Desafio global
15 de março de 2010À primeira vista, nossas reservas de água são inesgotáveis: mares, lagos, rios e outras fontes cobrem grande parte da superfície do planeta. Porém somente 2,5% desses recursos são compostos por água potável. E essas reservas escasseiam com rapidez crescente, quer através do consumo desenfreado, quer devido à poluição.
O caso do Rio Citarum
Arsênico, metais pesados, fósforo, nitratos: o ciclo global da água é como uma cloaca – o que se introduz nele também sai do outro lado. E o preço da industrialização do mundo é água poluída e contaminada, tanto pelas fábricas como pelos assentamentos humanos.
Dez anos atrás, o então ministro da Energia e Mineração da Indonésia, Kuntoro Mangkusubroto, já comparava o Rio Citarum, em Bandung, Java, com uma lata de lixo: não era preciso nem vê-lo, bastava sentir o cheiro. "A água é preta, há todo tipo de coisas nela, plástico, latas, o rio está cheio de dejetos", apontou.
Após o tsunami no Oceano Índico, Mangkusubroto foi responsável durante cinco anos pela reconstrução de Banda Aceh. Desde julho de 2009, ele encabeça um novo grupo de trabalho encarregado de fiscalizar o governo indonésio reeleito, do ponto de vista da eficiência e da corrupção. Paralelamente, Mangkusubroto fundou uma associação para salvar o Rio Citarum.
Com a industrialização da metrópole têxtil Bandung, as águas residuais da cidade, oriundas da indústria e da agropecuária, passaram a ser simplesmente despejadas no rio. Por outro lado, o Citarum é responsável por 80% do abastecimento de água potável da capital indonésia, Jacarta.
O consumidor é quem paga
Há anos que o Citarum já levava o pouco honroso título de "rio mais poluído da Terra" e ameaçava desaparecer de vez sob o lixo. Mas neste meio tempo a Indonésia deu início, juntamente com o Banco Asiático de Desenvolvimento (ADB), a um projeto de saneamento do rio. Seu custo: 500 milhões de dólares.
Na opinião da vice-presidente do ADB, Ursula Schäfer-Preuss, os investimentos no setor de água devem constar entre as funções centrais dos bancos de desenvolvimento. E é responsabilidade dos governos e autoridades competentes garantir que os gastos com infraestrutura – abastecimento, irrigação, descarte de águas – realmente beneficiem o usuário final.
Pois, também no tocante aos esgotos, é ele que acaba pagando a conta pela exploração desmedida das reservas aquáticas. A partir de aterros de lixo, cloacas, parques industriais e da agropecuária, substâncias residuais escorrem, vazam e penetram no circuito planetário da água.
Mais de 1 bilhão de seres humanos não têm acesso a água potável, quase 2,5 bilhões não dispõem de instalações sanitárias. Segundo estimativas internacionais, mais de 5 mil crianças morrem, a cada dia, em consequência da falta de higiene e de águas contaminadas.
Tragédia da água e do plástico
Quase sempre o crescimento econômico teve primazia diante do meio ambiente. Foi assim que, com a industrialização do Vale do Ruhr, na Alemanha, sufocaram-se os rios Reno, Ruhr e Ems com os dejetos da indústria de carvão mineral e aço. Os pescadores desempregados amaldiçoavam os intragáveis "peixes de fenol".
Somente na segunda metade do século passado a legislação foi alterada de modo a impedir que águas residuais da indústria fossem lançadas nos rios sem tratamento prévio. Fiscalizações regulares e a ameaça de multas cuidam para que indústria e agropecuária respeitem as normas vigentes.
No entanto, há necessidade de fazer muito mais, insta o biólogo marinho Thilo Maack, da organização ambientalista Greenpeace. Antes mesmo da produção, é preciso assegurar que tudo, no processo produtivo, seja biodegradável. No caso do plástico, por exemplo, suas ligações e componentes químicos permanecerão décadas, mesmo séculos, no meio ambiente.
"Só deve ser permitido plástico que possa ser reciclado", exige Maack. É o que ele chama "fechar o ciclo de materiais". Um ciclo sustentável, portanto, onde na cloaca global só entre o que seja naturalmente degradável. E onde o critério para julgar uma produção efetiva não sejam apenas as perspectivas de faturamento, mas sim, em primeira linha, a conformidade ecológica.
Autor: Helle Jeppesen (av)
Revisão: Carlos Albuquerque