente tímida, enquanto Maduro constar como representante democraticamente legítimo de um autoconfiante modelo político antiamericano, adotado por alguns desses países como ideal a ser seguido.

Entretanto, o mal-estar cresce também no próprio partido do presidente. Outros correligionários de Chávez não querem que um presidente inábil estrague sua revolução e seu futuro. Assim, acumulam-se os boatos de um golpe partindo de dentro do partido governamental. Mas é difícil imaginar como ele poderá ser vendido em termos propagandísticos.