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O Brasil e a hegemonia na América Latina

Christiane Wolters (sm)15 de junho de 2005

O governo Lula aposta numa política externa mais dinâmica e influente. Estudiosos alemães comentam o novo papel do Brasil dentro da América Latina e no mundo.

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Política externa sem fronteiras: Lula e o presidente palestino Mahmoud Abbas, em BrasíliaFoto: AP

Os analistas políticos alemães falam até em "potência hegemônica" quando se referem à ambiciosa política externa do governo brasileiro. Para Günther Maihold, especialista em América Latina da Fundação Ciência e Política, as grandes novidades em Brasília são uma política de vizinhança ativa, a tentativa de assumir um papel de liderança no hemisfério sul e a interferência em âmbito global, sobretudo através da reivindicação de obter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU.

Porta-voz de interesses regionais, mas não só

"O Brasil está se empenhando ativamente em estabilizar os países vizinhos e apaziguar conflitos, sem esperar que esta iniciativa parta de terceiros", constatou Maihold, em entrevista à DW-WORLD. Isso se confirmou em relação à Bolívia, ao Equador, ao Peru e também no auge da crise do governo Chavez, na Venezuela.

Para Maihold, o papel de porta-voz e de liderança também depende da predisposição de Brasília em assumir custos da integração regional, seja recrutando tropas de paz para o Haiti ou bancando uma infra-estrutura de cooperação regional, seja fazendo concessões à Argentina dentro do Mercosul. Maihold considera importantes estes novos elementos, sobretudo diante da resistência de alguns países ao papel de destaque do Brasil, como o Chile e a Colômbia.

"Jogar numa divisão mais alta que deveria"

Andreas Boeckh, especialista em América Latina da Universidade de Tübingen, considera improvável que o Brasil conquiste uma liderança natural dentro da América do Sul. "Os argentinos não estão muito entusiasmados com isso, além de terem grandes problemas com o Brasil no Mercosul. Os mexicanos também não consideram o Brasil o líder natural na América Latina. Há uma grande tensão em tudo isso", declarou Boeckh à DW-WORLD, acrescentando que "o Brasil sempre teve o problema de querer jogar numa divisão mais alta do que de fato deveria".

Boeckh é cético sobretudo em relação à situação de concorrência com os EUA, que ele considera insustentável a médio prazo. A avaliação de Maihold é bem diferente neste ponto: "Acredito que uma receita de sucesso do Lula foi jamais ter entrado em confronto com os EUA na política externa. Para os americanos, enquanto o Brasil cumprir um papel apaziguador dentro da América do Sul, eles se consideram dispensados de agir para além de seus interesses imediatos".

Passo maior que a perna

Os estudiosos alemães também divergem quanto à legitimidade de uma política externa hegemônica por parte de Brasília. Boeckh consideraria mais sensato "se o Brasil se concentrasse na própria região e, em caso de querer assumir o papel de uma potência hegemônica, se dispusesse a fazer concessões à Argentina de quando em quando".

Maihold também teme que o Brasil acabe indo além de sua capacidade de influência, se continuar expandindo seu campo de atuação na política externa. Além de ter aprofundado as relações com a África, sobretudo com os países de expressão portuguesa, o Brasil iniciou um diálogo com as nações árabes e com novas potências do Sul, como a África do Sul e a Índia, inclusive a fim de conquistar o espaço que pretende assumir dentro do Conselho de Segurança da ONU.

Para Maihold, "a questão decisiva é até que ponto o Brasil estará em condições de coordenar a diversidades de todos esses campos de atuação e também até quando Lula manterá seu prestígio político interno, a fim de poder bancar uma política externa de impacto".