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Entrevista

29 de janeiro de 2011

Faz meses que o preço dos alimentos sobe. Será culpa dos especuladores financeiros? A Deutsche Welle perguntou ao economista agrícola Joachim von Braun, do Centro Alemão de Pesquisa para o Desenvolvimento.

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Especuladores só agem quando há escassez, afirma especialistaFoto: DW

Deutsche Welle: Os especuladores financeiros é que estão provocando o aumento no preço de alimentos como soja ou arroz?

Joachim von Braun: Sim, mas somente se já há sinais carestia, seja devido a uma queda na produção ou uma perturbação no mercado. Ou um aumento drástico no consumo.

Os especuladores apostam na escassez, na esperança de que os preços subam?

O papel dos especuladores precisa ser tratado de forma diferenciada. A especulação excessiva se intensifica somente quando há escassez de alimentos. Numa situação normal, quando os depósitos estão cheios e o mercado funciona bem, não há estímulo à especulação, ela é, portanto uma consequência da escassez.

Por que os alimentos estão em falta? A causa são fenômenos naturais como secas ou inundações, ou a escassez é provocada artificialmente, isto é: os alimentos não são colocados no mercado?

A taxa de inflação sobre os alimentos está subindo no mundo inteiro. Na Inglaterra ela está em torno de 6%, na China 12%, na Índia 16%. Isso tem a ver com o cenário macroeconômico, pois a grande quantidade de capital em circulação no mercado precisa ser investida em algum lugar, e tende à especulação. E também há outros fatores reais, como distúrbios meteorológicos.

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, quer colocar a regulação do mercado de matérias-primas no centro da discussão, durante a presidência francesa do G20. O senhor concorda com essa política?

Acho razoável que o G20 se ocupe de questões como a produção mundial de alimentos. E também acho bom que a temática da especulação, que já havia sido abordada pela Coreia do Sul no ano passado, tenha voltado à pauta com a liderança francesa do grupo. Só não podemos partir para a super-regulação. Precisamos aplicar os instrumentos certos, mas fora isso, devemos deixar o mercado prevalecer.

Em sua opinião, o que exatamente deve ser regulado?

Regulação não significa restrição de comércio. Pelo contrário, precisamos manter o mercado aberto. Regulação significaria, isso sim, encarecer a especulação. O preço dos contratos deve ficar mais alto para aqueles que fazem muitas negociações rápidas na bolsa de valores. Já negociamos no mercado futuro muito mais alimentos do que realmente existem, por isso a especulação precisa ser encarecida.

O mercado financeiro é um dos motivos pelos quais o preço dos alimentos está subindo. Outro motivo é que o lucro da produção de alimentos caiu, principalmente nos países mais pobres, os quais estão importando da União Europeia, da China ou do Brasil. O senhor acha que, em anos passados, se deixou passar a oportunidade de promover a agricultura nos países em desenvolvimento?

A agricultura nos países em desenvolvimento precisa de dois tipos de investimentos, para ser realmente incentivada. De um lado estão infraestrutura, obras de engenharia hidráulica, pesquisa, e principalmente colocar boas sementes à disposição dos pequenos agricultores. Boa parte desse esforço cabe aos cofres públicos, e esses investimentos, infelizmente, têm sido negligenciados nos últimos anos. Em segundo lugar, a agricultura dos países em desenvolvimento precisa de investimentos privados. Os agricultores precisam ter acesso a capital e a bancos, e nesse setor a situação já melhorou um pouco. Durante muito tempo os investidores estrangeiros não tiveram qualquer interesse na agricultura, e agora se tornaram bastante ativos e começaram a investir. Infelizmente, esse processo também tem alguns problemas. É necessária uma estratégia de investimento que realmente sirva aos agricultores.

O senhor espera neste ano revoltas motivadas pela fome, como as que ocorreram em 2008?

Em 2008 tivemos cerca de 60 casos em 40 países. Protestos este ano são difíceis de prever, prefiro não dar palpites. Mas eles já começaram. As pessoas ficaram mais impacientes. Mas esses distúrbios motivados pelos preços também podem trazer consequências positivas: eles derrubam regimes não democráticos. Nossas estatísticas mostram claramente que em países bem governados os protestos são muito mais raros e pacíficos. talvez seja trágico o aumento no preço dos alimentos levar a mudanças políticas, mas em parte também precisamos dessas mudanças.

Joachim von Braun é economista agrário do Centro Alemão de Pesquisa para o Desenvolvimento da Universidade de Bonn.

Autoria: Silke Ballweg / Thomas Latschan (ff)
Revisão: Augusto Valente