Ensino virtual
2 de julho de 2007Quem visita a escola profissionalizante Nell-Breuning, em Bad Honnef, perto de Bonn, pode dar razão ao estudo internacional de comparação do nível escolar (Pisa), segundo o qual quanto mais tempo uma criança passa em frente ao computador melhor seu desempenho na aula. O colégio dispõe de computadores com acesso à internet para pelo menos metade de seus alunos, e eles são intensivamente usados.
"Usamos a internet com muita freqüência para buscar informações e melhorar o conteúdo das aulas", diz Monika Kanert, uma das alunas. "Quanto mais se usa a web, tanto melhor se sabe lidar com ela. Isso certamente é uma vantagem para a futura vida profissional, onde o uso do computador é cada vez mais intenso", acrescenta.
Resultados positivos
Os resultados atingidos pelo colégio são animadores. Até agora, quem concluiu o segundo grau no Nell-Breuning Berufskolleg também obteve uma vaga para um estágio profissionalizante, que na Alemanha é uma espécie de ingresso para a profissão. Por isso, a maioria dos 146 alunos, embora muitos deles sejam portadores de deficiências físicas, encara o futuro com otimismo.
Em 2006, o colégio recebeu um prêmio pelo uso exemplar das novas mídias, algo inimaginável há dez anos. Naquela época, quando o Ministério da Educação e Pesquisa (BMBF) e a Deutsche Telekom lançaram o projeto Escolas na Rede (Schulen ans Netz – SaN), o colégio de Bad Honnef, como a maioria das escolas na Alemanha, era uma terra incógnita em termos de computação. Ele dispunha de apenas seis PCs e 12 máquinas de escrever.
Através do SaN, obteve novos computadores, acessos gratuitos à internet e apoio de técnicos. Hoje tem duas grandes salas de informática e em cada sala de aula há pelo menos um computador ligado à internet.
Além disso, antes das aulas e nas pausas, os alunos podem acessar a web em seis PCs instalados nos corredores ou conectar seus próprios notebooks à rede da escola. "Naturalmente somos uma exceção na Alemanha", admite o professor de informática Markus Niederastroth.
Educação online
De acordo com um relatório do BMBF, em 2006, um total de 30.304 escolas alemãs estavam equipadas com 1.075.393 computadores. No ensino primário, havia uma média de um computador para 12 alunos; no segundo grau, essa relação era de 1 por 11, e nos colégios profissionalizantes, de 1 por 9.
Com isso, a Alemanha supera a meta estabelecida pela Comissão Européia em seu plano de ação "eLearning", de um computador para 15 alunos.
Segundo o ministério, 71% dos computadores nas escolas alemãs estão conectados à internet. Nas escolas primárias, a web é usada com freqüência ou esporadicamente nas aulas de conhecimentos gerais (79%), de alemão (66%) e em atividades em grupo (54%).
No segundo grau, o uso é mais freqüente nas aulas de ciências naturais (81%), ciências sociais (79%) e nas aulas de informática (77%) e alemão (76%). Nos colégios profissionalizantes, a informática lidera o ranking das disciplinas em que a internet é mais usada.
Pesquisa na internet
"A internet é usada com muita freqüência para atividades de pesquisa", diz Niederastroth. Isso é confirmado também por seus colegas em outras escolas. O professor Manfred Roppel aplica assim chamados webquests nas aulas de alemão na 6ª série do ginárso Gabrieli, em Eichstätt, na Baviera.
"Os alunos ganham uma tarefa fixa e fazem uma pesquisa objetiva sobre determinado tema na web. Mas também é usada a busca livre através do Google ou de outras máquinas de busca, como www.blindekuh.de", explica.
"Blinde Kuh" (vaca-cega, o nome alemão da brincadeira cabra-cega) é uma máquina de busca para crianças, fomentada desde 2004 pelo Ministério da Educação e Pesquisa. Ela oferece uma seleção de links sobre temas como meio ambiente e tecnologia, animais e plantas, e dá dicas para aprender a pesquisar, escrever, fazer contas, cozinhar, pintar e até brincar.
