Moradores de rua de Paris usam Twitter para contar suas histórias
21 de abril de 2014Patrick tem 47 anos. Como a maioria dos franceses, tem um smartphone e uma conta no Twitter. Mas o mais surpreendente é que ele vive nas ruas há mais de três anos. De acordo com um estudo do Instituto Nacional de Estatística francês feito em 2013, ele é um dos mais de 140 mil sem-teto da França. O número dobrou nos últimos dez anos.
"A situação é complicada. É difícil quando se é empurrado para as margens da sociedade", diz. Antigamente, Patrick trabalhava como motorista de caminhão, mas perdeu a carteira de habilitação. Desde então, ele vive nas ruas. Como também perdeu seus amigos, sua família e sua casa, Patrick não fala com disposição sobre seu passado.
Nos últimos seis meses, ele atuou como membro da iniciativa Tweets de Rue (@tweets2rue). Assim, o morador de rua aprendeu lentamente a falar de novo sobre a própria vida – e a se abrir para a sociedade.
Patrick começou a participar do projeto em novembro do ano passado com o apoio da Cruz Vermelha. A ideia é simples: a campanha deu smartphones a cinco sem-teto e os encorajou a escrever sobre suas vidas no Twitter.
Dez mil seguidores
Emmanuel Letourneux é uma das figuras por trás do Tweets de Rue. A inspiração partiu de uma iniciativa que durou apenas 15 dias em Nova York e serviu como base para o novo projeto. Ao contrário do seu correspondente americano, a iniciativa francesa estava planejada para durar, em princípio, seis meses. Agora, ela foi prolongada.
"Um dos objetivos que temos com o Tweets de Rue é que as pessoas ouçam e leiam diretamente o que os moradores de rua têm a dizer", explica Letourneux. "Além disso, nós queríamos mostrar que existem pessoas muito boas dispostas a ajudar. Pessoas que não se envolveriam com regras de organizações sem fins lucrativos."
Mas num primeiro momento o Tweets de Rue esteve sob duras críticas. Alguns chamaram o projeto de voyeurista. Os cinco moradores de rua participantes da iniciativa também não estavam certos sobre como o projeto iria funcionar.
"Eu tenho uma relutância em manter muito contato com as pessoas, por isso, estava um pouco cético no início", diz Patrick. "Mas o projeto me permitiu ver o que as pessoas pensam sobre os sem-teto, e a falar com estranhos. Eu tendo mais a não ter problemas com estranhos do que com pessoas que conheço há muito tempo."
Após seis meses, Letourneux fala em um completo sucesso da iniciativa. Patrick e os outros quatro moradores de rua têm mais de 10 mil seguidores no Twitter – possivelmente, graças às discussões organizadas mensalmente na rede social. Quanto ao cotidiano fora da plataforma, Patrick viajou pela França e escreveu sobre suas experiências.
"Eu me encontrei com três dos meus seguidores. Ainda um ano atrás eu nunca poderia imaginar algo semelhante para mim. Isso aquece o coração", afirma. "Eu estava muito sozinho e quebrei todos os laços com meus amigos e minha família. Agora eu tenho novos amigos. São pessoas sinceras que não têm medo de serem honestas comigo."
Críticas
Para outros, o projeto não foi bem sucedido. Manu, um imigrante da Costa do Marfim que vive na França sem nenhum documento, teve, em princípio, um grande impulso psicológico por causa do apoio que recebeu pelo Twitter. Ele sofria de depressão na grande Paris e foi viajar pelo sul da França. De lá, foi por fim deportado para a Itália. Nesse meio tempo, ele tuitou que atualmente está tentando voltar para a França.
Outro participante da iniciativa que tem 24 anos e vive há cinco meses nas ruas concluiu o projeto antecipadamente. "Estava claro que isso poderia acontecer", disse Letourneux. "É por isso que tivemos muito contato com os cinco sem-teto durante a experiência."
O co-fundador do Tweet de Rue, David Cadasse, é responsável pela logística das pessoas que mantêm um contato direto com os moradores de rua.
"Eles estavam psicologicamente muito sensibilizados, por isso, tive que ensiná-los como tuitar", afirma. "Eu tive que ficar muito próximo a eles, porque para os sem-teto existe uma longa jornada até a próxima manhã. Continuamente eu tive que tranquilizá-los e advertir sobre como serem cautelosos com a imprensa. Quando a pessoa é moradora de rua, ela não está acostumada a ser o centro das atenções."
Uma nova forma de solidariedade
Um objetivo importante do projeto seria que os jovens também se engajassem, diz Letourneux. "Sem o Twitter não teria sido possível. A plataforma personifica essa nova sensibilidade das pessoas e pode ser muito útil em casos de necessidade. É o símbolo de uma nova forma de organização da solidariedade", afirma.
Alguns até se deixam inspirar pelo Tweets de Rue para seus próprios projetos. Um exemplo é a Associação de Estudantes Sans A. Os participantes gravam entrevistas com os moradores de rua sobre suas vidas e publicam os vídeos na internet.
E por que não? Se o Twitter e outras mídias sociais conseguem conectar as pessoas de diferentes países, por que não utilizá-los para conectar pessoas que vivem ao lado umas das outras?