Milhares de ucranianos deixam leste do país em busca de refúgio na Rússia
18 de junho de 2014Onde antes havia casas, hoje existem ruínas escurecidas pela fuligem. A fumaça paira sobre um assentamento. Rastros de explosivos cortam o céu como fogos de artifício. "Eles vão nos matar", diz a ucraniana Irina Yarmosh. Sentada num quarto minúsculo com algumas amigas, ela assiste, na TV russa, a notícias sobre os combates no seu país.
Yarmosh vem de Slaviansk, no leste da Ucrânia. No início de junho, ela fugiu para a Rússia com o marido, as duas filhas e algumas outras famílias. Eles temiam por suas vidas.
A milícia cidadã – como são chamados os combatentes pró-Rússia – organizou a viagem. Na Rússia, Yarmosh e seus familiares estão agora abrigados numa colônia de férias, na região de Rostov, a cerca de 50 quilômetros da fronteira com a Ucrânia.
A princípio, eles queriam permanecer em Slaviansk. Mas os ataques aconteciam com cada vez mais frequência. "Nunca havíamos pensado que sofreríamos tantos ataques", diz Yarmosh. "Esperávamos que nosso governo desse ouvidos à razão e se lembrasse de que ali não estão terroristas, mas pessoas pacíficas."
Slaviansk é um dos bastiões dos combatentes pró-Rússia. Desde meados de abril, as tropas do governo ucraniano avançam contra os insurgentes na região.
Yarmosh e suas amigas relatam que o Exército empregou helicópteros e artilharia pesada. Casas inteiras foram destruídas, e até dispararam contra um hospital infantil, dizem. Segundo as jovens, os soldados chegaram a usar bombas incendiárias, provavelmente de fósforo – o que foi mostrado pelo noticiário russo.
Centenas de refugiados por dia
As autoridades russas estimam que dezenas de milhares de refugiados ucranianos estejam atravessando a fronteira e, no começo de junho, decretou estado de emergência na região fronteiriça de Rostov.
O serviço regional de prevenção de catástrofes construiu campos de refugiados emergenciais em quatro postos de fronteira: barracas com algumas dezenas de leitos e assistência médica.
"Cerca de 800 pessoas chegam aqui a cada dia", diz Vadim Kravzov, responsável pelo acampamento no posto de fronteira em Novoshakhtinsk. "Até agora, todos acreditam que poderão voltar para casa. Ninguém quer se registrar como refugiado ou emigrante. Todos que fogem do leste da Ucrânia querem voltar em breve para lá."
Fronteira cruzada a pé
Numa das barracas de cor laranja no posto fronteiriço de Novoshakhtinsk, Svetlana Mironenko esvazia uma grande bolsa plástica de viagem: ela coloca sobre o beliche algumas roupas para si e para suas três crianças – de 14, 6 e 1 ano e meio de idade. Eles acabaram de chegar. De Lugansk, onde também há combates, ela e suas crianças foram levadas de táxi em direção à Rússia. Em seguida, caminharam os últimos metros até cruzar a fronteira russa.
Mironenko parece tranquila, mas está visivelmente muito cansada. O sol brilha forte sobre o sul da Rússia e sobre o acampamento formado por barracas de cor laranja. "As autoridades russas estão procurando um novo lar, trabalho, um jardim de infância e uma nova escola para nós. Meu marido continua a lutar contra as tropas do governo. Quando falamos pela última vez ao telefone, ele disse: 'Vá para a Rússia, eu vou em seguida'."
O marido de Mironenko faz parte da "milícia cidadã", incumbida de proteger a população das tropas de Kiev. "Quando tudo se acalmar, provavelmente iremos retornar. Nossa casa e tudo o que temos estão lá. Isso é uma tristeza", lamenta.
No longo prazo, Mironenko não sabe como ficará a situação. Esse também é o caso da maioria dos refugiados ucranianos na Rússia. Eles só têm certeza de uma coisa: a nova liderança em Kiev é um regime de criminosos, do qual acreditam que apenas a Rússia seja capaz de protegê-los.