E assim o "Maybot" vai dançando em direção ao que quer que o futuro lhe esteja reservando. O futuro de seu país, que alega amar, é ainda mais nebuloso, se não francamente sinistro, graças ao confuso, divisor e enganador posicionamento dela em relação ao Brexit.
Mas não foi apenas a delirante crença de Theresa May de que poderia realizar "o que é melhor para o país". Foi o modo como ela saiu vendendo o país, tanto em Bruxelas como na Câmara dos Comuns. Diz-se que as aparências enganam, mas a persona pública de May – que comunicava frieza e rigidez, e o fato de constantemente lembrar um coelho petrificado por faróis de carro – não a tornou exatamente cativante para um país cada vez mais dividido e polarizado.
Eu, pessoalmente, tenho pouca confiança em alguém cuja confissão "travessa" foi ter corrido pelos campos de trigo quando criança.
Num só golpe, ela selou não só o próprio destino, como o de gerações por vir, com a frase: "Nenhum acordo é melhor do que um mau acordo". No melhor dos casos, isso mostrou completa irresponsabilidade. No pior, é imperdoável essa tentativa de usar sua autoridade de primeira-ministra para validar tal falácia.
Como um inglês que vive e trabalha na Alemanha, não tenho o azar de acordar todo dia com a catastrófica sensação de um país que está, digamos... à beira da catástrofe. Mas estive em Londres para a primeira passeata do People's Vote, em outubro último, e vivenciei a raiva, o desespero, mas também a determinação de milhares de pessoas, jovens e idosas, engajadas numa luta pacífica para tentar impedir seu e meu país de desaparecer no redemoinho de um buraco negro.
Theresa May e – caso estejamos esquecendo – o líder trabalhista Jeremy Corbyn, que empata com ela em termos de espantosa inépcia, escolheram ignorar a vontade do povo. Ela não se encaixava na versão deles de vontade popular, dos que votaram em 2016 para deixar a União Europeia.
Contudo, esses três últimos anos testemunharam uma sensível mudança de percepção e clima, resultante do modo desastroso e autoilusório como May tratou o Brexit. Se tivessem a escolha hoje, muitos daqueles leavers votariam para permanecer.
Anunciando sua despedida, May se disse orgulhosa de haver servido seu país. Não estou bem certo a que serviço ela estava se referindo. Seu desserviço foi deixar o país mais miserável e mais polarizado do que nunca, um país que ficou quase impossível de se governar.
Agora que terá algum tempo para si, talvez May queira procurar seu antecessor, David Cameron – cujo caos ela herdou e de algum modo conseguiu levar a um grau mais alto de incompetência – para discutir, na quase obscuridade do barracão de quintal dele, os méritos ou não de conduzir um país à ruína.
Isso não quer dizer que ela ou Cameron colherão o que plantaram. O lugar de May nas notas de pé de página da história está assegurado, como uma das piores chefes de governo que o Reino Unido já viu – uma façanha considerável, diante do currículo de alguns de seus antecessores. Em vez disso, caberá ao próximo primeiro-ministro ou tentar salvar um país que foi arrastado para as escuras profundezas, ou afundá-lo ainda mais na miséria.
E agora, após essas minhas ruminações sobre a "Dancing Queen", vou jogar água na fervura: enquanto digito estas palavras, confesso que não consigo me livrar da compulsão de gritar "tudo está perdoado, volte, por favor", ao estudar as várias permutações e contemplar a pior opção possível para substituir Theresa May.
Vocês têm razão: não vale a pena nem pensar.
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