Merkel adverte que caso Navalny pode afetar Nord Stream 2
7 de setembro de 2020O governo da chanceler federal Angela Merkel afirmou nesta segunda-feira (07/09) que o envenenamento do oposicionista russo Alexei Navalny pode ter consequências no andamento do gasoduto Nord Stream 2, um projeto bilionário que deve duplicar o envio de gás da Rússia para a Alemanha.
Segundo o porta-voz de Merkel, Steffen Seibert, a chanceler federal acredita que "seria errado excluir alguma possibilidade".
"A chanceler concorda com as declarações proferidas pelo ministro das Relações Exteriores no fim de semana", completou Seibert, se referindo ao ministro Heiko Maas. No domingo, o ministro advertiu que se a Rússia não cooperar com a investigação do caso envolvendo Navalny, a Alemanha será "obrigada" a repensar sua contribuição para o Nord Stream 2.
"Espero que os russos não nos obriguem a mudar nossa posição em relação ao gasoduto Nord Stream 2", disse Maas, ao jornal Bild am Sonntag.
No entanto, tanto Merkel quanto Mass evitaram falar abertamente sobre a possibilidade de sanções diretas contra o governo da Rússia no âmbito do caso Navalny. Segundo Seibert, ainda é muito cedo para decidir sobre eventuais sanções.
Navalny, de 44 anos, um conhecido oposicionista e ativista anticorrupção russo que já organizou diversos protestos contra o presidente Vladimir Putin, saiu do coma induzido até nesta segunda-feira. Ele segue internado no Hospital Universitário Charité de Berlim, onde deu entrada em 22 de agosto. Ele havia passado mal durante um voo na Rússia dois dias antes.
Segundo os médicos, o estado de saúde de Navalny melhorou, mas ele ainda continua respirando com ajuda de aparelhos e será retirado da ventilação mecânica por etapas. Navalny já reage com conversam com ele. O hospital disse que ainda não é possível avaliar os efeitos de longo prazo do envenenamento.
Na semana passada, o governo alemão afirmou que exames toxicológicos comprovaram "de modo inequívoco" que Navalny foi envenenado com um agente neurotóxico do chamado grupo Novichok. O veneno foi desenvolvido por cientistas soviéticos na década de 70.
A inclusão do Nord Stream 2 no caso Navalny marca uma mudança na retórica do governo alemão, que há anos vem defendendo publicamente a construção do gasoduto, apesar de críticas dos EUA e de diversos países do Leste Europeu, como a Polônia e Ucrânia.
O Nord Stream 2 começou a ser construído em 2011. No início de 2020, antes da pandemia de coronavírus, a previsão era que o projeto fosse concluído no fim do ano ou no início de 2021.
Berlim é uma das principais promotoras e financiadoras do projeto, que prevê dobrar a capacidade de importação de gás russo pela nação europeia sem a necessidade de que o combustível passe por nações que mantêm relações tensas com Moscou, como a Ucrânia e a Polônia.
O projeto é na verdade uma ampliação da capacidade do sistema Nord Stream 1, que funciona desde 2011, e que liga a cidade russa Ust-Luga a Greifswald, no leste alemão. As obras do Nord Stream 2, lideradas pela estatal russa Gazprom, são avaliadas em 10,5 bilhões de dólares (55 bilhões de reais).
O projeto tem diversos críticos. Os EUA se opõem firmemente à ampliação do gasoduto, argumentando que ele vai aumentar a dependência europeia em relação à Rússia e enfraquecer nações aliadas no leste da Europa, que dependem das taxas de trânsito sobre gás russo que passa por dutos instalados em seus territórios.
Há temor ainda de que com a ampliação da rede submersa Moscou tenha mais espaço para eventualmente pressionar mais facilmente nações que ficam na rota dos velhos gasodutos de superfície, podendo trancar os dutos sem que isso afete seu principal comprador, a Alemanha.
No entanto, críticos da posição dos EUA apontam que a real intenção de Washington é vender mais gás natural liquefeito americano para os europeus. Antes do envenenamento de Navalny, Berlim reagiu diversas vezes com irritação quando os EUA impuseram sanções contra firmas que participam do projeto.
O Nord Stream 2, que deve ter 1.200 quilômetros de extensão, se tornou ainda mais estratégico para a Alemanha após Berlim estabelecer um abandono gradual da energia nuclear no país e estabelecer metas para a redução de emissões de CO2 e consumo de carvão. O gás natural produz 50% menos dióxido de carbono do que o carvão.
Em 2017, Berlim comprou um recorde de 53 bilhões de metros cúbicos de gás natural russo, cerca de 40% de seu consumo total. O sistema Nord Stream 2 é projetado para transportar até 55 bilhões de metros cúbicos do combustível por ano.
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