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Na Coreia, um reencontro tão político quanto comovente

Martin Fritz, de Tóquio (msb)21 de fevereiro de 2014

Reunião de parentes separados durante décadas pela divisão da península emocionou o mundo, mas, por trás dos panos, esconde manobra de Pyongyang, que tenta capitalizar gesto politica e economicamente.

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Foto: picture-alliance/dpa

Difícil controlar a emoção em um reencontro que levou décadas para acontecer. Sorrisos se misturaram às lágrimas nos rostos dos 82 sul-coreanos e seus 180 parentes que vivem na Coreia do Norte ao se abraçarem na quinta-feira (20/02), por alguma horas, na região norte-coreana de Kumgang.

A cena é consequência de uma guerra cruel, que há 60 anos levou à divisão da Península Coreana. Os dois lados lutaram de forma brutal – o norte com táticas de guerrilha e o apoio chinês; o sul, sob a liderança dos americanos, com bombardeios aéreos e uso de napalm. Milhões de coreanos morreram, dezenas de famílias foram destruídas pela guerra e pelo caos.

Antes mesmo do início da guerra, em 1948 – mas já depois da divisão política da península – 1,2 milhão de norte-coreanos fugiram para o sul. O armistício de 1953, porém, não aplacou o sofrimento das famílias: a divisão no paralelo 38 persiste até hoje. Entre o Norte e o Sul não existem trocas de cartas ou conexões telefônicas. A possibilidade de viagem é quase nenhuma.

Nem mesmo pela mídia é possível obter informações: padrões incompatíveis de TV impedem que moradores de um lado assistam ao que passa do outro. O Norte proíbe estações de rádio do Sul. Os dois Estados aplicam punições a contatos entre seus cidadãos sem uma permissão oficial.

Parte da história

Os poucos encontros familiares são reflexo da dura divisão política. A primeira vez em que parentes separados pela muralha político-ideológica se viram foi em 1985, e reuniu 151 coreanos. A Cruz Vermelha se esforçara durante 14 anos para que o encontro acontecesse.

Foi um breve derretimento do gelo entre os dois lados. Os sul-coreanos escolhidos foram recebidos em Pyongyang por seus parentes ao som de hinos de louvor ao então presidente Kim Il-sung.

Depois disso, porém, a Guerra Fria continuou. Somente após a histórica cúpula entre os líderes políticos Kim Dae-Jung (Coreia do Sul) e Kim Jong-il (Coreia do Norte), 15 anos depois, um novo reencontro foi acertado em um salão de congressos em Seul. O regime do Norte ainda aproveitou para provocar o sul ao nomear como chefe de sua delegação uma famosa desertora do Sul, Ryu Mi-young.

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Maioria dos coreanos que participaram do reencontro tem mais de 80 anos de idadeFoto: picture-alliance/dpa

Desde essa aproximação, em 2000, 22 mil coreanos de 4 mil diferentes famílias puderam se ver novamente, por encontros organizados pela Cruz Vermelha. A maioria deles se viu pessoalmente. Outros poucos, apenas por vídeo-conferência. O último encontro havia ocorrido em 2010, quando o Sul definiu seus escolhidos por meio de um sorteio por computador, que teve 72 mil inscrições.

Mas o número de contemplados tem sido cada vez menor. Cerca de 57 mil sul-coreanos que queriam ver seus parentes no Norte morreram sem ter seu desejo atendido. Mais da metade dos coreanos que nesta quinta-feira se abraçaram e se beijaram em Kumgang tem mais de 80 anos de idade.

Instrumento político

O trágico do encontro é saber que os participantes acabam servindo de marionete política. A Coreia do Sul sabe que sua vizinha do Norte será recompensada com ajudas financeiras e concessões políticas simplesmente por tê-lo consentido. Por sua vez, a Coreia do Norte só parece interessada nas concessões se elas trouxerem ganhos políticos e econômicos para seu líder.

Por isso, Pyongyang disse não a um encontro que havia sido marcado inicialmente no segundo semestre do ano passado, o primeiro após três anos. Seul foi acusada de "hostilidades e insultos" – uma provável reação à prisão de um deputado sul-coreano acusado de tentativa de golpe de esquerda.

Pyongyang ainda tenta manter o número de contemplados o menor possível. Para cada três pessoas enviadas pelo Sul aos encontros, o Norte manda apenas uma. Ainda assim, a pessoa é escolhida por sua lealdade ao regime e permanece sob intensa vigilância. "Antes de ir, elas precisam decorar as respostas para as perguntas que lhes serão feitas, para não falarem o que não devem", contou um refugiado da Coreia do Norte à DW.

Improvável reconciliação

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Choro na despedida entre familiares das duas Coreias: sensação de ter sido o último adeusFoto: picture-alliance/dpa

Também neste mais recente encontro entre as famílias, a Coreia do Norte vinculou a concessão ao pedido de suspensão de exercícios militares do Sul junto dos Estados Unidos. Ainda assim, observadores políticos avaliam o encontro como um sinal de uma cautelosa reaproximação entre Norte e Sul, depois de o ditador Kim Jong-un ter mandado executar seu tio e rival político em potencial Jang Song-Thaek. Diferentemente de seu antecessor, Lee Myung-bak, a atual presidente sul-coreana, Park Geun-hye, quer a aproximação.

Mas provavelmente o que a Coreia do Norte quer é, com a ajuda financeira do Sul, reduzir sua dependência da China. E Pyongyang joga as cartas de Seul quando quer abrir diálogo com os EUA. No Sul não se tem a ilusão de que os emocionantes encontros familiares levarão a alguma reconciliação com o vizinho do Norte.

Já entre os coreanos, a curta alegria de ver novamente quem se ama termina de maneira cruel: com o inevitável sentimento de que este pode ter sido o último abraço, um adeus.