Futuro da ONU preocupa alemães
11 de março de 2003A votação do projeto de resolução sobre o Iraque, apresentado ao Conselho de Segurança pelos governos dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, foi adiada depois que a França e a Rússia anunciaram a intenção de impor seu veto. Em Washington, fontes ligadas ao governo americano voltaram a ressaltar que os EUA estão dispostos à intervenção militar, mesmo sem um mandato das Nações Unidas.
A evolução da crise em torno do Iraque suscita uma preocupação crescente dos meios diplomáticos alemães em relação ao futuro da ONU. A vice-ministra alemã das Relações Exteriores Kerstin Müller, do Partido Verde, acredita que as Nações Unidas sofrerão uma enorme perda de autoridade, caso sejam levados a cabo os planos americanos de intervenção militar no Iraque sem uma aprovação por parte do Conselho de Segurança.
Prazo, não ultimato
O objetivo do governo alemão, segundo Kerstin Müller, é contribuir para uma atitude coesa dentro das Nações Unidas. Ela ainda considera possível um consenso sobre o Iraque no Conselho de Segurança. A solução poderia ser um regime mais rigoroso de inspeções, assim como o estabelecimento de prazos claros para o cumprimento de uma pauta de obrigações.
A vice-ministra alemã, em entrevista à emissora Deutschlandradio: "É preciso estabelecer prazos para cada questão específica – prazos, e não ultimatos –, dentro dos quais o Iraque teria de eliminar determinados armamentos ou de responder satisfatoriamente a perguntas."
Também o especialista em questões de segurança internacional do Partido Verde, Winfried Nachtwei, ainda considera possível uma solução da crise iraquiana por vias diplomáticas. Segundo ele, continua válida a premissa do ministro alemão das Relações Exteriores, Joschka Fischer: "Enquanto houver uma chance de meio por cento para uma solução pacífica, é preciso aproveitá-la."
Legitimação internacional
Entre as tropas alemãs, a questão do Iraque também traz algumas incertezas. Na apresentação do seu relatório anual, nesta terça-feira (11/3) em Berlim, o encarregado da Defesa do governo federal Wilfried Penner citou a crescente preocupação dos militares alemães com as ações fora do território da OTAN. O encarregado da Defesa é uma espécie de ombudsman dos soldados das Forças Armadas da Alemanha (Bundeswehr).
Entre os princípios que nortearam a criação da Bundeswehr no pós-guerra estão os do soldado como cidadão comum – com todos os direitos e liberdades – e da liderança interna (innere Führung), que dá à própria tropa uma voz ativa na concepção das suas tarefas. Através disto, procurou-se evitar os erros do passado militarista alemão: acima de tudo, o da obediência cega às ordens superiores.
Dentro de tal estrutura moderna, os soldados tornaram-se mais críticos e questionam agora, entre outras coisas, a legitimidade de eventuais ações militares fora do território alemão ou da OTAN, se não forem ratificadas por um mandato das Nações Unidas. Entre os casos que causam preocupação aos militares alemães no momento estão o estacionamento de unidades alemãs de prevenção de ataques com armas químicas, biológicas ou nucleares no Kuwait e a ação na Turquia dos aviões de reconhecimento AWACS, cuja tripulação é em grande parte alemã.
O estacionamento da tropa no Kuwait teve legitimação internacional no contexto da operação "Liberdade Duradoura", de combate ao terrorismo. Mas, com a crise do Iraque, os soldados alemães estão cada vez mais ameaçados de um envolvimento indireto numa nova guerra do Golfo. O mesmo ocorre com os aviões AWACS: sua missão explícita é a defesa do espaço aéreo da Turquia, como país integrante da OTAN. Contudo, é enorme o risco de que o moderníssimo equipamento de radar, com um amplo raio de cobertura, acabe sendo utilizado também para a localização de alvos militares no Iraque.