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Lula e o desafio de reconstruir o Brasil

Brasilianische Politologin Argelina Figueiredo
Argelina Cheibub Figueiredo
4 de novembro de 2022

Dificuldades pós-eleição são grandes, mas sucesso da frente em defesa da democracia mostrou que Lula é a única liderança política capaz de aglutinar apoio partidário para dar início ao processo de reconstrução do país.

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Luiz Inácio Lula da Silva durante marcha da vitória, em São Paulo
"A capacidade de negociação e persuasão de Lula o qualifica para formar uma base de apoio partidário no Congresso. Seu prestígio internacional ajuda."Foto: Carla Carniel/REUTERS

Luiz Inácio Lula da Silva venceu! O Brasil venceu! Venceram as camadas mais pobres da população que, majoritariamente, deram seu voto a Lula. Venceu a frente ampla construída por Lula na defesa da democracia, ameaçada pelo atual presidente, Jair Bolsonaro. Venceu a Justiça Eleitoral na organização e vigilância da eleição. Venceu o Supremo Tribunal Federal (STF), muro de contenção às ameaças ao processo eleitoral. Venceu a confiança nas urnas eletrônicas e na lisura do processo eleitoral.

Não foi fácil. Nunca houve uma eleição tão violenta, apoiada na mentira e na propagação do medo. Do início da campanha até o dia da eleição, o uso de recursos públicos, da máquina governamental e do Estado foi sem precedentes. O presidente lançou mão de um arsenal de instrumentos para se manter no poder. A despeito de tudo isso, o povo foi às urnas e garantiu a vitória de Lula.

Rombos nas contas e incerteza sobre transição

A vitória eleitoral foi o primeiro passo. O day after não será fácil. Antes de chegar ao Palácio do Planalto, o presidente eleito tem que planejar e organizar o governo. Tarefa árdua em si, sobretudo considerando-se a destruição deliberada de boa parte das políticas públicas e dos rombos fiscais e orçamentários deixados pelo atual governo.

Não são favas contadas a observância das regras vigentes para a transição de governo, muito menos a cooperação para o trabalho de sua equipe. O amplo acesso a informações para o diagnóstico do estado da administração e das políticas públicas não está no horizonte.

Bolsonarismo veio para ficar

Na sequência, o desafio político a ser enfrentado é a formação do governo. O bolsonarismo veio para ficar e tem representantes "raiz" no Congresso e em alguns governos estaduais.

Lula enfrentará uma oposição forte e "desleal", na concepção do famoso cientista político Robert Dahl. Ou seja, desleal ao próprio regime democrático.

Além disso, o centro, crucial na formação de governos de coalizão, foi esvaziado. Os novos partidos, fundidos em função da cláusula de barreira e da proibição de coligações, estão fragmentados. O número de partidos diminuiu, mas a fragmentação interna aumentou.

Na eleição de 2022, a coligação liderada pelo PT reuniu apenas partidos de esquerda, ao contrário do que ocorreu em 2002, quando aglutinou no centro partidos de um espectro ideológico mais amplo. Mas uma certa movimentação para o centro também ocorreu com a escolha de Geraldo Alckmim como candidato a vice-presidente e a construção de uma ampla frente suprapartidária com o apoio de lideranças políticas, associações sociais e políticas, setores econômicos e culturais. Por outro lado, partidos de direita se associaram ao bolsonarismo, reduzindo o campo da direita democrática. Tudo isso dificulta o processo de formação de coalizões de governo.

Capacidade de negociação e persuasão

Podemos esperar, então, um apoio legislativo sustentável ao novo governo? Acredito que sim.  O principal ativo com que contamos é o próprio presidente eleito. Como ficou demonstrado na construção e sucesso da frente em defesa da democracia, Lula é a única liderança política capaz de aglutinar apoio partidário para dar início ao processo de reconstrução do país.

Obviamente, a fragmentação interna dificulta a obtenção de uma decisão unitária dos partidos para entrar no governo, condição necessária para a constituição de uma coalizão.

Ademais, é bom lembrar que a participação no governo tem certa força de atração. Partidos se vinculam ao seu eleitorado em torno de políticas públicas. Políticas de educação, saúde, meio ambiente, etc. – todas elas hoje destruídas. Depois de um presidente sem partido, sem programa e sem capacidade de governar, ocupar um cargo ministerial pode gerar retornos eleitorais positivos.

A capacidade de negociação e persuasão de Lula o qualifica para formar uma base de apoio partidário no Congresso. Seu prestígio internacional ajuda. Recuso o rótulo de otimista, ainda que um certo grau de otimismo seja bem-vindo no momento. Minha opinião, contudo, se apoia na realidade. Difícil, mas superável. A conferir.

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Planaltices é uma coluna semanal sobre política brasileira. Os textos são escritos por colaboradores do grupo de pesquisa PEX (Executives, presidents and cabinet politics), vinculado ao Centro de Estudos Legislativos (CEL) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Coordenada pela cientista política e professora da UFMG Magna Inácio, a coluna é publicada simultaneamente pela DW Brasil e repercutida no blog do PEX

Argelina Cheibub Figueiredo é cientista política e professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.

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Esta coluna é uma parceria da DW Brasil com o PEX, núcleo de estudos sobre presidencialismo institucional da UFMG e capitaneado por Magna Inácio.