Fronteiras em São Félix do Xingu
São Félix do Xingu é o oitavo maior município e a cidade com maior rebanho bovino do país. Pecuária e garimpo ilegal convivem ao lado de produtores de cacau e polpa de frutas orgânicas.
Campeão de rebanho bovino
Dona do maior rebanho bovino do país, São Félix do Xingu, no sudeste do Pará, tem atualmente cerca de 2,5 milhões de cabeças de gado, segundo o Sindicato dos Produtores Rurais. A cidade de 128 mil habitantes registrou um crescimento de 18% no número de bois na última década e tem 12 mil propriedades rurais cadastradas. Na proporção, são cerca de 17 bois por morador.
Da borracha ao boi
Sediado na confluência entre os rios Fresco e Xingu, São Félix tornou-se município apenas em 1988. Tradicionalmente habitada por populações indígenas, a região atraiu trabalhadores na época do ciclo da borracha, a partir de 1900. Foi área de exploração de minérios e serviu de colonização agrícola do Estado durante a Ditadura Militar. A pecuária chegou com força a partir de 1990.
Ocupação e guerrilha
Além do gado, em algumas fazendas há porcos. O produtor Pedro Vieira chegou a São Félix em 1983 atraído pela oferta de terras pelo governo militar, que usava o lema "integrar para entregar". O aumento da população no entorno de São Félix recebia atenção especial por estar na zona do conflito armado no Araguaia, relembra, e a ocupação do terreno era vista como forma de evitar o avanço da guerrilha.
Floresta recortada
Com uma área de mais de 84 mil quilômetros quadrados, São Félix do Xingu é o oitavo maior município do país, com o dobro do tamanho da Holanda. Em meio a um mosaico de terras indígenas e unidades de conservação, como a Estação Ecológica Terra do Meio, o município também é dos principais focos de desmatamento na Amazônia.
Desmatamento em alta
Em 2019, São Felix do Xingu desmatou 3,8 mil quilômetros quadrados de floresta, segundo dados do Inpe. Com um salto de 100% em relação ao ano anterior, o município sozinho corresponde a um terço da destruição florestal em todo o bioma amazônico em 2019. Segundo o Ministério Público Estadual, desmatamento ilegal é o principal crime investigado pelo órgão.
Garimpo ilegal
Na zona rural, há garimpos de ouro. Fotografar ali é perigoso – e proibido. Segundo moradores da região, garimpeiros arrendam terrenos para explorar o minério e pagam uma pequena parte do que encontram ao dono da terra. Na foto, a retroescavadeira hidráulica remexe o solo ao lado de um curso d'água. O resíduo, contaminado com mercúrio, é despejado nos córregos e no rio Fresco, afluente do Xingu.
Cacau orgânico
Na cidade com maior rebanho bovino do país, há quem invista em plantio orgânico. No terreno de Joaquim Alves dos Santos, produtor rural familiar, 1.800 pés de cacau rendem até 600 quilos do fruto por ano. Santos não usa agrotóxico, sua produção é certificada e abastece, desde 2017, um mercado voltado para o consumo de cacau fino. Do sítio saem ainda polpas de outras frutas, como açaí e goiaba.
Mulheres à frente
São Félix do Xingu tem uma associação de mulheres desde 2012, voltada para a produção de polpas de frutas sem agrotóxico. A partir de 2013, o grupo virou fornecedor da merenda escolar na cidade e já chegou a entregar 9 mil quilos de alimentos. Atualmente, 18 famílias fazem parte da associação, que conta com o apoio técnico do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora).
Etnias indígenas
Oito Terras Indígenas têm seus territórios, ou parte, em São Félix do Xingu. Estima-se que mais de dez etnias estejam presentes na região. Bepdja Kayapó (foto) é professor indígena e trabalha na Secretaria de Educação municipal. Em época de aulas, ele vive com esposa e filho caçula na zona urbana. Na cidade, um projeto aprovado pela prefeitura em 2019 deu ao mebengôkrê o status de língua oficial.