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Mais conservador, Congresso deve emperrar pautas liberais

Clarissa Neher11 de outubro de 2014

Bancadas que se opõem a mudanças em temas de direitos civis, como o reconhecimento do casamento homossexual, estão ainda mais fortes. Tendência é que, na próxima legislatura, avanços se limitem ao Judiciário.

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Foto: Getty Images

A eleição de um Congresso Nacional ainda mais conservador, com maior presença de legisladores ligados às bancadas ruralista, evangélica e de segurança, deve emperrar o avanço de pautas de cunho liberal, como o aumento dos direitos da comunidade LGBT.

Um levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) aponta que a bancada evangélica da Câmara, maior opositora das demandas do movimento LGBT, deve contar com pelo menos 82 deputados federais em 2015. Em 2010, eram 70 legisladores, um crescimento de 17%.

"A perspectiva é muito ruim. Se antes já havia dificuldades de aprovação de projetos ligados à comunidade LGBT, agora a dificuldade vai ser muito maior. Com esse cenário, provavelmente, nada vai ser aprovado", afirma Suzana Viegas de Lima, professora de Direito Civil da Universidade de Brasília.

Sem expectativa de avanços

Entre os candidatos mais votados ficaram Celso Russomano (PRB/SP), que se declara católico, mas possui uma estreita ligação com grupos evangélicos, e já afirmou abertamente ser contra o casamento gay. E Marco Feliciano (PSC/SP), acusado de homofobia e racismo.

A bancada evangélica é bem mais expressiva do que os 37 candidatos eleitos que declaram apoiar a causa LGBT. Entre eles, o mais conhecido é o deputado reeleito Jean Wyllys (PSOL/RJ), que aumentou em 11 vezes seus votos em relação a 2010.

"A dificuldade que um Congresso conservador pode impor à pauta legislativa não significa necessariamente a derrota política. Além disso, o PT continua tendo a maior bancada e isso faz muito diferença. Juntando o PT, PTB e o PSOL podemos fazer obstrução em pautas que sejam do interesse dos conversadores, assim que se faz o jogo político, para que eles cedam também nas pautas que são importantes para as minorias", afirma Wyllys à DW Brasil.

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Bancada evangélica cresceu 17% em 2014Foto: AFP/Getty Images

Os ruralistas também devem aumentar sua bancada. A Frente Parlamentar da Agropecuária espera que a base passe de 60 para até 70 deputados. Estima-se que mais de 200 parlamentares deem apoio à sua agenda.

A bancada "policial", defensora de uma segurança pública mais estrita e que tem em Jair Bolsonaro (PP-RJ) seu nome mais expressivo, deve ser outra a crescer, segundo o Diap. O departamento estima que serão pelo menos 20 deputados alinhados com as pautas do grupo. Parte dessas duas bancadas converge com a evangélica em alguns temas, como a resistência aos avanços pedidos pelo movimento LGBT.

No Brasil, o papel do Congresso com relação à aprovação de leis voltadas à comunidade LGBT ou criminalização da homofobia é praticamente inexistente. Nenhum avanço com relação ao reconhecimento de direitos civis de homossexuais veio do Legislativo. Quem assumiu essa tarefa no país foi o Judiciário.

Em 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Apesar do reconhecimento, a garantia do casamento gay só virá realmente com a aprovação de uma legislação específica pelo Congresso.

"Não temos leis, temos decisões que fazem vezes de lei. Assim, regulamos o caso concreto na Justiça. Isso é pouco produtivo e também não é tão eficiente como seria uma lei", afirma Lima.

Para Christina Vital, professora de ciências sociais da Universidade Federal Fluminense, "observa-se o crescimento da presença de políticos identificados com ideologias conservadoras, o que é resultado de uma série de avanços e conquistas de minorias na década de 1970 e 1980".

Tribunais como caminho

A criminalização da homofobia continua sem previsão. O projeto de lei que tratava do tema, a PL 122, foi anexada pelo Senado no final de 2013 à reforma do Código Penal, dificultando ainda mais sua aprovação.

Diante dos entraves legislativos, o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABLGBT), Carlos Magno, considera importante o papel do Judiciário.

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O deputado Marco FelicianoFoto: José Cruz/ABr

"O Judiciário é uma possibilidade importante, porque ele está mais isento da pressão política, religiosa e moral, além de fazer um debate mais técnico e jurídico. Mas não podemos abandonar o Legislativo", afirma.

Magno afirma que o grupo vai continuar atuando dentro do Congresso para que mais legisladores se sensibilizem com a causa. "Vamos continuar a luta, formando uma frente parlamentar, sensibilizando deputados e ampliando a força social, porque sem ela não teremos muito apoio dentro do Congresso nacional", conta.

Vital também acredita que a sociedade possui um papel importante para mudar esse cenário, através da mobilização por meio de movimentos e pelo ativismo.

"Essas são as principais formas de interferir no processo político e demandar mudanças sociais, além de provocar a reflexão, o posicionamento de políticos e da sociedade", ressalta a socióloga, que também é pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (Iser).