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Governo paquistanês atravessa crise com protestos e ordem de prisão

16 de janeiro de 2013

Um clérigo populista exige a renúncia do governo e a dissolução do Parlamento, enquanto a Suprema Corte ordena a prisão do primeiro-ministro. Os militares acompanham a situação atentos.

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Foto: AP

"Esperem só, amanhã vamos ter justiça", gritou o clérigo paquistanês-canadense Tahir ul-Qadri nesta terça-feira (15/01), diante de dezenas de milhares de adeptos em Islamabad. Ele acusou o governo de corrupção e ineficiência e lhe impôs um ultimato: naquele mesmo dia, o Parlamento deveria se dissolver para que assumisse um governo de transição, sob a liderança das Forças Armadas.

Quando o prazo se esgotou, o pregador de 61 anos apelou a seus seguidores: "Peço a vocês que permaneçam até amanhã". E acrescentou, em meio ao júbilo da multidão: "Eu vou permanecer". Poucas horas mais tarde veio a notícia surpreendente: a Suprema Corte do Paquistão decretara a prisão do primeiro-ministro Raja Pervez Ashraf, acusado de corrupção.

O juiz também expediu mandados de prisão contra outras 15 pessoas, noticiaram as agências de notícias, baseadas em fontes jurídicas paquistanesas. As acusações são de irregularidades relativas a usinas de eletricidade privadas, durante o mandato de Ashraf como ministro da Água e Energia.

Nenhum observador da política paquistanesa acredita tratar-se de uma mera coincidência. A questão é: qual a relação entre essas medidas e o discurso de Qadri.

Tahir ul Qadri
Tahir ul-Qadri fala a seus seguidores durante manifestação em IslamabadFoto: picture-alliance/dpa

Colaboração indireta

De acordo com uma das teorias, a Suprema Corte aproveitaria o movimento de protesto de Qadri para levar à fase decisiva um processo por corrupção contra o chefe de governo, há muito tempo pendente.

Já faz muito tempo que o tribunal e seu presidente, Ifthikar Mohammad Chaudhry, encontram-se em conflito com o governo do presidente Asif Ali Zardari. Em meados de 2012, a Suprema Corte conquistou uma vitória, quando o antecessor de Ashraf, Yousaf Raza Gilani, foi forçado a renunciar ao cargo após longa queda de braço com a Justiça, igualmente por acusações de corrupção.

Outros observadores afirmam que o movimento de protesto liderado pelo pregador Qadri faz involuntariamente o jogo dos militares. Além disso, com seu procedimento, a Suprema Corte estaria se deixando usar em favor dos interesses das Forças Armadas.

Papel ambivalente dos militares

Os militares do Paquistão rechaçam tanto o presidente Zardari quanto seu principal rival político, Nawaz Sharif, líder da conservadora Liga Muçulmana, porém se consideram fracos demais para tomar o poder. Eleições parlamentares estão previstas para maio.

O jornal The New York Times cita o analista político Najam Sethi: "Os militares jogam suas cartas e tentam influenciar o processo eleitoral. Procura-se evitar que Zardari e Nawaz tenham caminho livre durante o pleito".

Falando à DW, o jornalista paquistanês Saleem Bukhari avalia de forma diferente o papel das Forças Armadas do país. "Os militares já teriam podido intervir em diversas ocasiões, mas não o fizeram. Não creio que o Exército esteja pronto para interferir. Mas, se a situação escalar para a anarquia, então é seu dever constitucional garantir que a integridade do Paquistão permaneça intacta."

Passado político

Tahir ul-Qadri é um prelado respeitado no Paquistão. Ele já foi ativo na política e até mesmo queria ser primeiro-ministro, conta o jornalista paquistanês Mohsan Raza Khan.

No entanto, nas eleições de outubro de 2002, seu partido, de orientação religiosa, só conseguiu um assento no Parlamento. O futuro presidente e ex-general Pervez Musharraf não chegou a considerar Qadri nem mesmo para um cargo de ministro. Em reação, este entregou seu mandato no Parlamento e emigrou para o Canadá, onde assumiu a cidadania local.

"Agora ele congrega milhares de pessoas, protesta contra o governo e exige as assim chamadas 'reformas eleitorais'", relata Raza Khan. Este estranha que, segundo a concepção de Qadri, primeiro o Parlamento deva ser dissolvido e, depois, realizadas reformas. "Agora temos em Islamabad um manifestante que nem pode participar das eleições devido à sua dupla nacionalidade."

Anhänger von Tahir ul Qadri
Adeptos de Tahir ul-Qadri ouvem seu discurso em IslamabadFoto: picture-alliance/dpa

Cidadãos em último lugar

Para Ahmed Awais, um líder entre os advogados registrados na Corte Suprema, não surpreende o fato de Qadri aparecer justamente agora e encontrar ressonância entre a população. Diante da inflação galopante, a economia em colapso e o caos político, é enorme a insatisfação no país.

"No Paquistão, os interesses do cidadão comum não valem mais nada – embora todos os artigos fundamentais da Constituição devessem defender esses interesses. Os políticos não se interessam por eles." Em meio a tamanho caos, diz Awais, não é de espantar "que apareça um furacão como este, na figura do pregador Qadri e seu movimento de protesto".

O que não está claro é quem apoia essa espetacular campanha midiática em prol de uma revolução. "É um grande ponto de interrogação: quem lhe dá as gigantescas somas para sua campanha?", comenta Awais, para quem Qadri deve dispor de mecenas abastados no exterior.

Autoria: Ana Lehmann (av)
Revisão: Alexandre Schossler