Quando cheguei ao Brasil com minha credencial de jornalista de economia, há exatos 30 anos, em novembro de 1992, o país era outro. O espírito de otimismo da jovem democracia havia se perdido há muito tempo no caos econômico.
Meu primeiro texto foi sobre o impeachment de Collor. Política e economicamente, o Brasil estava amplamente isolado do mundo. Com uma política monetária e financeira caótica. Com empresas dirigidas como negócios de família provincianos.
Após meses de idas e vindas, consegui uma entrevista com o diretor da Petrobras. Tive a impressão de caminhar por horas a fio por corredores escuros da futurista sede de concreto da empresa. Hordas de funcionários viam televisão ou conversavam com secretárias e servidores de café de fraque. O diretor não estava. Ninguém sabia dele. Mais tarde, meu suposto entrevistado viria a ser uma figura-chave nas investigações da Lava Jato.
A inflação era tão alta que, quando circulamos com centenas de milhares e milhões de cruzeiros, meu sogro alemão se lembrou do período da República de Weimar (1918-33). No centro de São Paulo, trocamos algumas notas de dólar por gordos maços de dinheiro e os escondemos em sacolas de compras. As transferências de uma conta para outro banco eram penalizadas com altas taxas.
Quase todos os bens de consumo duráveis eram caros e ruins. Paguei 3 mil dólares por uma linha telefônica – meus editores-chefes em Düsseldorf pensaram que eu estava passando a perna neles. Carros custavam uma fortuna.
Durante minhas primeiras entrevistas com bancos de investimento, fiquei surpreso por sempre conseguir falar pessoalmente com seus presidentes. Eles estavam entusiasmados por finalmente um jornalista estrangeiro especializado em economia se interessar novamente por títulos e ações brasileiras.
Estrela dos mercados emergentes
Então, o Plano Real mudou tudo abruptamente: o Brasil foi reconectado ao mundo. A inflação caiu, investidores chegaram, setores inteiros como telecomunicações e mineração foram privatizados. Isso também lançou as bases para empresas de sucesso como a fabricante de aeronaves Embraer.
Quando o Brasil finalmente se tornou a estrela dos mercados emergentes nos anos 2000, nada parecia atrapalhar sua ascensão a potência global. O Brasil, o quinto maior país do mundo, estava a ponto de se tornar também a quinta maior economia. Entre 2005 e 2008, dezenas de empresas entraram na Bolsa e passaram a valer bilhões de dólares de um dia para o outro. Companhias como Ambev, Vale, Itaú e Petrobras deram a volta ao mundo comprando empresas. Empresas brasileiras nunca haviam tido tamanha presença no cenário internacional.
Não apenas o Brasil se tornou um fornecedor de alimentos e matérias-primas para o mundo, como também milhões de brasileiros ascenderam à classe média. Eles podiam pagar por coisas com as quais nunca haviam sonhado: seguros, viagens internacionais, um curso universitário.
Centenas de delegações comerciais e políticas da Alemanha viajaram ao país e se maravilharam com o Pão de Açúcar. Mas isso não durou muito: entrevistei Eike Batista, Norberto Odebrecht e alguns outros empresários que pouco tempo depois estariam sentados sobre as ruínas de seus próprios impérios.
Década perdida
Os anos 2010, com o impeachment de Dilma, os governos Temer e Bolsonaro foram uma década perdida.
A economia brasileira se tornou mais moderna, sem dúvida. O Brasil também conseguiu expandir sua participação como fornecedor mundial de alimentos.
No entanto, quando ando hoje pelo centro de São Paulo, a sensação infelizmente é melancólica. Porque voltou a ser como era no final de 1992: assim como antes, no início da noite as ruas se enchem de moradores que ajeitam as caixas de papelão sobre as quais dormem. Muitos dos bares e restaurantes em torno da Bovespa estão fechados. Entre a Praça da República e a Sala São Paulo, usuários de crack dominam bairros inteiros. Com lixeiras em chamas e moradias ocupadas, as ruas lembram cenários de uma guerra civil.
Agora estou curioso para ver como será a próxima década.
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Há 30 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do jornal econômico Handelsblatt e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.