Liberais egípcios rejeitam decreto presidencial
24 de novembro de 2012A Praça Tahrir, no Cairo, voltou a ser palco de protestos antirregime. Só que nesta sexta-feira e sábado (24/11), o alvo não foram Hosni Mubarak ou o Conselho Militar, mas sim as decisões do novo presidente eleito, Mohammed Morsi. Os manifestantes protestaram contra o decreto constitucional, outorgado na última quinta-feira, que confere ao chefe de Estado poderes quase ilimitados.
Manifestantes não querem um faraó
Trata-se quase que exclusivamente de manifestantes da ala liberal, como Schahier, de 20 anos de idade. Sobre o decreto de Morsi, ele tem uma opinião definida: "Se nós aceitarmos isso, então será o nosso fim. Pois dessa forma, ele agrega Executivo, Legislativo e Judiciário numa mão só. Ele é agora um faraó".
Quase todos os manifestantes partilham dessa opinião. Dirigidos contra Morsi e contra a Assembleia Constituinte composta quase que exclusivamente por islâmicos, os protestos após as preces da sexta-feira já estavam marcados há dias. O decreto só fez agora ampliar a lista dos motivos. Mas também mobilizou muitas pessoas, que de outra forma provavelmente não participariam da manifestação.
No final da tarde de sexta-feira, dezenas de milhares já estavam reunidos, e muitos permaneceram na praça até o sábado. No início da manhã, a polícia utilizou gás lacrimogêneo contra os manifestantes, entre os quais se encontrava Tarek Nassar, de cerca de 60 anos. Para ele, os membros da Irmandade Muçulmana são fascistas e mentirosos. "Eles prometeram muitas coisas. Diga-me uma única promessa que tenham mantido! Eu não me lembro de nenhuma. Minha confiança é zero."
Desconfiança contra a Irmandade Muçulmana
Gritos de "Abaixo, abaixo a Irmandade Muçulmana" puderam ser ouvidos ou lidos por quase toda a praça. E a desconfiança permanece mesmo diante de aspectos positivos do decreto. A demissão do procurador-geral, introduzido ainda por Mubarak, foi exigência dos revolucionários liberais. Mas Schahier não tem a mínima confiança na Irmandade Muçulmana. "Não acredito que eles tenham demitido o procurador-geral para levar adiante a revolução, mas em benefício próprio."
O rapaz também observa com cautela os novos processos contra membros do regime que foram absolvidos, após serem acusados do assassinato de manifestantes. "Talvez a retomada desses processos seja uma coisa boa. Mas devido aos outros artigos [do decreto], eu permaneço cético."
Muitos dos manifestantes pertencem à classe média alta egípcia. Eles falam inglês, são cultos e bem vestidos. Os mais jovens simpatizam com os muitos novos partidos e movimentos liberais. Essas organizações estão unidas contra o novo decreto de Mohammed Morsi e seus emblemas estavam presentes por toda parte.
Abdul Bar Zahran, por exemplo, é funcionário do Partido dos Egípcios Livres. Com uma bandeira do partido na mão, condenava o decreto de Morsi. Ele critica a imunidade garantida pelo decreto para a Assembleia Constituinte diante de uma possível dissolução pelo Tribunal Constitucional. "Nós exigimos que essa Assembleia Constituinte seja dissolvida, pois ela não representa todos os egípcios. Ela não representa as mulheres, as minorias, os cristãos, os liberais, como também não representa os revolucionários."
Pró-Morsi também se mobilizam
Já a 50 metros de distância era possível ver no ar a fumaça das bombas de gás lacrimogêneo. Há alguns dias já acontecem ali batalhas de rua entre manifestantes, alguns deles muito jovens, e também entre hooligans e a polícia antimotim.
Não se sabe ao certo quem deu início à violência na rua Mohammed Mahmoud: no momento, ambos os lados se apedrejam mutuamente. Antes os policiais haviam jogado cadeiras, e tudo o mais que pudessem encontrar, a partir do edifício de uma escola adjacente, sobre a multidão de manifestantes, matando um deles. Não é possível mais distinguir esses manifestantes dos da Praça Tahrir.
Ainda é incerto se os Protestos de Sexta-feira terão sucesso. Entretanto, Schahier permanece realista: "Eu não sei, vamos esperar o melhor. O problema é que a qualquer momento a Irmandade Muçulmana pode mobilizar o mesmo número de pessoas, ou até mais".
De fato: simultaneamente, milhares de membros da Irmandade Muçulmana e salafistas se reuniram em frente ao palácio presidencial para apoiar o decreto presidencial. Diante dos participantes da manifestação de apoio, Morsi defendeu seu decreto: "As decisões que tomei foram para a proteção da nação e do povo." Ele disse trabalhar para todos os egípcios, por uma rotação do poder e pela divisão de poderes. Os opositores de Morsi das alas de esquerda e liberal discordam: eles temem uma nova ditadura, desta vez por parte dos islâmicos.
Após os protestos de massa, o confronto entre islâmicos e oposição liberal do Egito continuou neste sábado. A polícia do Cairo empregou diversas vezes gás lacrimogêneo para expulsar os opositores do presidente Mohammed Morsi da Praça Tahrir. Segundo testemunhas, centenas de manifestantes permaneceram durante toda a noite na praça, antigo centro da "Primavera Árabe" no Egito.
Autor: Matthias Sailer (ca)
Revisão: Augusto Valente