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No Uruguai, oposição pressiona coalizão de Mujica

Pablo Kummetz (rc)25 de outubro de 2014

Até meses atrás, a continuidade da Frente Ampla no poder parecia certa. Mas pesquisas indicam que a disputa pode ser apertada para o candidato governista, Tabaré Vázques.

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Tabaré Vázques (c) foi presidente até 2010, quando foi sucedido por José MujicaFoto: picture-alliance/dpa

Há dez anos que a Frente Ampla, coalizão de mais de dez partidos de tendência esquerdista, governa o Uruguai. Apesar de sua figura central, o cultuado presidente José Mujica, não poder se candidatar à reeleição, até pouco tempo atrás a continuidade do bloco no poder após as eleições deste ano era dada como certa.

Entretanto, nos últimos meses os ventos sopraram para a oposição, principalmente para o candidato de centro-direita Luis Alberto Lacalle Pou, de 41 anos. As últimas pesquisas antes do primeiro turno, neste domingo (26/10), indicam que ele está cerca de 10 pontos percentuais atrás de Tabaré Vázques, antecessor e candidato à sucessão de Mujica.

Vázques tem entre 43% e 46%, segundo as pesquisas, e Lacalle Pou, entre 31% e 33%. Mas a oposição alcança ou até mesmo supera o candidato governista se forem considerados os percentuais do terceiro colocado, Pedro Bordaberry, do Partido Colorado, que teria em torno de 15% dos votos. A atual situação indica um segundo turno disputado e de resultado imprevisível.

Sucesso econômico

Especialmente no segundo mandato, o de Mujica, a Frente Ampla ganhou reconhecimento nacional e internacional por suas políticas moderadas de esquerda. Em 2013, a revista britânica The Economist elegeu Mujica "presidente do ano"– o que pode ser justificado pelo impressionante desempenho econômico do Uruguai.

Nos últimos quatro anos, o PIB do país cresceu em média 5,5% ao ano; o índice de pobreza caiu de 34%, em 2006, para 11,5%, em 2013. O desemprego alcançou a baixa histórica de 6%. Em meados de 2012, as agências de avaliação de risco elevaram o país à categoria de "investment grade", ou seja, bom para investimentos. De fato, os investimentos internacionais diretos aumentaram, assim como a demanda por títulos uruguaios.

A razão para o sucesso não é inteiramente nova. Trata-se de um governo de esquerda que adota políticas econômicas orientadas para o mercado. O curso escolhido pelo Ministério da Economia do Uruguai não inclui experimentações populistas, como as que ocorrem do outro do lado do Rio da Prata, na Argentina.

Tabare Vazquez Ex-Präsident von Uruguay
Vázquez lidera pesquisas, mas enfrentará segundo turno apertadoFoto: picture-alliance/landov

Em vez de abusar das máquinas de imprimir dinheiro, como faz o governo argentino, o Uruguai financia políticas de redistribuição dos aumentos moderados nos impostos. Essa é a base que compõe uma próspera economia de mercado, com produções ramificadas em 12 áreas econômicas e várias indústrias fortes, como de software, madeira, turismo e, principalmente, logística.

De acordo com pesquisas, apenas 6% dos 3,4 milhões de uruguaios não estão satisfeitos com a própria situação econômica, enquanto 45% da população descrevem sua situação como boa ou muito boa. Os demais ao menos não perceberam nenhuma piora. Dois terços dos uruguaios esperam que a própria renda aumente no ano que vem.

Além disso, as políticas sociais liberais associaram ao Uruguai e ao presidente Mujica uma imagem progressista, reconhecida internacionalmente. A legalização da maconha e do casamento gay, o asilo a refugiados da Síria e a promessa de recepção de prisioneiros de Guantánamo são vistos dos dois lados do Atlântico como medidas precursoras, não apenas para os países latino-americanos.

Mas são precisamente essas medidas que, na opinião de alguns, levaram longe demais a orientação esquerdista e liberal do governo. A liberalização do aborto é uma questão controversa até mesmo dentro da coalizão governista.

Alguns setores da sociedade entendem que muito pouco foi alcançado, enquanto outros reclamam das pressões tributárias, mesmo que a renda tenha aumentado. Além disso, a proximidade com governos populistas – ainda que mais em termos táticos do que de convicção – desagrada a muitos eleitores.

Anseio por renovação

Pesa também o fato de que a Frente Ampla não conseguiu se renovar. Nas eleições deste ano aparecem os mesmos políticos de dez anos atrás. Vázquez tem 74 anos de idade, e Mujica, 79.

Lacalle Pou, candidato da oposição, explora claramente essa insatisfação. Ao invés de atacar a Frente Ampla, ele elogia suas conquistas e promete aprofundá-las. Suas críticas são voltadas para aspectos como educação e segurança pública, que ainda deixam a desejar.

Ele também prega um distanciamento cauteloso do Mercosul, uma vez que o acordo de livre-comércio com Argentina, Brasil, Paraguai e Venezuela acaba sendo mais um entrave do que um incentivo aos investimentos estrangeiros.

Luis Lacalle Pou Präsidentschaftskandidat Uruguay
Lacalle Pou elogia conquistas da Frente Ampla e promete aprofundá-lasFoto: picture-alliance/dpa/landov

Assim como o candidato de oposição no Brasil, Aécio Neves, Lacalle Pou almeja que seu país se alinhe a outros parceiros, como os Estados Unidos, a União Europeia e a Aliança do Pacífico – acordo de livre-comércio de sucesso, que inclui países do México ao Chile.

Lacalle Pou agrada grande parte da população. Muitos uruguaios desejam uma renovação do sistema político e não acreditam que a Frente Ampla seja capaz disso. Por muito tempo, a coalizão governista foi a antítese dos partidos conservadores Blanco e Colorado, que governaram o país por quase cem anos, até 2005. Boa parte da população deseja agora novas perspectivas.

É possível que a Frente Ampla conquiste o apoio dos últimos eleitores indecisos, mas caso não consiga se eleger no primeiro turno, Lacalle Pou poderá ganhar a eleição pelo Partido Blanco, com a ajuda do Colorado no segundo turno, em 30 de novembro. Como mostram pesquisas recentes, as chances de a oposição chegar à Presidência são reais.