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Alto número de execuções evidencia falhas da Justiça saudita

Richard Connor (ca)12 de novembro de 2015

Arábia Saudita não possui código penal escrito e maioria dos condenados à morte são estrangeiros. Muitos não têm acesso a advogados e são obrigados a assinar confissões. Em 2015, mais de 150 pessoas já foram executadas.

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Manifestante protesta em Sanaa, no Iêmen, contra a condenação à morte do líder xiita Nimr al-Nimr pela Árabia SauditaFoto: picture-alliance/dpa/Y. Arhab

Em 2015, uma pessoa tem sido executada – geralmente por decapitação – a cada dois dias na Arábia Saudita, em média. Desde o início do ano, 151 pessoas foram mortas, segundo a Anistia Internacional (AI). Durante todo o ano anterior, esse número não excedeu 90 execuções.

O aumento é significativo, mas grupos de direitos dizem que suas preocupações vão além das cifras. "Não se trata somente dos números em si – embora eles sejam alarmantes", diz Sevag Kechichian, pesquisador da Anistia Internacional para o Oriente Médio e Norte da África. "Trata-se do que esses números representam e a realidade por trás disso."

"Sob o direito internacional, a Arábia Saudita tem o direito de aplicar a pena de morte. Por si só, 151 pode ser um número horrível, mas – no final – se eles estão seguindo as diretrizes internacionais e matando 151 ou 200 pessoas por ano, pode ser que não haja muito espaço para outros governos criticarem a Arábia Saudita", explica o pesquisador.

Em vez disso, grupos de direitos humanos destacam áreas onde os sauditas poderiam ser responsabilizados. A organização humanitária Human Rights Watch (HRW) menciona o uso de sentenças de morte para crimes não letais – algo desaprovado pelo direito internacional – e critica o que chama de julgamentos injustos sem base legal e garantias judiciais.

"A maioria das pessoas executadas por delitos não violentos envolvendo drogas são estrangeiros – e há muitos problemas com estrangeiros e sua interação com o sistema judicial saudita", afirma Adam Google, pesquisador sobre o Oriente Médio da HRW.

"Muitas vezes, os réus não têm acesso a advogados. Frequentemente eles não entendem os procedimentos do julgamento e o que está acontecendo com eles", exemplifica Coogle. "Muitas vezes, eles podem ser forçados a assinar confissões sem realmente entender o que está acontecendo à sua volta."

A falta de um código penal escrito também abre um enorme espaço para ambiguidades, explica Coogle, que trabalha a partir da Jordânia. "Algo como calúnia ou até mesmo certo detalhes dos delitos envolvendo drogas não estão necessariamente estabelecidos na lei. Assim, ser processado conforme os princípios da Lei Islâmica, tal como ela é interpretada por cada juiz, pode levar a situações em que alguém é processado por algo que não seria considerado um crime na maioria dos outros países."

Além disso, os grupos de direitos humanos destacam os processos contra menores de idade por crimes capitais. Os mais notórios foram os planos para executar os ativistas pró-democracia Mohammed al-Nimr e Dawoud al-Marhood – ambos tinham 17 anos quando confessaram seus supostos crimes.

Saia justa em Londres

Nos últimos meses, os excessos do sistema judiciário da Arábia Saudita fizeram com que as críticas ao país árabe aumentassem. Em meio a uma forte controvérsia, o Reino Unido abandonou, em outubro, uma oferta de treinamento do sistema penal da Arábia Saudita, abrindo mão de um potencial contrato de 5,9 milhões de libras. Ainda assim, acredita-se que o governo britânico – que afirmou que a decisão era de natureza comercial – ainda coopera com a Arábia Saudita em questões judiciais.

Apesar de a oferta ter sido arquivada, tanto a AI quanto o grupo de direitos humanos Reprieve manifestaram preocupação sobre a cooperação entre os governos britânico e saudita, alegando que ela não é transparente. "Temos pedido às autoridades para revelar o que é a cooperação", diz Kechichian. "Há uma cooperação judicial muito maior e mais ampla – desconhecemos os detalhes."

A Anistia Internacional quer saber, por exemplo, se o Reino Unido está ajudando de forma operativa ou agindo como consultor. "Mesmo que seja a título de assessoria, e se essa capacidade consultiva for utilizada para aprimorar técnicas avançadas de investigação?", indaga Kechichian. "Que tipo de assessoria está sendo dada exatamente – nós os instamos a prestar esclarecimento."

O Reprieve pediu ao governo britânico para enviar um sinal desistindo da cooperação. "Os ocidentais e os sauditas estão, é claro, extremamente interligados", diz Kate Higham, responsável por assuntos do Oriente Médio no Retrieve.

"O governo britânico é contra a pena de morte e tem a obrigação de manter essa oposição no cenário mundial", diz a ativista. "Para começar, o governo em Londres poderia cancelar todas as operações de apoio ao sistema judicial saudita."

O Ministério britânico do Exterior declarou que vai continuar a tratar a questão dos direitos humanos na Arábia Saudita, incluindo a aplicação da pena morte, "no mais alto nível".

"O Reino Unido se opõe à pena de morte em todas as circunstâncias e em todos os países, especialmente em casos que não cumprem os padrões mínimos definidos no âmbito de acordos internacionais", declarou o ministério à DW. "Para o Ministério britânico do Exterior, a Arábia Saudita continua sendo prioritária na questão de direitos humanos devido à situação no país, particularmente no que tange à pena de morte", afirmou.