Opinião: A farsa política de Washington e suas consequências
9 de junho de 2017Ruim para a reputação, mas não perigoso, é a conclusão sobre o testemunho do ex-diretor do FBI James Comey no Senado americano, nesta quinta-feira (08/06). O questionamento de fato revelou um comportamento presunçoso, autocomplacente por parte de Donald Trump, mas nenhuma prova de potenciais infrações da lei.
Os americanos interpretam o drama político em Washington de maneiras contrastantes. Para os democratas, o depoimento foi mais uma prova de que esse presidente não está à altura do cargo, que é até uma ameaça. Para os trumpistas ficou confirmado: seu herói, um forasteiro da política, é vítima de intrigas políticas engendradas pelo establishment liberal da capital.
O resto da humanidade preferiria poder ignorar essa farsa política, porém não consegue, pois o que acontece em Washington tem consequências. Certo é que Trump permanecerá na presidência. Mas ficará cada vez mais difícil para ele governar, fazer passar leis no Congresso, mostrar liderança na política externa.
Acontece que, embora controlem as duas casas do Congresso, os republicanos seguem com hesitação esse desacreditado presidente. São mínimas as perspectivas de que o atual governo consiga aprovar uma reforma da saúde e dos impostos num prazo razoável, como anunciado.
O depoimento de Comey força Washington a continuar se ocupando de si mesmo. O governo está como que paralisado, um golpe de libertação parece ser simplesmente impossível. Trump nega ter influenciado inquéritos em curso, portanto é sua palavra contra a de Comey. Isso impede o início de um processo de impeachment, embora seja essa a meta de muitos democratas.
Os opositores de Trump dentro do Partido Republicano têm pudores de apunhalar seu presidente pelas costas. Um processo nesse sentido poderia durar anos, com resultado incerto. A maioria da população dificilmente aceitaria tal coisa, tão logo após a última eleição. E assim a Washington política deverá se arrastar de uma audiência à próxima, até o recesso de meio do ano.
Moscou e Pequim lucram com essa situação caótica. Quanto mais fracos estejam os americanos, mais fortes os seus adversários. Onde os EUA falham no papel de potência líder, ambos procuram preencher o vácuo, geralmente com sucesso: a China expande sua influência na África, a Rússia ganha espaço no Oriente Médio.
Diante desse quadro, os amigos dos EUA – com a Alemanha à frente – torcem por um breve fim do imbróglio em Washington. Mas lá os moinhos da democracia moem meticulosamente. E lentos.