Filhos de imigrantes têm menos chances no futuro
12 de outubro de 2005Os resultados são alarmantes: mais de 20% dos escolares alemães de 15 anos, filhos de imigrantes, não conseguem ultrapassar os níveis de conhecimento da escola primária. Os destinos destes descendentes de estrangeiros, via de regra, não são também os melhores: poucas chances no mercado de trabalho e grande probabilidade de viver da ajuda social do Estado.
Os professores alemães que dão aulas em bairros com alto número de estrangeiros, como Kreuzberg, em Berlim, se vêem, com freqüência, frente a desafios quase intransponíveis. Kreuzberg, conhecido na Alemanha como a "pequena Istambul", tem mais de 80% de escolares de origem turca ou árabe.
Escola em Berlim sem alunos alemães
A Escola Eberhard Klein, localizada no bairro, é a primeira no país que não possui nenhum alemão entre seus 340 alunos. Na hora dos intervalos, há apenas filhos de imigrantes no pátio. Os idiomas falados são principalmente turco, árabe e servo-croata. Apenas de vez em quando ouve-se alguma palavra em alemão, intercalada na conversa dos jovens.
Bernd Böttig, diretor da escola há quase 30 anos, analisa os motivos pelos quais os alemães não têm interesse em enviar seus filhos a uma escola freqüentada quase só por estrangeiros.
"Eles pensam que as crianças vão aprender muito pouco aqui. Além do fato de que os alemães acabam não se sentindo mais em casa. No mais tardar depois de um semestre as crianças vêm falar comigo que não entendem o que se fala nos intervalos das aulas. O alemão é falado apenas dentro da sala de aula. Nosso problema não é o caos e a violência, como muitos propagam, mas uma questão de domínio do idioma", esclarece Böttig.
Eventos de integração
Para auxiliar no desenvolvimento dessas crianças começaram a ser oferecidos cursos de alemão para filhos de estrangeiros. O número de alunos em sala de aula foi reduzido e criou-se um sistema mais eficiente de escolas em tempo integral. A asistência, no turno da tarde, é fornecida por professores e pedagogos especiais. Em muitos casos, os pais das crianças não falam o alemão, o que dificulta a comunicação e os impede de auxiliar, por exemplo, nas tarefas de casa.
Cigdem, uma menina de 13 anos que freqüenta a escola Eberhard Klein, embora tenha nascido na Alemanha e já esteja na sétima série, dispõe apenas do domínio básico da língua do país onde vive. "Nós não sentimos falta dos alunos alemães aqui. De certa forma, nos entendemos melhor com os árabes e com estrangeiros de outras origens. Além disso, o fato de usar um véu, como eu, não provoca aqui olhares atravessados dos outros. Isso aqui é aceito, o que os alemães muitas vezes não compreendem", conta a menina.
Böttig tenta revidar este tipo de pensamento, ao organizar, com freqüência, projetos em conjunto com crianças – alemãs – de outras escolas da cidade. Festas, programas de intercâmbio ou excursões são organizados para para que os alunos se conheçam e acabem com os preconceitos mútuos. Segundo o diretor, já foram seladas muitas amizadas "multiculturais" nestes eventos.
Futuro incerto
Um dos grandes problemas para os escolares de origem estrangeira começa quando eles têm que deixar a escola primária. São muito poucos aqueles que saem de um reduto de imigrantes como este e conseguem chegar ao Gymnasium, o pilar do sistema de ensino alemão que permite ao aluno, mais tarde, ingressar na universidade. Também são muito poucos aqueles que conseguem uma vaga como aprendizes numa empresa, diz Böttig.
Concretamente, isso significa que 60% dos jovens em Berlim não têm um futuro garantido ao sair da escola. E mais de dois terços deles são descendentes de imigrantes. "Não é fácil conseguir uma vaga para o aprendizado técnico, pois há outros que falam melhor alemão que eu", diz Süleyman, um jovem de 17 anos, que está na décima série escolar e se sente obrigado a "flutuar" entre duas culturas.
"Na Turquia somos tratados como alemães e na Alemanha como estrangeiros. Não estamos em casa em lugar algum", conta o filho de imigrantes turcos em Berlim.
"Fora de lugar"
Este dilaceramento é comum na vida de vários alunos da Escola Eberhard Klein. A questão, analisa Süleyman, é fazer disso um trunfo: se sentir parte da sociedade alemã, sem, no entanto, abandonar as raízes de uma outra cultura.
Uma tarefa árdua, mas que, como observa o autor Edward Said – palestino radicado nos EUA e morto em 2003 – acaba fazendo parte de todos aqueles que um dia deixaram sua terra natal: fazer com que o sentimento de estar "fora do lugar" não carregue necessariamente uma conotação negativa.