É o site preferido de Gloria Grimm, que freqüenta a 5ª série do ginásio Alexander von Humboldt, em Lauterbach, no estado de Hessen. "Ali eu encontro muitas coisas úteis para as aulas", conta.
No caso de Gloria, raras vezes o professor dá tarefas a serem resolvidas com a ajuda da internet, conta a mãe, Regina Grimm. Isso é bem diferente com as duas filhas maiores – Anna, na 9ª série, e Henrieke, na 11ª . "Elas tiram muito da internet para suas tarefas escolares. Não sei se o aprendizado na forma convencional não seria melhor", diz Regina, que freqüentou a escola antes do triunfo da web.
Desvio da atenção
Hoje é grande o perigo de que os alunos desviem a atenção e percam tempo na internet, adverte Henning Jöhncke, professor de política e língua alemã na escola integrada Wernher von Braun, em Neuhof, próximo de Fulda (Hessen). Por isso, é importante dar uma tarefa bem precisa, acrescenta.
"Quando os alunos sabem exatamente o que têm de fazer, há vários aspectos positivos no uso da internet na aula", diz. "Mas os professores precisam ficar sempre de olho, para que os alunos não façam besteiras assim que concluem as tarefas. Há alunos que matam o tempo brincando ou acessando páginas proibidas."
Coisas proibidas eles podem fazer também ao acessar páginas absolutamente legais, como a Wikipedia. A enciclopédia online é considerada a principal fonte de pesquisa nas escolas. "Muitas vezes, os alunos copiam textos inteiros. Lamentavelmente, o plágio é um grande problema no momento", diz Jöhncke.
Também os professores usam modelos de aulas baixados de sites especializados. "Eu gosto muito da sala de aula virtual do portal 'lo.net', conta Markus Niederastroth. "Lo.net" é um ambiente virtual em que cerca de meio milhão de alunos e professores de aproximadamente 4 mil escolas alemãs se comunicam e trabalham juntos", explica Dirk Frank, da iniciativa Escolas na Rede, que desenvolveu o projeto.
Continue lendo: Universidades apostam em campus digital
Estudantes cibernéticos
O correspondente à "sala de aula virtual" nas escolas chama-se "campus digital" nas universidades. Uma vista panorâmica dos cursos virtuais oferecidos por instituições de ensino superior na Alemanha encontra-se no site studieren-im-netz.de. "A gama de cerca de 1.500 ofertas vai desde seminários virtuais, passando por palestras via internet, sistemas de ensino e aprendizagem baseados na rede até cursos completos à distância e online", explica o provedor do portal.
Um papel de vanguarda no setor de e-learning é exercido pela Universidade de Ciências Aplicadas da Renânia do Norte-Westfália (RWTH), em Aachen. Em cooperação com a Microsoft, ela implementa um dos três projetos-piloto para a modernização do ensino superior na Alemanha.
O portal L2P promete "salas virtuais para 30 mil estudantes". Depois da introdução, as experiências com o sistema serão repassadas às outras instituições de ensino superior do país, informa a RWTH.
Já a Fernuniversität (universidade à distância) de Hagen é considerada pioneira do "campus digital". "Toda uma escola superior entra na rede", anuncia a instituição, que começou em 1995 suas atividades na internet. "Já éramos virtuais antes mesmo de surgir essa expressão. Para nós, a internet foi uma grande bênção, porque, através dela, as condições de estudo para nossos estudantes melhoraram muito", diz Birgit Feldmann, assessora científica do departamento de Informática.
A Fernuni Hagen – maior universidade à distância dos países de língua alemã – promete aos seus 43 mil alunos "uma verdadeira alternativa ao estudo com presença em sala de aula". Segundo Feldmann, apesar disso, "é bom, de vez em quando, ver os estudantes in loco para ter um contato pessoal. Nossos estudantes também pedem fases de presença, e nós tentamos oferecer uma boa mistura entre cursos virtuais e reais".
