Justamente no dia da abertura de mais uma edição da mundialmente badalada Oktoberfest, em Munique, o grande clube da Baviera resolveu dar xabu. O Bayern viajou à bucólica cidade de Augsburg para supostamente apenas cumprir tabela contra o pequeno clube local que, na tabela de classificação do Alemão, ocupava então um modestíssimo 13º lugar.
A alta gerência do decacampeão da Bundesliga até parecia estar mais preocupada com a tradicional presença do elenco estelar na maior festa de cerveja do mundo do que com o jogo propriamente dito.
A visita de jogadores, comissão técnica e diretores à Wiesn (local do evento) já faz parte do calendário oficial do clube há muito tempo. Todo ano eles vão com a devida indumentária tradicional bávara, tanto para homens como para mulheres, e haja cerveja! Não foram em 2020 e 2021 porque, por conta da pandemia de covid-19, a realização da festança popular foi cancelada.
Só que, dessa vez, deu tudo errado. Em Augsburg, o Bayern sofreu sua primeira e inesperada derrota (0x1), completou quatro jogos seguidos sem vitória (três empates e uma derrota) e faz o pior começo de temporada na Bundesliga desde a campanha de 2010/2011.
Naquela época, sob o comando de Louis van Gaal, a situação era pior ainda – oito pontos e 12º lugar na tabela. Atualmente, após sete rodadas, a equipe tem 12 pontos e está em quinto, cinco pontos atrás do líder Union Berlin e três atrás do seu arquirrival Borussia Dortmund.
Nem um golzinho sequer
Sem contar que foram derrubadas algumas marcas.
Pela primeira vez nos últimos 87 jogos do campeonato alemão, o ataque bávaro foi incapaz de marcar um golzinho sequer, apesar de inúmeras oportunidades que teve para isso. Desde fevereiro de 2020 (Leipzig 0x0), o Bayern sempre anotava pelo menos um gol.
Outra série que foi interrompida: gols marcados fora de casa. Desde maio de 2019 (também um Leipzig 0x0), o recordista sempre marcou um gol fora de casa. Foram ao todo 54 partidas com festejo de gol na casa do adversário.
E tem mais: a última vez que o Bayern ficou quatro confrontos sem sair de campo como vitorioso foi há mais de 20 anos. É uma raridade mesmo. Ottmar Hitzfeld era o técnico – foi em novembro/dezembro de 2001. Naquela oportunidade a serie negativa já acumulava seis partidas sem vitória.
Decacampeão em crise?
"Crise no Bayern", esbravejam os mais afoitos. Não é para tanto, mas algumas preocupações vieram à tona. Especialmente aquelas que dizem respeito ao técnico Julian Nagelsmann.
Visivelmente contrariado depois da derrota para o Augsburg, Nagelsmann parecia estar em outro mundo enquanto mal e sucintamente respondia às perguntas dos repórteres durante a coletiva de imprensa pós-jogo. Perguntado sobre o significado da série de quatro jogos sem vitória, respondeu secamente: "Nada de bom". O repórter insistiu: "O que precisa mudar?" "Muita coisa" retrucou, curto e grosso, o jovem treinador.
Poucas vezes se viu Julian Nagelsmann tão taciturno e frustrado. Já ao final da coletiva, outro repórter se aventurou: "Será que não teria sido melhor contratar um centro-avante de ofício ou pelo menos alguém que converta em gols as oportunidades criadas?". Silêncio na sala. "Para mim não faz diferença e agora, se me dá licença, depois vou pensar no seu caso. Aliás, vou pensar em muita coisa nos próximos dias." Levantou-se e foi embora.
No vestiário, há rumores entre alguns jogadores sobre problemas de comunicação com o técnico. Repercutiu mal, por exemplo, que vira e mexe Nagelsmann tem a tendência de responsabilizar publicamente seus jogadores por maus resultados, em vez de assumir sua responsabilidade como técnico. Além disso, não se furta a criticar em público um ou outro jogador sobre seus pontos fracos.
À boca pequena, comenta-se nos bastidores que muitas vezes Nagelsmann não consegue encontrar um balanço adequado entre autoridade e empatia quando conversa com seus comandados, além de não justificar plausivelmente suas decisões dentro e fora de campo. E para piorar tudo mais um pouco, não faz o papel de moderador quando surge algum conflito entre seus astros. Deixa esse papel para seu assistente, Dino Toppmöller.
Firmeza x sensibilidade
O diretor esportivo do Bayern e ex-jogador Hasan Salihamidzic fez uma declaração até certo ponto surpreendente num programa de TV no último domingo (18/09): "O Julian está a procura do seu melhor estilo. Ele jamais teve um elenco tão valioso sob seus cuidados. Ainda está num processo de aprendizagem". E, logo em seguida, acrescentou: "Um técnico precisa de uma mão segura e, ao mesmo tempo, muita sensibilidade para perceber o momento de cada jogador".
Hansi Flick agradece pelo elogio. Foram justamente essas qualidades que fizeram com que, em pouquíssimo tempo, o então técnico do Bayern formou um time coeso que acabou conquistando a tríplice coroa em 2020.
Ainda bem que, justamente neste momento crítico, apesar de ir mal na Bundesliga, o time vai muito bem, obrigado, na Champions League. E, não nos esqueçamos, o que determina o sucesso de um técnico no Bayern são seus resultados nessa competição europeia. O parâmetro pelo qual um treinador é avaliado em Munique é o desempenho da equipe no cenário internacional. O objetivo mínimo é chegar sempre pelo menos às semifinais.
Na temporada passada, o Bayern deu adeus à Europa nas quartas-de-final, quando foi eliminado pelo Villarreal.
A batata de Julian Nagelsmann vai começar a assar de verdade, caso se repita um fiasco desse tipo. E vai assar mais ainda se Thomas Tuchel, demitido pelo Chelsea recentemente, ainda estiver à espreita, disponível no mercado.
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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Atuou nos canais ESPN como especialista em futebol alemão de 2002 a 2020, quando passou a comentar os jogos da Bundesliga para a OneFootball de Berlim. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit é publicada às terças-feiras.
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