O general e o jurista que comandam o Egito
5 de julho de 2013"Juro, em nome de Deus, cumprir a lei e a Constituição e governar com justiça." Menos de 24 horas após a queda do presidente Mohammed Morsi, Adli Mansur fazia seu juramento, assumindo como presidente interino do Egito.
O chefe das Forças Armadas, Abdel Fattah al-Sisi, anunciou a destituição de Morsi na noite desta quarta-feira (03/07), em pronunciamento transmitido pela televisão.
Após dias de protestos contra Morsi, o general havia dado um ultimato de 48 horas ao primeiro presidente eleito do Egito, para que atendesse às demandas da população. Até a realização de novas eleições, Mansur deve governar o país, juntamente com um conselho de transição, formado por tecnocratas.
Candidato de consenso
"No cenário político do Egito, Mansur é uma personalidade completamente desconhecida", observa o cientista político Christian Achrainer, da Sociedade Alemã de Política Externa (DGAP, na sigla original).
O jurista de 67 anos, membro do Supremo Tribunal Constitucional desde 1992, ocupava o cargo de presidente do órgão havia apenas dois dias. Morsi o promovera do cargo de vice-presidente para suceder Maher al-Behairi, que havia se aposentado no final de junho.
Devido a uma lei que passou a vigorar após a queda do ditador Hosni Mubarak, o presidente não pode mais ocupar o posto mais alto do Supremo Tribunal Constitucional com um candidato externo, sendo obrigado a escolher um dos três vice-presidentes mais antigos do órgão.
Durante as disputas entre o governo Morsi e o judiciário egípcio, Mansur sempre teve uma posição discreta, diz Achrainer. Entre outras coisas, Morsi revogou emendas constitucionais e negou ao Supremo Tribunal Constitucional a competência para se pronunciar sobre a legalidade da Assembleia Constituinte, dominada por islamitas. Já o Supremo Tribunal Constitucional retirou, em junho, a legitimidade da câmara alta do Parlamento, dominada pela Irmandade Muçulmana.
Mas Mansur esteve muito envolvido nas principais decisões da era pós-Mubarak, ressalta Achrainer. "Antes da última eleição presidencial, ele foi uma das pessoas que lutaram para garantir que representantes do antigo regime fossem autorizados a participar nas eleições." Esse foi um motivo de críticas, assim como a sua longa carreira jurídica durante o governo do presidente Mubarak.
Jovem general
Mas o poder no país não está nas mãos do presidente interino, e sim do Exército – tal como após o golpe de Estado de 1952 e após a queda de Mubarak, em 2011. "Sem os militares, Mansur não teria se tornado presidente", destaca Ronald Meinardus, diretor do escritório no Cairo da Fundação Friedrich Naumann.
E à frente do Exército está Abdel Fattah al-Sisi. Em agosto de 2012, após a queda do ministro da Defesa, Mohammed Hussein Tantawi, Morsi nomeou al-Sisi para o cargo. O general é tido como um muçulmano devoto. "Ao mesmo tempo, ele foi socializado na tradição do nasserismo", sublinha Meinardus. "O Exército egípcio vem dessa tradição. O corpo de oficiais é de tendência laica." O ex-presidente Gamal Abdel Nasser era considerado um opositor ferrenho da Irmandade Muçulmana.
Com 58 anos, al-Sisi é um dos generais mais jovens do país. Ele não lutou nas guerras contra Israel em 1967 e 1973. Após a queda de Mubarak, em fevereiro de 2011, tornou-se o membro mais jovem do Supremo Conselho Militar e chefe da inteligência militar.
Após a renúncia de Mubarak, al-Sisi foi criticado por ter justificado publicamente, em 2011, agressões sexuais de soldados a mulheres egípcias, os chamados "testes de virgindade". Após indignação internacional, al-Sisi reviu sua posição e anunciou que tais "exames" não ocorreriam mais.
"A ditadura militar após a remoção de Mubarak foi um período não muito feliz na história do Egito", reconhece Meinardus, referindo-se aos 17 meses em que Tantawi dirigiu o Supremo Conselho Militar como a mais alta autoridade no Egito e concedeu aos militares amplos poderes políticos.
Nova Constituição e antigos interesses
Com a nomeação de Mansur como presidente interino, os militares não estão na linha de frente do governo. Al-Sisi ressaltou à imprensa que os militares "vão ficar longe da política".
A Constituição de forte influência islâmica, aprovada na gestão Morsi, foi revogada. Um grêmio deve preparar uma nova Constituição para o país, que deverá ser aprovada por referendo.
"Mas, por trás dos acontecimentos, ainda estão os interesses dos militares", alerta Achrainer. "O império econômico dos militares não deve ser posto em perigo, e a liderança do país não deve se intrometer nos assuntos das Forças Armadas", resume. No governo Morsi, os militares sentiram seus interesses ameaçados e decidiram intervir.