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Submarino nuclear

6 de setembro de 2009

Parceria militar entre Brasil e França pode impulsionar corrida armamentista na América Latina e esforços de Lula para sublinhar hegemonia regional podem não surtir efeito esperado, alertam especialistas alemães.

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Submarino nuclear francês: Brasil aposta em parceria militar, apesar dos altos custosFoto: AP

O presidente francês, Nicolas Sarkozy, chega ao Brasil nesta segunda-feira (07/09) para, entre outros compromissos, ratificar um acordo de cooperação militar com o Brasil. A parceria prevê a fabricação de 50 helicópteros, a construção em série de quatro submarinos convencionais, além do desenvolvimento do primeiro submarino brasileiro de propulsão nuclear.

Também estão previstos investimentos em instalações industriais e portuárias. A propulsão nuclear será desenvolvida pelo Brasil, o know-how nuclear explicitamente não faz parte do acordo. O projeto vai custar ao governo brasileiro cerca de 8,6 bilhões de euros e será financiado, em parte, através de empréstimo feito por um consórcio de seis bancos europeus.

Staatsbesuch Sarkozy in Brasilien mit Lula da Silva
Sarkozy e Lula: acordo selado durante visita do presidente francês ao BrasilFoto: AP

A parceria estratégica de defesa entre os dois países foi estabelecida durante a visita de Sarkozy ao Brasil em dezembro passado. A colaboração militar poderá ainda incluir a compra de 36 caças franceses. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recentemente havia dito que também poderiam ser feitos negócios envolvendo aviões militares, pois a França ofereceria uma ampla transferência de tecnologia.

Investimento vale a pena?

Especialistas alemães da área de defesa veem a cooperação militar com ceticismo. Na opinião deles, o tratado de custo bilionário, que renovará o arsenal militar brasileiro, pode contribuir para impulsionar uma corrida armamentista dentro do continente latino-americano sem, entretanto, trazer os benefícios esperados pelo governo brasileiro.

"Não estou muito certo se o Brasil realmente conseguirá a transferência tecnológica almejada com esse acordo", comenta o jornalista Otfried Nassauer, diretor do Centro de Informação Berlinense para Segurança Transatlântica (BITS, na sigla em alemão).

Ele avalia que há uma considerável chance de o projeto brasileiro do submarino nuclear ter resultados aquém do esperado. "Não é possível hoje saber se esse projeto realmente terá o sucesso desejado do ponto de vista tecnológico e se ele dará ao Brasil uma vantagem militar em relação a outros países. Um projeto tão ambicioso também pode fracassar", afirma.

Nassauer não acha que a atual cooperação com a França seja motivo de apreensão para as nações vizinhas ao Brasil, devido ao bom relacionamento entre os atuais governos do continente. Entretanto, sua opinião é que o dinheiro seria mais bem empregado em outros setores.

"A pergunta que o governo Lula deve se fazer é se os investimentos não são muito altos e se é o caso de investir tanto dinheiro no próprio status político e militar", questiona Nassauer. "Há muitos outros setores da sociedade e da economia nos quais, com os mesmos recursos, provavelmente se obteria bem mais postos de trabalho e possivelmente até maior transferência de tecnologia. Tecnologia militar é sempre mais cara do que a tecnologia civil", acrescenta o jornalista.

Hegemonia regional

O cientista político Daniel Flemes, especialista em políticas de segurança do Instituto Alemão para Estudos Globais e Regionais (Giga), de Hamburgo, avalia que a cooperação com a França pode enfraquecer a cooperação com os vizinhos latino-americanos e provocar uma competição regional por armamentos.

Chavez auf dem Balkon des Präsidentenpalastes in Caracas
Chávez: 4 bilhões de euros gastos em importações de armamentos da RússiaFoto: AP

"O fato de o Brasil estar procurando parceiros fora da América Latina em busca de know-how tecnológico pode provocar uma corrida armamentista no continente e pode ser um entrave para uma maior colaboração com os países vizinhos no setor de defesa", alerta Flemes.

Ele lembra que o acordo é apenas mais um passo do Brasil não só para confirmar sua posição como líder regional, mas também para pavimentar o caminho rumo ao tão sonhado status de grande potência. "O país se esforça para sublinhar sua hegemonia regional não somente na área econômica e política, como também militar. E, ao mesmo tempo, procura consolidar sua posição de potência emergente num contexto mais amplo", explica Flemes.

Para o analista, este é um passo compreensível, lembrando os esforços dos países próximos na ampliação do poderio militar. "Alguns países vizinhos ao Brasil também estão se empenhando na modernização de seu aparato militar. A Venezuela gastou, nos últimos quatro a cinco anos, 4 bilhões de euros em importações de armamentos da Rússia, enquanto o Chile também vem investindo pesadamente em armamentos nos últimos anos", ressalta Flemes.

"O Brasil não está sozinho", resume o cientista político, ao lembrar que a soma de gastos com armamentos dos países sul-americanos mais que duplicou nos últimos cinco anos.

Alemanha não tem experiência

O ministro brasileiro da Defesa, Nelson Jobim, justifica a escolha afirmando que os franceses foram os únicos que se dispuseram a transferir tecnologia para o Brasil. Além do mais, a Alemanha, que também havia sido consultada, não teria experiência com a construção de submarinos nucleares.

"Isso é correto. A Alemanha nunca construiu um submarino com propulsão nuclear. E também nunca construiu um submarino tão grande que comporte um reator nuclear. Os submarinos alemães são significativamente menores", diz Nassauer.

Autor: Márcio Damasceno

Revisão: Roselaine Wandscheer