O culto à personalidade de Theresa May
28 de maio de 2017A propaganda política do Partido Conservador que tem sido exibida na televisão britânica quase não menciona a legenda. No vídeo, a primeira-ministra Theresa May faz um discurso, embalado por música inspiradora. Ao fim da transmissão, faz-se a pergunta em letras garrafais: "Quem você quer que negocie o futuro do Reino Unido e o de sua família: Theresa May ou Jeremy Corbyn?". Surge, então, o símbolo do partido, mas bem pequeno, na parte inferior da tela.
Isso reflete uma estratégia mais ampla do Partido Conservador diante das eleições gerais antecipadas de 8 de junho: nos numerosos eventos de campanha, cartazes proclamam "a equipe de Theresa May", enquanto a insígnia dos conservadores aparece quase imperceptível. Políticos que disputam cargos mais baixos se referem a si mesmos como "o candidato local de Theresa May".
A motivação para essa estratégia fica muito clara nas pesquisas de opinião: elas apontam que, enquanto o Partido Conservador conta com o apoio de 40% dos eleitores, 61% dos britânicos acreditam que May é a melhor escolha para o cargo de premiê. Apenas 23% declararam voto a seu principal adversário, o trabalhista Jeremy Corbyn. Dessa forma, o índice de popularidade de May se mostra superior aos de líderes como Margaret Thatcher (48%) e Tony Blair (52%) em seus pontos mais altos.
"Enquanto os remanescentes sensatos do Partido Trabalhista buscam ocultar o nocivo Corbyn em sua campanha, os conservadores fazem esforços surpreendentes para ocultar o próprio partido por trás de sua líder", observa Sophie Gaston, chefe de projetos internacionais da think thank Demos.
"A estratégia se baseia num raciocínio inteligente: as pesquisas mostram que May vence Corbyn em todos os grupos eleitorais, enquanto o Partido Conservador em si permanecerá perenemente nocivo para algumas porções do eleitorado."
Críticas a "liderança forte e estável"
Apesar da popularidade entre os eleitores, May foi alvo de piadas e críticas da imprensa nas últimas semanas por usar repetidas vezes o termo "liderança forte e estável". O fato aponta para uma das fraquezas da primeira-ministra, que já foi muitas vezes tachada de robótica e desajeitada, tendo se recusado a participar de debates televisivos com outros líderes partidários antes das eleições.
"Ela é considerada possivelmente sem senso de humor, um tanto severa, talvez inflexível, mas atualmente isso está sendo apresentado como força e estabilidade", diz Matthew Cole, professor de história da Universidade de Birmingham. "No momento, essas fraquezas não são vistas como terrivelmente importantes, e não tão significativas quanto ser incapaz de liderar o próprio partido ou ser irrealista na política e inexperiente – as fraquezas percebidas em Corbyn."
Fora das esferas política e midiática, a confiança de May em frases de efeito não parece ser prejudicial. "A mensagem é cansativa para nós em Westminster, mas conforme mostrou a campanha a favor do Brexit no referendo do ano passado, bem como a eleição de Donald Trump, uma mensagem simples pode ganhar uma notoriedade poderosa quando os eleitores vão às urnas", analisa Gaston.
A imagem tradicionalista de May também pode lhe ser útil. "Ela encarna valores e atitudes bem-vistos por grande parte do país. É tradicional, socialmente conservadora, apresenta um ceticismo em relação à União Europeia e à imigração, e tem uma visão provinciana, especialmente em comparação com [o ex-primeiro-ministro David] Cameron e [o ex-ministro das Finanças George] Osborne", diz Oliver Patel, pesquisador do Instituto Europeu da Universidade de Londres.
Brexit quer dizer Brexit
O manifesto dos conservadores promete reduzir a imigração e fazer mudanças drásticas em áreas como assistência social. Mas, até o presente, a campanha tem sido sensivelmente parca em detalhes de políticas. "May afirma ser a detentora do mandato do referendo, e isso a torna diferente de qualquer outro primeiro-ministro que tenha disputado uma eleição", aponta o professor Matthew Cole.
Embora tenha sido apertado o resultado do referendo sobre a saída do Reino Unido da União Europeia, pesquisas de opinião indicam que uma proporção significativa dos que votaram contra o Brexit agora querem que o resultado seja implementado. Isso significa que a estratégia dos liberal-democratas, de uma linha anti-Brexit, provavelmente não será bem-sucedida.
"A maioria só quer que ela siga em frente", afirma Patel. "A estratégia dos conservadores não é focar nos dois partidos, mas sim nos dois líderes. Nem mesmo na política, mas em quem se quer ver ocupando o número 10 [da Downing Street, residência oficial e escritório do primeiro-ministro britânico], quem se quer que negocie o Brexit."
Naturalmente há riscos em encorajar os eleitores a tomar uma decisão com base sobretudo na personalidade de um líder, especialmente se essa imagem se tornar nociva, como foi o caso de Thatcher e Blair. Mas dada a fraqueza da oposição e a dimensão da liderança do Partido Conservador, a estratégia parece ser eficaz, pelo menos para as próximas eleições.
"É quase impossível imaginar um cenário em que os conservadores não vençam estas eleições. A questão é simplesmente quanto tempo vai durar o mandato da primeira-ministra e se os danos ao Partido Trabalhista serão irreversíveis", explica Sophie Gaston.