MoMA homenageia arquitetura latino-americana
19 de junho de 2015Quem estiver ou for a Nova York até o dia 19 de julho poderá visitar uma exposição particularmente importante para o resgate da arquitetura latino-americana da segunda metade do século 20: Latin America in Construction: Architecture 1955–1980 (América Latina em Construção: Arquitetura 1955-1980), no renomado Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA).
Para a arquitetura, as exposições do museu são antológicas. Foi o MoMA quem mostrou ao mundo o racionalismo do International Style, em 1932, e foi o próprio museu quem também desconstruiu o modernismo com a mostra Arquitetura Desconstructivista, de 1988.
É também ao MoMA que a Arquitetura Moderna Brasileira deve a sua primeira exibição: Brazil Builds (Construção Brasileira), em 1943. E, em 1955, o museu trazia um levantamento inédito do modernismo na América Latina com Arquitetura Latino-Americana desde 1945. Agora, 60 anos mais tarde, o MoMA propõe uma continuação de sua primeira mostra, enfocando o intenso crescimento urbano dos países latino-americanos após a Segunda Guerra Mundial, o que se refletiu num esforço de modernização e até mesmo de construção de cidades inteiras.
Em entrevista à DW Brasil, Carlos Eduardo Comas, professor de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e cocurador da exposição em Nova York, explica que a mostra atual "corresponde ao momento em que o desenvolvimentismo se consagra como política pública na região" e é "uma exposição de arquivo, de curadoria coletiva, que pretende primariamente propor uma redescoberta e/ou revisão."
Segundo Comas, isso aponta para uma mudança de paradigma frente à produção arquitetônica latino-americana, que angariou pouco reconhecimento mundial na esteira da crise do desenvolvimentismo, a partir de 1980, e do menosprezo da historiografia europeia e americana pela experiência arquitetônica e urbanística modernas na região.
DW Brasil: O que se pode ver no MoMA sobre a arquitetura do período entre 1955-1980 na América Latina?
Carlos Eduardo Comas: Uma arquitetura que responde aos problemas e oportunidades de um processo de desenvolvimento socioeconômico comandado pelo Estado, ao mesmo tempo em que também responde aos problemas e oportunidades de desenvolvimento formal da arquitetura moderna, estabelecida como opção hegemônica e não mais vanguardista. Ela é representada na exposição primariamente com documentos originais do período, complementados por maquetes, fotografias e filmes (usando trechos de filmes do período) especialmente encomendados.
A exposição ocupa 1.200 metros quadrados e conta com cerca de 500 documentos oriundos de 11 países. Dada a qualidade e quantidade das realizações, a exposição não se pretende exaustiva, mas sugestiva. A introdução, que a curadoria chamou de prelúdio, contextualiza a exposição mostrando antecedentes no período 1925-55. No final, uma grande projeção traz fotos atuais veiculadas via Instagram de vários dos edifícios mencionados na exposição, constantemente renovadas.
Por que esse período não vai até a atualidade?
Porque o foco está justamente na questão do desenvolvimento, em várias perspectivas. O ano de 1955 é aquele em que o MoMA fez sua primeira e única exposição sobre arquitetura moderna latino-americana, Latin American Architecture Since 1945, e corresponde, grosso modo, ao momento em que o desenvolvimentismo se consagra como política pública na região, e ao momento em que realizações pregressas de arquitetura moderna, particularmente as brasileiras, começam a ser contestadas pela crítica europeia e norte-americana, em combinação eventual com a crítica local.
Por sua vez, 1980 corresponde, grosso modo, à crise do desenvolvimentismo, e ao momento que ratifica o menosprezo da historiografia europeia e norte-americana pela experiência arquitetônica e urbanística modernas na região.
Que destaque tem a arquitetura brasileira na exposição?
O Brasil está representado por obras marcantes em todo o desenrolar da exposição. No foyer, ao entrar, há uma maquete em bronze do projeto da Cidade Fluvial do Tietê, de Paulo Mendes da Rocha, projeto emblemático de conexão latino-americana.
Na sala do prelúdio, por exemplo, figura a maquete do edifício do Ministério da Educação no Rio de Janeiro, projeto de 1936 de Lucio Costa e equipe, incluindo Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy – a mesma exibida na exposição Brazil Builds, que o MoMA realizou em 1943, assim como croquis de Oscar Niemeyer para o edifício da ONU em Nova York. Brasília tem espaço exclusivo, incluindo croquis, fotos, maquete e o relatório do Plano Piloto de Lucio Costa.
A grande sala dá posição proeminente a obras como o Masp de Lina Bo Bardi; o MAM-Rio junto ao Parque do Flamengo, de Reidy e Burle Marx, complementado por duas joias do Lúcio Costa: as rampas de acesso à Igreja da Glória e o Monumento a Estácio de Sá; a FAU-USP do Vilanova Artigas; o Ginásio do Paulistano de Paulo Mendes da Rocha, e obras de Lelé na Bahia e Brasília.
A representação na parede dedicada ao quarto de século de projetos de habitação inclui, entre outros, o Cajueiro Seco do Acácio Gil Borsoi, em Recife, e a requalificação da favela de Brás de Pina no Rio de Janeiro, de Carlos Nelson Ferreira dos Santos e equipe.
Qual a diferença da visão sobre a arquitetura latino-americana em 1955, por ocasião da primeira exposição no MoMA, e a atual mostra?
A de 1955 era uma retrospectiva de dez anos que visava um futuro, uma continuação, e tomava a modernização da cidade latino-americana como exemplo, mostrados através de uma compilação de fotos, tiradas em várias viagens do crítico Henry-Russell Hitchcock pela América Latina. A atual é um estudo histórico do período 1955-80, uma exposição de arquivo, de curadoria coletiva, que pretende primariamente propor uma redescoberta e/ou revisão.
A atual exposição mostra uma mudança de paradigma em relação à produção arquitetônica latino-americana?
Sim!