Irã desiste de enriquecimento de urânio
21 de outubro de 2003A viagem a Teerã valeu a pena para Jack Straw, Dominique de Villepin e Joschka Fischer. O governo de Teerã sinalizara no domingo (19) disposição a um entendimento no conflito em torno de seu programa atômico, e os três decidiram aproveitar a oportunidade. O resultado pode significar a desativação de mais um foco de crise na política internacional, o que é uma boa notícia depois da guerra do Iraque e da cruzada de Washington contra os "Estados vilões", entre os quais se situa o Irã.
As concessões
O governo de Teerã vai suspender seu programa de enriquecimento e processamento de urânio. O urânio altamente enriquecido pode ser usado na fabricação de armas nucleares. Além do mais, assinará o protocolo adicional ao Tratado de Não-Proliferação de Armas Atômicas correspondendo, assim, à exigência da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Este protocolo possibilita a realização de controles nas usinas e instalações nucleares sem aviso prévio.
Ao abrir mão do enriquecimento de urânio, o governo iraniano quer demonstrar sua boa vontade e "criar um clima de confiança", disse o presidente do Conselho de Segurança Nacional, Hasan Rowhani. O entendimento foi selado com a assinatura de uma declaração conjunta, dez dias antes do vencimento de um ultimato da AIEA. A agência exigiu provas de que o programa atômico iraniano tem somente fins civis.
Segurança sem armas atômicas
O regime de Teerã garantiu que na sua "doutrina de segurança não há lugar para armas atômicas". Para o ministro alemão das Relações Exteriores, Joschka Fischer, hoje foi "um dia importante". Com sua decisão, a cúpula de Teerã contribuiu para a estabilização política da região. O presidente iraniano Mohammed Khatami elogiou, principalmente, a disposição dos ministros europeus de dialogarem com a república islâmica.
Com o acordo, o Irã corresponde plenamente às exigências da Agência Internacional de Energia Atômica. Teerã indicou reiteradas vezes que suas usinas nucleares se destinavam exclusivamente à produção de eletricidade. Os Estados Unidos, contudo, suspeitam que detrás do programa nuclear haja a intenção de fabricar armas atômicas. Teerã, por sua vez, temia espionagem em questões de interesse estratégico, se permitisse a entrada de inspetores.
A missão bem engrenada dos europeus
Ao que tudo indica, a missão incomum dos ministros europeus contava com o apoio dos Estados Unidos. Segundo diplomatas do Ocidente, eles não teriam viajado a Teerã se não houvesse chance de êxito. De Villepin ressaltou que a missão transcorreu em "estreito entendimento com a AIEA, nossos parceiros da União Européia, o secretário norte-americano de Estado, Colin Powell, e com o ministro russo do Exterior, Igor Iwanov".
Seu colega britânico, Straw, disse que a assinatura do protocolo adicional não irá solapar a soberania iraniana. Para o presidente Khatami, que louvou a "boa vontade" de todas as partes envolvidas na negociação, "o Irã sempre esteve empenhado em remover os pontos de conflito, desde que fossem respeitados a soberania e os interesses nacionais".
A Alemanha, França e Reino Unido, por sua vez, mantiveram intensos contatos nos últimos meses, a fim de desagravar a disputa sobre o programa atômico iraniano. Semanas atrás, ofereceram a Teerã cooperação técnica no uso civil da energia nuclear. Diplomatas afirmam que tal cooperação poderia incluir até o fornecimento de elementos combustíveis para usinas atômicas.
O programa atômico do Irã
O Irã iniciou seu programa atômico no começo da década de 70. Em 1974, a subsidiária da Siemens Kraftwerk Union (KWU) começou a construção de um reator em Bushir, no Golfo Pérsico. Depois que os alemães suspenderam seu engajamento, Teerã prosseguiu recorrendo à Rússia.
A maioria das usinas estão em fase de planejamento ou construção. Somente funcionam três reatores de pesquisa. Mas estão prestes a ser concluídos um reator a água leve pressurizada e três instalações para enriquecimento de urânio, produção de água pesada e bastões combustíveis.