DOKU.ARTS 2012 exibe clássico do cinema brasileiro na Alemanha
25 de setembro de 2012A história dos documentários sobre arte é quase tão antiga quanto a própria história do cinema. Desde que as imagens em movimento começaram a se popularizar, cineastas mostravam fascinados o desenvolvimento do processo artístico.
Esse registro é muitas vezes um processo longo, resultando em um profundo olhar sobre a vida e o trabalho desses artistas. O tema é parte essencial na carreira de grandes cineastas como Agnès Varda, Manoel de Oliveira, Claire Denis e Wim Wenders.
“Fizemos uma pesquisa na Academia de Artes de Berlim e constatamos que a porcentagem de filmes sobre arte no programa dos grandes festivais internacionais de documentário, como Amsterdam, Leipzig e Toronto, era muito pequena. Mas isso vem mudando radicalmente nos últimos anos”, disse Andreas Lewin em entrevista à DW Brasil. Ele é o fundador e diretor do DOKU.ARTS, que acontece em Berlim.
O festival não é competitivo e apresenta 30 filmes nesta edição, dos quais 18 são inéditos na Alemanha. A importância e a produção dos documentários sobre arte têm crescido. Esses filmes se destacam não só por mostrarem o processo de produção artística, mas também a importância da arte como processo de mudança social.
Brasil em foco
O DOKU.ARTS é realizado pela Academia de Artes de Berlim. Depois de uma bem sucedida parceria de três anos com o Museu Holandês de Cinema, em Amsterdã, o DOKU.ARTS foi realizado em maio deste ano no Instituto Moreira Salles, no Rio de Janeiro. Por isso, a programação desta edição está repleta de filmes brasileiros.
"A parceria com o Instituto Moreira Salles foi ótima. Eles foram de grande importância para a edição do festival deste ano e essenciais para termos um variado intercâmbio de filmes. Somos duas pequenas instituições de cinema com orçamentos limitados e conseguimos reunir fantásticos filmes. Seria maravilhoso se pudéssemos continuar colaborando", disse Lewin.
Pode-se dizer que uma boa amostra da diversidade artística brasileira está presente nos filmes selecionados para o DOKU.ARTS em Berlim. A bossa nova está representada por A música segundo Tom Jobim, de Nelson Pereira dos Santos. Onde a terra acaba, de Sérgio Machado é uma homenagem ao grande clássico do cinema brasileiro, que também será exibido como parte do festival. "O programa desta edição aborda 80 anos da criação artística no Brasil. A maior parte desses filmes nunca foi exibida na Alemanha", explica Lewin.
Outro destaque é a retrospectiva dos filmes de Arthur Omar. O artista foi um dos pioneiros em lidar com novas mídias, como o vídeo, na arte brasileira. "É uma honra ter Arthur Omar como convidado especial deste ano. Ele é conhecido na Alemanha apenas pelo seu trabalho realizado nos anos 1970. Selecionamos também seus trabalhos mais recentes", disse o diretor do DOKU.ARTS.
Marco na história da arte
A história da produção artística no Brasil é homenageada com a estreia na Alemanha de Limite, considerada uma das maiores jóias perdidas do cinema mundial. O filme foi realizado pelo escritor e diretor Mário Peixoto quando ele tinha apenas 21 anos e foi seu único trabalho concluído.
"Como poucos filmes mudos e de ficção, Limite tem um valor documental enorme, que pode ser visto na contida e intensa atuação do elenco, algo pouco comum na época. O filme é uma grande fusão entre elementos do expressionismo alemão com um realismo mágico inovador. Limite não é só um marco na história do cinema, mas um marco na história da arte", disse Lewin.
A obra-prima de Peixoto teve sua estreia no Rio de Janeiro em 1931 e causou muita polêmica por seu caráter experimental e sua narrativa que lida com a passagem do tempo, ao destrinchar a condição humana de personagens à deriva em um barco.
Esquecido por décadas, o filme foi redescoberto nos anos 1970 e se tornou referência cultural do cinema brasileiro. Entre seus admiradores estão os diretores Walter Salles, Serguei Eisenstein e Orson Wells, além de ser um dos dez filmes favoritos de David Bowie.
Para o diretor do festival, o filme tem que ser visto e popularizado em todo o mundo. "Fazemos parte da Cinemateca de Berlim, então é muito importante podermos mostrar Limite, ainda mais em uma cópia primorosamente restaurada", elogiou Lewin. A restauração foi feita pela World Cinema Foundation, na Cineteca di Bologna em parceria com a Cinemateca Brasileira, e teve sua estreia no festival de Cannes em 2007.
A magnitude de Limite serve para lembrar que em uma era em que as plataformas de mídia mudam e se transformam com tanta rapidez, usar a arte para retratar a arte é um caminho de não só documentar, mas também de refletir sobre o papel dela em nossa história.
O DOKU.ARTS acontece no Zeughauskino em Berlim até 14 de outubro.
Autor: Marco Sanchez
Revisão: Francis França