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"Não" da Áustria ameaça acordo Mercosul-UE

Andreas Rostek-Buetti fc
19 de setembro de 2019

Parlamento austríaco veta tratado de livre-comércio entre blocos europeu e sul-americano, entravando sua aprovação final. Para críticos, faltam sanções claras se floresta e clima não forem efetivamente protegidos.

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Fumaça sai de queimadas na floresta em Altamira, no Pará
Fumaça sai de queimadas na floresta em Altamira, no ParáFoto: Getty Images/AFP/J. Laet

A União Europeia negociou com os quatro países do Mercosul por 20 anos para finalizar um acordo bilateral de livre-comércio. E aí veio o presidente Jair Bolsonaro, que não é conhecido exatamente como um defensor do meio ambiente. Sob seu governo, a floresta amazônica está queimando a um ritmo sem precedentes. Agora membros de quase todos os partidos do Parlamento da Áustria tiraram suas conclusões deste fato.

Quatro das cinco legendas votaram contra o acordo entre os blocos europeu e sul-americano numa votação no Parlamento da Áustria, em Viena, nesta quarta-feira (18/09). A ex-ministra austríaca da Agricultura, Elisabeth Köstinger, declarou após a votação que há "um mandato claro para os ministros responsáveis" para rejeitar o acordo em nível europeu.

O chefe da bancada do Partido Social-Democrata (SPÖ) no Parlamento, Jörg Leichtfried, descreveu a votação numa nota como "um grande sucesso para a proteção dos consumidores, do meio ambiente e dos animais, bem como dos direitos humanos".

De fato, o acordo de livre-comércio entre o Mercosul e a UE só pode entrar em vigor se todos os países envolvidos concordarem, ou seja: todos os parlamentos nacionais dos Estados-membros devem aprová-lo. É igualmente necessária a aprovação do Parlamento Europeu e, ainda, uma ratificação unânime pelos chefes de Estado e de Governo da União Europeia.

As negociações sobre o tratado comercial estão em curso desde 2000. Atualmente transcorre sua revisão jurídica, e no terceiro trimestre de 2020 o acordo poderá estar pronto para ser assinado, prevê a UE. O Mercosul – que inclui Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai – tem uma população de mais de 260 milhões de habitantes e é um dos principais blocos econômicos do mundo, enquanto a União Europeia totaliza mais de 512 milhões de habitantes.

Não é de admirar que os líderes europeus se esforcem tanto para defender o tratado. "O acordo é muito importante para a Europa, tanto do ponto de vista econômico como geoestratégico", declarou Sabine Weyand, diretora-geral de Comércio da Comissão Europeia, ao jornal Handelsblatt.

O acordo visa reduzir gradualmente ou eliminar tarifas e impostos entre os dois blocos econômicos, mas, ao mesmo tempo, harmonizar normas – incluindo disposições como as do Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, que se tornariam obrigatórias para os países sul-americanos.

Ao mesmo tempo, porém, a floresta tropical está ardendo apesar de todas as garantias, especialmente no Brasil. O presidente da França, Emmanuel Macron, já ameaçara opor-se ao acordo comercial, e ouviram-se ameaças semelhantes por parte da Irlanda e Luxemburgo. Os deputados do Parlamento em Viena transformam as palavras em ação.

A eurodeputada austríaca Monika Vana, do Partido Verde, convidou um representante indígena brasileiro para falar em Bruxelas. Mapu Huni Kuin, da etnia Huni Kuin, pediu que a UE sustasse o pacto. "Por favor, não assinem o acordo com o Mercosul", pediu o indígena perante o Parlamento Europeu. Se o acordo for assinado, mais terras na floresta tropical serão desmatadas para a produção agrícola, afirmou.

Para a Europa, o acordo de livre-comércio significaria, acima de tudo, a abolição de taxas alfandegárias elevadas sobre seus produtos industrializados exportados para a América do Sul. Em contrapartida, os produtos agrícolas provenientes dos quatro países sul-americanos teriam acesso mais fácil ao mercado europeu.

Ainda hoje, segundo a organização ambiental alemã WWF Deutschland, a produção de forragem para suínos, bovinos e aves na Alemanha exige uma enorme quantidade de terras. "Uma das causas dos incêndios devastadores na Amazônia pode ser encontrada nos comedouros alemães: a soja", acusa Eberhard Brandes, diretor do WWF, e grande parte deste produto vem da América do Sul.

A Comissão Europeia rebate que o acordo contém regulamentos vinculativos para a proteção da floresta tropical. De acordo com o resumo conhecido até agora, um artigo especial obriga ambas as partes a "implementar efetivamente" o Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas.

Além disso, o tratado contém compromissos em matéria de luta contra o desmatamento. Sobre essa questão, o resumo menciona iniciativas do setor privado que "fortalecem esses compromissos", como, por exemplo, de não comprar carne de fazendas "em áreas recentemente desmatadas". Os críticos, contudo, consideram tais disposições demasiado vagas.

Também falta a previsão de sanções, caso a floresta tropical e o clima não forem efetivamente protegidos, como foi recentemente confirmado pelo governo alemão em resposta a uma pergunta parlamentar. No entanto, há um "mecanismo de aplicação gradual e orientado para o diálogo", consta da resposta.

Enquanto isso a ministra do Meio Ambiente da Alemanha, Svenja Schulze, propôs a certificação da carne brasileira: "A soja e a carne bovina só podem ser importadas se for possível provar que a produção não prejudica a floresta tropical", disse à revista Spiegel.

Atualmente os países do Mercosul não são realmente importantes para a Alemanha, do ponto de vista econômico: apenas 2,6% dos investimentos alemães no mundo são direcionados às quatro nações, e nem mesmo 3% das mercadorias alemãs são vendidas na região.

No entanto, Andreas Renschler, presidente do Conselho da Indústria Alemã para a América Latina (LADW), lembra que só no Brasil estão presentes 1.600 empresas alemãs: "A preservação da floresta tropical faz parte dos nossos esforços para proteger o clima global", conclui.

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