A mesma experiência é feita pelas cerca de mil Volkshochschulen (VHS), que oferecem cursos de formação e aperfeiçoamento para jovens e adultos e recebem entre 6 milhões e 8 milhões de inscrições por ano na Alemanha. Segundo Bernd Passens, diretor da associação alemã de VHS, o ensino informal é impensável sem a internet, mas nem todos os cursos online viram automaticamente um sucesso.
"Para alguns grupos, é bom poder estudar anonimamente num ambiente virtual. Prova disso é o sucesso que tem nosso portal de alfabetização para adultos, cujos usuários não gostariam de se revelar numa sala de aula. Outros, porém, preferem os cursos com presença física", diz Passens.
Só a tecnologia não basta
Ainda que a internet, desde seus primórdios, venha sendo intensamente usada pela comunidade acadêmica, as aulas clássicas com quadro e giz até hoje não foram substituídas por novas formas de transmissão virtual do saber ou por programas de aprendizagem via computador.
Um estudo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que considerou também dados de 2004 e 2005 do ensino superior na Alemanha, concluiu que os cursos online são apenas complementares às aulas nos campi.
"O papel dos cursos online é marginal e o uso de tecnologias da informação surte efeito sobretudo na administração das instituições de ensino superior", diz o estudo.
Também há pesquisas que relativizam o papel da internet nas escolas. Uma avaliação feita em 2006 pelo Escolas na Rede nos estados da Renânia-Palatinado, Schleswig-Holstein, Hessen e Saxônia chegou à seguinte conclusão: "Embora 96,2% dos 1.106 professores entrevistados confirmassem que dispõem de internet em suas escolas, apenas 25,7% disseram que a utilizam freqüentemente em aula." As principais causas do pouco uso não são problemas técnicos e sim os "déficits pessoais dos professores", apontou o estudo.
Segundo Dirk Frank, isso mostra que não basta criar uma infra-estrutura nas escolas. "É preciso garantir que os professores tenham idéias pedagógicas para lidar com a tecnologia". Por isso, desde 2001, depois de conectar todas as escolas alemãs à internet, o Escolas na Rede concentra-se na oferta de material pedagógico e de cursos de aperfeiçoamento para professores.
Frank vê na Alemanha um "problema de geração" (a idade avançada de parte dos professores), mas também uma deficiência na formação acadêmica em relação ao uso dos novos meios de comunicação.
"Aprender a lidar com a internet não é prioridade. Depende do formador se ele considera essa competência importante", confirma Anne Völlinger, que dá cursos de formação de professores do ensino básico e médio em Hessen.
Web 0.0 nas escolas?
Atualmente, notícias de que nos EUA já se pensa em retirar os computadores e a internet das salas de aulas causam polêmica nas escolas alemãs. Embora muitos não consigam mais imaginar o ensino sem internet, "projetos que vêem o computador como panacéia para a aula devem ser questionados", afirma Ludger Vößmann, professor de Economia da Educação na Universidade de Munique.
"De forma alguma se deve esperar dos investimentos em computação uma grande melhoria do sistema de ensino. Para isso, são necessárias outras reformas", adverte.
Muitos professores também duvidam das vantagens do uso do computador e da internet nas aulas. "A única coisa que isso traz é transmitir a competência de lidar com a mídia, é ensinar aos alunos a controlar e a contextualizar as informações", diz Manfred Roppelt. "E para isso não é necessário ter computadores em todas as salas de aula. Um beamer conectado a um servidor central seria o ideal."
Também para Markus Niederastroth equipar as escolas com PCs e melhorar a formação dos professores ainda não são garantias de sucesso. "O uso da internet só faz sentido se os alunos realmente querem aprender e atingir um objetivo. Caso contrário, eles passam o tempo no chatroom ou fazendo outras coisas", diz.
Segundo ele, para os alunos do colégio Nell-Breuning, no entanto, além da vantagem pedagógica, a internet ainda traz um benefício social. "Assim eles podem se aproximar de um mundo ao qual, de outro modo, não teriam acesso devido às suas deficiências físicas."